Historias e estorias que não foram contadas

Historias e estorias que não foram contadas
uma foto, de um passado distante

terça-feira, 27 de outubro de 2015

Aprender a fazer fazendo.


Conversa ao pé do fogo.
Aprender a fazer fazendo.

                         Uma das máximas do escotismo tão importante e lembrada por BP, diz que nós chefes escoteiros devemos fazer de tudo para que nossos monitores conduza a própria patrulha. Quando um escotista está sempre olhando se preocupando, não deixando que eles façam sempre para aprender, é um erro e foge completamente do mais puro e mais correto ensinamento que temos que é o aprender a fazer fazendo. Outro dia vi uma foto de um Chefe ensinando aos jovens como armar uma barraca, ele armava e alguns seguravam enquanto ele esticava o cabo e fincava os espeques e dava instruções. Ótimo. Vimos que ele sabe armar, mas e daí? Não é ele quem deve saber e sim seus monitores para adestrar aos seus escoteiros.

                         Aprender a fazer fazendo é uma arte. Quando Baden-Powell introduziu o método Escoteiro ele era desconhecido nos meios educacionais. Hoje as escolas, organizações e até universidades usam esse método e estão tirando proveito, mais que nós chefes. Temos muitos educadores, pensadores e ou mesmo filósofos que nos chamam de movimento atrasado e ineficaz. Eles não sabem que a arte de aprender fazendo surgiu com o escotismo. Não existe maneira melhor para aprender. - Errar quantas vezes for até fazer o certo. Existem diversas maneiras para fazermos isto. Primeiro, dando a eles toda a liberdade para programar o programa (próximo artigo), ficando a cargo da chefia somente elementos surpresas e condições físicas e ambientais. Já me dizia um jovem sênior, sobre o programa da tropa, ele confirmava que a chefia fazia tudo. Perguntei se ele não opinava e me disse que não, pois assim havia surpresa no programa. Finalizei perguntando se no ano anterior quantos entraram e quantos tinham saído? Sua resposta – Somos somente quatro. Os demais saíram e ninguém entrou. Aí veio a realidade. Ali nunca foi dado aos seniores a liberdade de aprender a fazer fazendo. Tanto fizeram para eles que resolveram sair.

                         Isto é repetitivo em muitas tropas. Alguns chefes me dizem que eles gostam, os chefes fazem tudo e assim ficava mais fácil para cumprir um programa. Afirma que um deles disse que quando o Chefe fazia um bom programa havia um ar de mistério e todos gostavam. Desnecessário dizer que em sua Tropa a rotatividade é enorme. Ele até me afirmou que não perderam nada. Sai um entra outro! Bem sabemos que ali dificilmente o escotismo mostrará seu valor na vida futura dos jovens. Triste saber que B-P acreditava que pelo menos precisamos manter os jovens initerruptamente para que o método Escoteiro atinja seu objetivo. Como não existem bons programas que despertem interesses e os mantenham na ativa, ficam sempre comentando, programando, e contando os dias de alguma atividade regional ou nacional. Estas sim são importantes para eles enquanto estiverem na ativa. Não desmereço estas atividades. Elas são boas desde que esporadicamente.

                    Sabemos que estas atividades não trazem um programa que sirva para motivar e dar sustentação a lei e promessa escoteira e ao sistema de patrulhas. Elas valem mais pelas amizades e fraternidade. Ali nada farão a não ser divertir. Tudo já está pronto, até as refeições. A Direção programou tudo. Desde a chegada ao término. Tudo feito de antemão. Eles serão um “Bon vivant”. Ou seja, “Pagamos comemos e bebemos, a Deus agradecemos”. É importante que o chefe escoteiro se conscientize sobre as vantagens de deixar os jovens fazer. Seja no seu crescimento individual ou na sua evolução técnica. Sabemos que todos os escoteiros ou as escoteiras têm em seus bairros ou ruas amigos de infância, que se encontram sempre, fazem seu próprio programa e ficavam eternamente juntos. Nenhum deles jamais reclamou do programa que planejaram ou fizeram. A “turma” fica unida por muitos e muitos anos.  

                   Em um artigo publicado comentei sobre o programa da tropa. A patrulha tem condições para fazê-lo. Muito mesmo. Claro, não todo ele, mas boa parte sim. E alguns até me disseram que o programa seria ruim, e eles poderiam não gostar. Mas você já tentou? Pelo menos tentou? Afinal foram eles que fizeram. Lembremos que não é somente em uma ou duas reuniões que vai conseguir motivá-los. Isso é como se fosse uma pescaria. Tem de escolher a isca certa, a vara e o local onde vai pescar. A experiência em tropas demonstram que os jovens que fazem seu próprio programa, ficam mais tempo no escotismo. Facilitam sobremaneira o desenvolvimento de uma atividade, onde a técnica e o conhecimento adquirido é desenvolvido corretamente. Nunca se esquecer do valor da Corte de Honra, do Conselho de Patrulha. Deixar por conta deles sob sua supervisão acredito que terá em breve boas patrulhas. Não esqueça a patrulha de monitores que você sim é o monitor deles. Isto bem feito e aplicado é sucesso na certa. Observe a alegria de uma patrulha que fez uma mesa mesmo que torta e quase caindo e outra olhando o chefe fazer.

                 A arte de aprender fazendo também se aplica ao programa da tropa. Muitos chefes alegam que eles não entendem, não sabem como fazer, e acha que tudo vai dar errado com muitos meninos saindo por esse motivo. Esqueçam o “Não vão dar – É impossível – Eles não sabe escolher e programar” isso não é verdade. Sabemos que não é de um dia para outro que o chefe terá os resultados esperados. Aprender a pescar demora. Talvez o chefe que ainda não conseguiu não deu a isca certa. É preciso lembrar que nosso movimento tem características próprias. Colocar jovens em forma, marchar, perfilar, saudar, gritar e cantar, qualquer um consegue dirigir. Ou melhor, comandar. Mas esse não é o chefe que esperamos ter. O chefe que precisamos é aquele calmo, que fala pouco, que confia é um irmão mais velho, um aconselhador, tutor e não o dono de tudo.  

      Experimente. Dê um prazo para eles. Com o tempo irá se surpreender. Se mostrar aos monitores onde pretendem chegar, eles chegarão lá sem sombra de duvida. Confiar faz parte do método. Quem ensina e adestra é o monitor. O Chefe faz o mesmo com os monitores. Experimente e irá ver maravilhas no crescimento de sua tropa. Tenho certeza que a evasão irá diminuir muito. Quem sabe os que saíram vendo novos programas, onde ele podem ser ouvido resolva voltar. Já pensou ter uma fila de espera? Isto será possivel com a perfeita execução do método. Repito, se dá certo entre os jovens nos seus bairros porque não no escotismo? Se for um programa ruim ou não eles iram gostar. Fazem assim sempre. Todos sabemos que ali no seu bairro não tem chefes, não participam adultos.


      Quando a tropa caminha com suas próprias pernas, quem ganha são os jovens e o escotismo. Eles porque estão aprendendo o que o escotismo se propôs e o escotismo porque conseguiu dar uma nova filosofia e diretriz de vida tão esperada pelos pais. Experimente não custa nada tentar. Tenho certeza que vai se surpreender com os resultados.

domingo, 25 de outubro de 2015

Lendas escoteiras. O sonho não acabou!


Lendas escoteiras.
 O sonho não acabou!

                           Quando lonyalto me procurou eu fui franco com ele. – Desculpe meu amigo, mas escotismo não é minha praia. – Vi que ele ficou chateado, claro tinha feito a sua promessa na semana anterior e estava todo empolgado. Ele achou que eu ia me interessar e entrar na tropa dele – Mas Antonio! Você está pré-julgando! – Não estou não meu amigo. O Alex foi franco comigo. Prometem a você uma coisa, te engabelam e depois você descobre que foi tudo um engodo. Ele contou tudo. E eu acreditei nele. Disse-me que o escotismo era um movimento de jovens, onde eles decidiam seus programas sob a supervisão de um adulto. Que eles aprendiam a fazer fazendo, que eram espetaculares suas atividades ao ar livre, que lá acampados a Patrulha fazia tudo para montarem uma réplica rústica de suas casas. Contou ainda que lá aprenderiam a subir e descer em árvores com nós que se desmancham que iriam fazer travessias em córregos e lagos por uma ponte pênsil. Quantas promessas.

                          - Não foi nada disto Antonio, Disse-me ele. Cheguei lá e vi um chefe mandão, em lugar de um irmão mais velho encontrei um sargento que achava que éramos militares. Demoramos para ir ao campo e que decepção. O Chefe só sabia mandar correr, a dizer que o Escoteiro não corre, voa e um monte de coisas que em vez de ensinarem a gente ele é que fazia. Desisti em dois meses. Não volto lá nunca mais. Lonyalto não me respondeu de pronto. – Bem Antonio, sei de sua amizade com o Alex, mas você sabe que eu também sou seu amigo. E amigo nunca mente para outro. O Alex teve uma experiência em um Grupo Escoteiro que se esqueceu do método do nosso fundador. Nosso grupo não. Porque não vai neste sábado fazer uma visita? Passo aqui para irmos juntos. – Não podia negar o pedido de Lonyalto. Afinal éramos da mesma sala de aula e morávamos na mesma rua, acho que a idade dele era a mesma da minha. Doze anos.

                            No sábado ele passou em minha casa à uma da tarde. Disse a minha mãe aonde ia – Você vai? Ela disse. Não comentou que o escotismo não era sua praia? – Mamãe, é um pedido de um amigo. Não posso negar. A reunião começava às duas e meia da tarde. Chegamos às duas. A maioria das patrulhas já estavam lá. Cada um em um canto do pátio da sede. Fui para a Patrulha de Lonyalto, ele me apresentou ao Monitor. Disse que eu estava ali para ver como era os escoteiros. Vou ser sincero, gostei do que vi. A Patrulha era de todos. As opiniões também. Vi que havia ali uma grande amizade.   O Chefe Capistrano era gente boa. Sempre com um sorriso nos lábios, sempre com a palavra nós. Nunca eu. Consultava os Monitores, deixava por conta deles alguns jogos e treinamento das patrulhas. Ele sempre junto sem interferir. Sempre com aquele sorriso. Depois da reunião me procurou – Gostou? Disse. É Chefe. Gostei.

                            Fomos para a sede. Ele me explicou tudo que deveria fazer para se matricular. Perguntou-me o que eu esperava em encontrar ali. – Amizade, fraternidade e aventura! – Ótima escolha. Se você entrar é isso que vai encontrar. Depende de você. Quando começa sua responsabilidade também começa a nossa para lhe atender. A tropa é de todos nós. Na sua Patrulha a união faz a força e todas as quatro juntas é uma força descomunal. – Só tem um porem, disse. Seu pai e sua mãe tem de vir juntos aqui fazer sua inscrição. – Não serve só um deles? Não ele disse. E olhe, é melhor preveni-los, quem vai entrar no grupo são eles, você vai ser aceito se eles estiverem juntos e cumprindo os deveres de sócio.

                           Uma pedreira. Meu pai? Ir lá? Nem que a vaca tussa! Mas não desisti. A principio disse que não iria. Insisti. Nada. Insisti novamente. Insisti a semana inteira. – Você venceu! Disse. Para ficar livre de você vou lá no sábado com sua mãe. – Comentei com Lonyalto. Ele me disse – Confie no Chefe Capistrano. Depois me conte às mudanças que vai haver em sua família. Dito e feito. Meus pais e o Chefe conversaram por horas. Até se inscreveram em um informativo para pais que durava cinco horas. – Meu pai chegou em casa e rindo disse – Agora sou mais que um pai, sou um Chefe. E deu boas gargalhadas. Enfim fui aceito no grupo. Toda aquela burocracia demorou três semanas.

                           Naquele sábado eu meu pai e minha mãe fomos apresentados a todos do Grupo Escoteiro depois do cerimonial de bandeira. Não havia como escolher a Patrulha. Só na Quati tinha uma vaga. O Monitor veio alegre me cumprimentar. Disse aos meus pais que eu estava bem “guardado” na Patrulha, eles não precisavam se preocupar. Convidaram meu pai e minha mãe a participar do grito da Patrulha em minha homenagem, pois agora começava minha nova etapa como noviço. Eu já sabia que iria demorar dois ou três meses até estar devidamente preparado para a promessa. Sabia também que só após ela iria vestir o uniforme. Sonhava com isto.

                             Após a reunião o Chefe Capistrano me chamou em particular e me disse – Antonio, você começou nova vida conosco, vai aprender a ser homem de uma maneira diferente, vai aprender a ter honra, ética vai aprender a Lei do Escoteiro. Você será outro na escola, e seu procedimento vai mudar você agora é um Escoteiro. Representa milhões de outros irmãos espalhados pelo mundo. Eles confiam em você. Espero que você seja também mais um irmão nosso. Sua Patrulha é sua segunda família. Mantenha o respeito para com eles e assim todos o respeitarão.  Estarei em qualquer hora e qualquer dia a sua disposição. Precisando, não importa se é dia ou noite, eu seu irmão mais "Velho" não vou abandonar você nunca!


                                 Nunca mais esqueci aquele dia. Meu começo no escotismo. Até hoje me sinto como um pesar de minha vida profissional não me dar muito tempo. Conto para todos os meus amigos o orgulho de ter sido um. – Um o que perguntam? – Ora, um Escoteiro meu caro, meu sonho de menino nunca acabou. Ele mantém viva a minha chama Escoteira, que como dizia meu Monitor: de BP trago o espírito, sempre na mente, junto de mim e no meu coração estará!

terça-feira, 20 de outubro de 2015

A conspiração do Silêncio. Revoltar é vencer a batalha?


A conspiração do Silêncio.
Revoltar é vencer a batalha?

- Estão a conspirar contra os escoteiros? Quem sabe sim, mas são fatos isolados e que revoltaram alguns jovens participantes do JOTI. Quantos foram os conspiradores? Pelo que eu saiba um só. Sei que ele disse impropérios não condizentes com a linguagem de pessoas civilizadas. Mas um só? Será que não existem tantos mais por aí que fazem o mesmo? Afinal estamos em um país onde uns poucos se usurparam do poder, outros tantos eleitos aproveitam para se servir do dinheiro alheio, a corrupção só está sendo desvendada por um grupo de valentes e audazes membros de duas instituições, onde um Juiz não se fez de rogado e contra tudo e contra todos colocou figurões nos seus devidos lugares. A cadeia.

Como então nos revoltarmos com um só que com seus impropérios fizeram os escoteiros se sentirem ofendidos? Eu também sem estar lá, sem participar e sem conhecer o “moço” conspirador me revoltei. Mas como revoltar? E as outras celebridades o que disseram? De quem é a culpa de tudo isto? Propagandear no Facebook, postando em páginas, grupos, Fanpage é válido, mas será que atingiremos os egos dos revoltados contra o escotismo? Sem culpa os organizadores do JOTI. Afinal era apenas um item para procurar uma celebridade. Mas “diabos” este moço com este palavreado era uma celebridade? Uma vez escrevi aqui sobre um colunista articulista da Folha de São Paulo em um artigo publicado por ele que desmerecia o escotismo conforme sua experiência de jovem Escoteiro. Alguém deu bola? Alguém se revoltou? Quando o Bial gritou sobre nós o mundo Escoteiro desabou. E assim foram outros tantos que adoram desmerecer nossa organização.

Mas eu pergunto, sempre somos nós os culpados por não fazer um belo marketing das vantagens do escotismo? Dizem que ficamos presos à sede escoteira, quase não saímos, e dificilmente aparece na impressa um comentário, uma explicação ou mesmo alguém de fama para dizer que o escotismo é bom, que Baden-Powell foi um dos maiores educadores pensadores do seu tempo, que seu livro Escotismo para Rapazes é um dos três mais vendidos no mundo. Afinal, dizem que vendemos biscoitos, nunca vendi, sei que os americanos vendem. Atravessar a velhinha na rua se escasseou. As velhinhas desapareceram. O que fazemos realmente para sermos reconhecidos pela comunidade? Plantar árvores? Limpar praças? Sei não, perguntem para os escoteiros se eles gostam disto.

Sempre vejo nos meios publicitários, homens e mulheres que exaltam nos diversos fóruns educacionais, elogiam e copiam pensadores, pedagogos e educadores fora do país, e têm aqueles célebres e já conhecidos comentaristas e palestrantes falando sobre tudo menos o escotismo. Se um dia pudéssemos fazer uma pesquisa em âmbito nacional, fico em dúvida se mais da metade da população brasileira sabe onde andam os escoteiros, o que eles estão fazendo, suas finalidades, e se por acaso existem remanescentes ex-Escoteiros famosos a propagandear o Escotismo e seus valores para a formação do jovem. Muitos de nós nem mesmo sabemos explicar com palavras simples o que somos. Quando nos perguntam sempre a resposta é a já conhecida que nada explica e nada se entende.

Perguntem aos Dirigentes da UEB, das Regiões. Eles serão unânimes em dizer que estão fazendo tudo para sermos reconhecidos. Tudo? Alguém conhece um bom conferencista ou palestrantes da UEB a propagandear o escotismo em nosso país? Alguém sabe de programas nas emissoras de TV onde se reúnem diretores, professores para discutir sobre a educação dos jovens se por acaso o escotismo foi tema ou se algum representante Escoteiro nacional foi convidado? Onde estão nossos lideres para nos defenderem destes sacripantas que desandam a falar mal de nós? O que eles fazem para que sejamos conhecidos que nosso programa seja discutido, que na teoria da educação sejamos pelos menos lembrados?

Ficamos sós. O que dizem é que os grupos se movimentem, que a juventude escoteira de hoje cresça e um dia quando for alguém importante lembrar-se de nós. Estamos perdendo muito para outros órgãos de juventude e a preocupação não sinaliza que devemos nos embrenhar nesta seara e desvendar o caminho para o sucesso. Bradar ou dar um alerta que estamos vivos, que lutamos que fazemos o possivel agora e o impossível daqui a pouco fica no silêncio dos grandes dirigentes nacionais. Lamentar é bom, mas lutar por um ideal com participação de todos e melhor. Perguntem, portanto aos nossos lideres regionais, perguntem também aos nacionais. Postar aqui a revolta pode até ter algum resultado, mas pequeno, alcance mínimo para aqueles que não vivem no meio Escoteiro. Infelizmente existe sem percebermos uma Conspiração do Silêncio que não sabemos de onde parte. Sem que ninguém perceba estamos a reboque de uma época que até hoje não mostrou aos brasileiros o que somos e o que podemos dar a nação.


Como disse Oscar Wilde, o descontentamento é o primeiro passo na evolução de um homem ou de uma nação. Ser grande é abraçar uma grande causa. Mas lembremo-nos que uma andorinha só não faz verão!

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

John Thurman um visionário?


Conversa ao pé do fogo.

John Thurman um visionário?

 

Um artigo que venho publicando através dos tempos. Sempre me atualizo com ele. Ora, John Thurman escreveu em agosto de 1957, seria ainda atual? Em minha opinião sim. Muitos dos nossos lideres Escoteiros precisam de uma dose de sensatez, de sentirem mais humildade sem se considerem seres privilegiados para mudar o que acham que deva ser mudado sem consultas ou pesquisas reais para ver se darão ou não resultados. Moderno ou não o escotismo ainda não chegou lá. John Thurman foi durante muito tempo Chefe de campo de Giwell Park. O artigo mesmo escrito há anos ainda tem muito de atual. O mundo mudou, mas acompanhamos estas mudanças com os pés no chão?

 

Os Sete Perigos

Por John Thurman - agosto de 1957 (chefe de campo de Giwell Park)

Existem sete perigos para o Escotismo, para os quais, me parece, devemos estar alertas e tomar cuidado:

1. Complacência, do tipo de pessoas que pensam: "há cinqüenta anos temos trabalhado assim e temos feito um bom trabalho, portanto continuemos assim". Recordemo-nos que o trabalho para os rapazes de hoje tem que ser feito pelos homens do presente. Estou tão orgulhoso, como qualquer outro Escotista, do nosso passado, mas isso não nos leva a parte alguma. Há, hoje, muito mais a ser feito do que houve em qualquer outra época e o máximo que o passado pode fazer para nós é inspirar-nos para um maior esforço;

2. Centralização. Acampamentos Nacionais, Regionais e Jamborees são muito bons, mas quando muito freqüentes, podem ser desastrosos. Devemos dar ao Escotista a maior oportunidade possível para trabalhar com a sua Tropa e infundir-lhe os bons princípios e não juntar os rapazes em grandes massas para um grande espetáculo. Às vezes existe tal número de atividades organizadas pelo Distrito ou Região que praticamente não resta tempo ao Escotista para trabalhar com as Patrulhas ou Alcatéias;

3. Super administração e não suficiente capacitação. Gostaria de sugerir-lhes dar uma olhadela nos orçamentos e balanços, para verificar se aquilo que gasta com papelada e administração está equilibrado com o que se emprega na capacitação técnica. Ambas as coisas são necessárias, porém mantenhamos o equilíbrio.

4. Seriedade Demasiada. O Escotismo é algo sério, contudo, uma das grandes coisas é a alegria de participar dele, isso tanto para os dirigentes como para os rapazes. Em alguns países, há o perigo de se pensar em termos educacionais ou psicológicos e, enquanto fazemos isso, perdemos muito da nossa condição de "amadores". E vocês todos sabem que como amadores somos bons, mas como profissionais somos péssimos. Somos uma parte complementar na vida do rapaz; complementar na escola, dos pais, da igreja, e, mais tarde, do trabalho.

5. Exclusividade, o perigo de pensar que "os chefes devem provir do próprio Movimento". Penso que necessitamos de gente de fora, com diferentes experiências - homens de bem que tenham a faculdade de crítica construtiva e que tragam sangue fresco para o Movimento; 

6. Austeridade demasiada. Acho que tendemos a nos fazer demasiado respeitáveis e a nos converter em um movimento para apenas os rapazes bons, em vez de levar o Movimento para os rapazes que dele necessitam. O Escotismo nasceu em 1907 entre meninos pobres e, se economicamente os rapazes melhoraram desde então, por outro lado moral e espiritualmente existem rapazes tão pobres como naquela época, que necessitam do Escotismo.

7. Trabalhar para fazer super escoteiros. Devemos estar conscientes, no que diz respeito a adestramento, de não tratar de começar um curso a partir de onde deixamos o anterior, sem pensar que necessitamos começar e recomeçar sempre pelas bases e os princípios para progredir a partir destes.

Para terminar, recordemo-nos que Baden-Powell, em 1938, proclamava com orgulho e alegria o número de três milhões e meio de Escoteiros no mundo. Agora podemos ver um movimento que ultrapassou os oito milhões, (1957) devido justamente à sua simplicidade e ao prazer dos rapazes que tem sido contínuo.

Sem dúvida, Baden-Powell tocou o dedo em algumas das mais formidáveis idéias e práticas que levam os rapazes a segui-las com entusiasmo, e nos métodos, e modo de manejar e guiar os rapazes. É por isso que devemos nos manter o mais possível dentro da simplicidade, da alegria e do entusiasmo que ele inspirou.

OS ÚNICOS CAPAZES E POSSÍVEIS DE PÔR O ESCOTISMO A PERDER SÃO OS PRÓPRIOS CHEFES E DIRIGENTES.


Se nos tornarmos arrogantes, complacentes e a nos fazermos passar por demasiado auto-suficientes, então - e apenas com essas coisas - poderemos arruinar o Movimento. Feliz palavra de John Thurman. Muitos associados adultos, rapazes e moças estão saindo. Reclamam das atividades. Precisamos meditar. 

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Crônicas de um Velho Chefe escoteiro. Viajando pelas estrelas.



Crônicas de um Velho Chefe escoteiro.
Viajando pelas estrelas.

                    Impossível! Eu volitava no ar com uma facilidade incrível. A nuvem que me levava ao céu me deixou próximo a um planeta desconhecido. Marte Vênus e Plutão ficaram para trás. Ele o planeta brilhava tanto que achei que era uma estrela. Não era, olhei para baixo e minha vista encheu de luz de várias cores. Em poucos segundos dei a volta no planeta, todo arborizado. As sequoias gigantes ali não era páreo para as maravilhosa árvores do Brasil. Enormes, copadas, em baixo tudo gramado. Quantas flores... Milhares delas. Violetas, girassóis, rosas brancas, amarelas, vermelhas e até verde e azul eu vi. Era incrível. E o perfume no ar? Maravilhoso. Em todos os pontos daquele lindo planeta havia cascatas borbulhantes, nascentes de águas cristalinas, peixinhos coloridos a nadar. Que planeta era aquele? E a noite então as estrelas eram enormes, de todas as cores, cometas iam e vinham como a dançar valsas na odisseia planetária do infinito.

                      Eis que surgiu do nada um belo acampamento Escoteiro. Enorme, gigante, milhares de patrulhas com seus lindos campos armados sob o vento calmo que se mantinha no ar. Era belo demais. Tinha que conhecer melhor tudo aquilo. Afinal era a primeira vez que me transportava pelo espaço tão facilmente como se eu tivesse asas verdadeiras a me levar onde eu queria ir. Desci até na entrada do acampamento. Um Velho enorme, com um sorriso convidativo, com uma bata branca estava na porta: - Interrompeu minha entrada. – Quem é você Escoteiro? Ele perguntou. – Pensei que era São Pedro lá do céu aquele que ajudamos um dia na praça da estação onde ele ficou por uma noite. Vi que não me reconheceu. – Vado Escoteiro, Excelência! - De onde veio? Da Terra Senhor. – Não me chame de Senhor, não sou Deus, sou simplesmente um representante dele neste planeta! – O que quer aqui? - Eu chefão? – Ele me olhou enviesado como se estive pronto para me dar um peteleco na orelha.

                    Pedi desculpas. Expliquei-me. Ele disse: Se morreu ou bateu as botas é bem vindo, mas se estiver em sonhos, chispa daqui! Não sabia o que dizer. Será que morri? Sonhar? Necas, havia anos que não sonhava. – Acho que morri Dom Pedro – Se não me chamar de Dom Pedro de novo lhe meto a mão na orelha e vai voltar para sua catacumba naquele inferno de cemitério. – Calei. Então estava morto? – Entre, você foi Escoteiro por muitos anos, aqui é o Grande Acampamento. Tem gente que gosta e outros não. Se seguir pela direita, vai encontrar Baden-Powell e seus amigos que ainda fazem o escotismo de raiz. Se for pela esquerda vais encontrar os politicamente corretos (chefes que adoram o que a UEB faz) que morreram e não sabem que esticaram as canelas. Eles resolveram ficar longe de B-P. Sempre disseram que era um milico, gostava de marchar, amava ordem unida, tinha ideias retrógadas e eles se achavam superior ao tal do Escoteiro Chefe Mundial.

                     E agora? Claro que era um Bipidiano de mão cheia. Politicamente corretos são iguais a carrapato. Falam, falam e não mostram resultados. Mas eles tem o dom de dizer palavras difíceis, quem sabe copiadas pelos novos pedagogos e pensadores que até Rui Barbosa iria cair duro no chão quando os ouvisse. Pensei com meus botões (olhei e não tinha nenhum, nem de uniforme estava), olhei melhor estava pelado! Deus meu! Chegar pelado ao grande acampamento? O Que B-P iria dizer? Só me restava ir para os politicamente corretos da UEB. Afinal eles não dizem que o uniforme ou vestimenta não mostra quem é Escoteiro? Que ser Escoteiro é estar vivendo seu espirito em pensamento? Portanto se estava pelado seria bem recebido. Escolhi e parti para onde São Pedro me indicou.

                      A trilha estava suja, cheia de papel de balas. Assustei com tantos tocos de cigarro espalhados pelo campo. – Politicamente Corretos do inferno. Até aqui eles vem mostrar que não tem espírito Escoteiro? – Vou até lá dar uma lição neles. Cheguei ao campo, era só adultos. Meninos e meninas tem alma boa, não ficariam ali de jeito nenhum. Quando me viram um gritou! – Olhem! É o Chefe Osvaldo! Aquele metido a besta que se acha o tal no escotismo! Vamos amarrá-lo em uma árvore, fazer uma fogueirinha e botar fogo! Vai ser lindo ver o velhote gritar feito um calango seco. – Calango seco? Nunc ouvi falar, mas estes tais de politicamente corretos não perdem a ocasião para inventar. Pernas para quem vos quero. Virei um corisco entre as arvores. Tentava volitar e não conseguia. Pegaram-me, me amarraram na árvore. Olhe pelado, toma vergonha, logo você um Velho babão chegando aqui assim? Tu tá frito Chefe, pois morto já está!


                       Puseram fogo e vi que eles se formaram em um grande circulo e começaram a dançar o Tchan! O fogo me queimava. Um deles chegou perto e falou no meu ouvido: Chefe! Se vestir a vestimenta está perdoado! – Gritei alto; - Bota mais fogo na fogueira malditos! Nem morto? Caramba, eu não estava morto? Senti de novo a Célia me acordando. Malditos pesadelos. Agora estavam frequentes. Marido, se continuar assim vou levar você para o Doutor Sapiência aquele psiquiatra da UEB. Ele é Escoteiro e vai ajudar. – Célia! Gritei. Nunca! Na mão dele vou sofrer, pois vai tentar me convencer que Baden-Powell já era! Levantei, coloquei meu uniforme, arrumei minha tralhas na mochila e com a ração B, parti sem rumo por aí!

domingo, 11 de outubro de 2015

Contar histórias é uma arte?


Conversa ao pé do fogo.
Contar histórias é uma arte?

Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

                          É bom demais contar histórias. Qualquer uma, seja escoteira ou não. Quantas eu contei ou escrevi? Milhares talvez! Hoje não mais. A velhice rabugenta e meu pulmão revoltado me tirou a voz. Agora só escrevo. Eu me divertia quando contava, quando via a escoteirada ou a lobada me olhando com aquele olharzinho enigmático, olhares incrédulos e outros que se transportavam para dentro do contexto querendo viver toda a história contada. Seus olhares me faziam feliz. Tempos inesquecíveis. Uma história de fantasma, em uma floresta escura era sucesso absoluto. Um Fogo de Conselho se apagando e você fazendo gesticulando, como se os fantasmas estivessem ali marcavam cada um dos ouvintes Badenianos. Bom demais. E o susto do grito de horror no final? Masoquista Chefe? Não, depende da história. Se ela tem um fundo de exemplos pode contar. Tem seu valor. 

                    “Não há quem resista a boas histórias” escoteiras ou não. Nas páginas dos livros, dos jornais e das revistas, na tela do computador e na televisão, narradas ao pé do ouvido ou transmitidas pelo rádio... Seja lá onde for elas encantam, amedrontam, fazem rir ou chorar, assustam e são capazes de levar ainda que em pensamento há lugares nunca antes imaginados. Qualquer idade. De um Velho Escoteiro ou jovens escoteiros que ainda sonham uma vida de aventuras. Não tem quem não se emociona ao contar uma historia e ter ouvintes hipnotizados com a narrativa. Tem chefes que adoram. Em cursos contei muitas. E quem resiste a uma história bem contada ao pé do fogo? Vendo o crepitar da fogueira, olhando as fagulhas que se espalham no céu, e como um lobinho feliz abre os olhos e ouvidos para ouvir e viajar na história que o Chefe? A mente está ali fixa no conto, que vai desenrolar uma aventura e ele parte célere junto à história com as personagens. Ele se transforma, é um herói, um explorador, um grande acampador dos seus sonhos inimagináveis.

                   Dizem os historiadores que “Contar histórias é uma das mais belas ocupações humanas: Dizem ainda que elas surgiram na Grécia onde Homero sublinhava sues contos e se tornou um sublime contador de contos da carochinha” Todas as outras ocupações humanas tendem mais ou menos a explorar o homem; só essa de contar histórias se dedica amoravelmente a entretê-lo, o que tantas vezes equivale a consolá-lo. Infelizmente, quase sempre, os contistas estragam os seus contos por os encherem de literatura, de tanta literatura que nos sufoca a vida! É batuta começar e terminar um conto. Um dia descobri as histórias das mil e uma noites. Aquela da lenda na antiga Pérsia, quando o Rei Shariar descobre que foi traído pela esposa, que tinha um servo por amante. O Rei despeitado e enfurecido matou os dois. Depois, toma uma terrível decisão: todas as noites, casar-se-ia com uma nova mulher e, na manhã seguinte, ordenaria a sua execução, para nunca mais ser traído.

 Assim procedeu ao longo de três anos, causando medo e lamentações em todo o Reino. Um dia, a filha mais velha do primeiro-ministro, a bela e astuta Sherazade, diz ao pai que tem um plano para acabar com a barbaridade do Rei. Todavia, para aplicá-lo, necessita casar-se com ele. Horrorizado, o pai tenta convencer a filha a desistir da ideia, mas Sherazade estava decidida a acabar com a maldição que aterrorizava a cidade. E assim acontece, Sherazade casa-se com o Rei. O final? Risos. Quem sabe um dia vai ser meu convidado em um Fogo de Conselho e contarei para você.

               Eu já contei histórias em lugares nunca imaginados. Centenas de acampamentos, montanhas altaneiras, picos incríveis, em jangadas na calmaria de um rio caudaloso, ou mesmo em um anoitecer estrelado. Contei em jornadas de sol ou de chuva, em belos encontros de chefes, em volta de uma fogueira esquentando na liturgia da Conversa ao Pé do Fogo. Muitas das minhas historias tem um pouco do meu passado. Fábulas reais ou imaginárias. Garatujo muitas pensando que poderia ser assim, outras com uma pequena dose de ficção deixando no ar o gostinho da dúvida – Será que foi ou não verdade? – Tem as de final feliz e outras não. Chorar também é bom dizem os poetas. É o meu estilo de escrever. Minha biografia escoteira e pessoal foi cheias de episódios, momento alegres, outros não, mas que valeram cada minuto vivido. Todos eles ficaram marcados na memória. Alguns legítimos, outros apócrifos, e outros... Ah! Nestes casos ficam anotados na mente, com espaços ilimitados gravados em micro chips humanos, como recordação para a posteridade. Desses não esqueço nunca. Outros nem tanto. Um amigo já me disse que preciso fazer um backup da mente para nada se perder no tempo quando me for.

              Alguns contos ou narrativas são flashbacks que surgem do nada e se transformam em tudo. Assim caminha a humanidade eu pego uma carona fazendo sempre uma história para contar. Sei que se pudéssemos montar nossas biografias com fatos e feitos ocorridos, cada um de nos teria um volume imenso em paginas impressas no imaginário livro da vida. E você? Ainda não tentou contar uma história? Um fato acontecido que você nunca esqueceu? É tão fácil, comece a escrever, coloque uma pitada de sal, se possivel duas pimentas, uma cebolinha e uma dose de chimarrão ou café ou mesmo mate. Leve ao fogo lentamente. A conversa ao pé do fogo vai sair, quem sabe vai fazer você vibrar. Comece não se preocupe ainda com o recheio. O início amedronta, mas o final e fantástico. Escotismo é assim, cada acampamento, cada jornada, cada excursão são como se fossem centenas de páginas de um livro ainda não escrito da sua vida, só falta você para fazer à personagem viver! E lembre-se: “Boi não é vaca feijão não é arroz”... “quem quiser que conte dois”.


              Eu sei que um dia não estarei mais aqui para contar histórias. Ninguém é insubstituível. Outros irão me substituir e quando eles se forem outros e outros irão aparecer. Espero que os contadores de histórias façam reviver o escotismo puro nos seus pensamentos, nas suas palavras e nas suas ações. O melhor da história é saber que gostaram. Fico feliz quando sei que colaborei para um sorriso, para uma lágrima perdida nas histórias da vida. Meu muito obrigado a todos os leitores que eu levarei no meu coração para onde for! 

terça-feira, 6 de outubro de 2015

As aparências enganam. (baseado em fatos reais)


Lendas Escoteiras.
As aparências enganam.
(baseado em fatos reais)

                Surgiu como um fantasma em nosso Grupo Escoteiro. 1966? Pode ser. Ele não falava, gritava. Achava que todos ali naquela sala eram seus empregados. Deixei o que estava fazendo e olhei para ele. – Gritou: - Quem é o Chefe aqui? Meus amigos da diretoria olharam para mim preocupados. Melhor dizer que era eu. – Sou eu disse! – Ele me olhou enviesado. Era forte, alto e uma enorme cicatriz da orelha aos lábios. Briga na certa pensei. Cortado por faca! – Este é meu filho! Vai ser Escoteiro. Não o trate bem, Ele precisa aprender a ser homem. Façam o máximo de exigência, pois não gosto de meninos chorões. Não vou vir buscá-lo. Ele tem de aprender a chegar em casa sozinho. Aqui vocês são responsáveis por ele! – Deu meia volta e sumiu pela porta da sede do Grupo Escoteiro. Fiquei pasmado, os amigos da diretoria também.

                 Olhei para o menino na porta. Onze anos? Pode ser. Raquítico, cabelos negros bem penteado. Moreno e não sorria. Olhava para mim como se eu fosse mais um desafio em sua vida. Não era assim e nem nunca foi o procedimento para aceitar alguém no Grupo Escoteiro. Mandar o menino embora? Era o que devia ter feito e não o fiz. Mandei o garoto sentar. Conversei calmamente com ele. – Seu pai é assim? Ele respondeu – Meu pai é o que é e eu sou o que sou. Quando começo? Pensei com meus botões. Por hoje sim. Amanhã não sei. Chamei o Chefe dos escoteiros e expliquei da melhor maneira possível. Ele me olhou sorrindo e disse: - Está com medo Chefe? – Sem resposta. Não iria mostrar o que sentia. Olhando o menino que estava em posição de sentido olhando para mim, muito circunspecto achei que teria que ser mais sensato. Só completei ao Chefe Escoteiro: O pai dele vai aparecer. Vamos ver no que vai dar.

                    No final da reunião Dinho (apelido do menino) foi embora sozinho. Antes de ir chegou próximo a mim, fez pose militar e me deu um Sempre Alerta bem postado e falado. Espantei-me com ele no seu primeiro dia. Fui para casa tentando controlar os nervos. Fui a pé pensando. Na comunidade havia um certo respeito. Cheguei à conclusão que não haveria uma segunda vez. Respeito é bom e eu gosto. Mal virei à esquina e o vi no bar do Chico. Mesas e cadeiras espalhadas debaixo de uma castanheira antiga, onde sempre me reunia com amigos. Ele bebericava uma cerveja. Levantou-se e fez sinal para aproximar. Ora, ora! Fala-se no tinhoso e ali estava ele. - Se não desse bola seria mal educado, se desse atenção poderia ouvir o que não queria. Enfim entre o sim e entre o não me aproximei. Ficamos conversando por horas. Ele me contou causos e causos. Já estava ficando “borracho” e precisava ir para casa. Saí dali impressionado com que ouvi e vi. Jiparanã se tornou um grande amigo e eu sabia que iria morar em meu coração para sempre.  

                     Um dia chegou à sede e sem indagar ou perscrutar, aproximou de mim em uma reunião e perguntou quando podia fazer o uniforme e onde compraria o chapéu e os distintivos. Expliquei para ele que não era assim, havia normas, ele teria que passar por elas. – Bolas para as normas – disse. E na semana seguinte apareceu de uniforme surpreendendo a todos nós.  Resolvi relevar, daria tempo ao tempo. Pensei que breve ele iria submergir. Isto não aconteceu. Por duas vezes sem avisar se inscreveu em cursos na capital e os fez com seu rompante habitual. Mas fora isto era um excelente escotista. Dedicado, organizado e prestativo. Ficou como meu assistente na Tropa Sênior e os jovens o adoravam. Muitos jovens ficavam horas no seu estabelecimento comercial (açougue) conversando e aprendendo com ele.

               Surpreendeu-me nas atividades ao ar livre e nos grandes acampamentos. Era um excelente mateiro. Os seniores embasbacados com seus conhecimentos de sobrevivência na selva sorriam. Isto fez dele um herói e garanto que não me senti ofendido. Para mim era magnífico. Em pouco tempo eu iria embora da cidade. Seria ótimo contar com ele para me substituir. Seu gênio foi aos poucos sendo contido. Um dia alguém gritou para ele que suas pernas nuas abaixo da calça curta eram lindas. Ele se voltou e disse: - Você acha bonita? Deve ser igual a da sua mãe! Porque não vem aqui olhar? – Claro ninguém respondia. Seu estilo, seu bigode, sua altura, sua força não era para ser arrostada. Meses depois fui embora. Cinco anos depois recebi um telegrama. - Chefe Jiparanã foi preso e condenado a quinze anos de prisão. Não pestanejei, era uma amizade que não tinha igual. Pedi licença na minha empresa por cinco dias, peguei o trem noturno e voltei a minha antiga cidade.

                      O meu amigo Capitão Marlon me contou a história. Jiparanã estava em seu açougue e chegaram dois bêbados rindo e debochando, falando que ele um autêntico bicha e homossexual. Riram e completaram: seus escoteiros aprendem com você a fazer assim? Você pode imaginar o que aconteceu. Jiparanã deu uma tremenda surra nos dois. Foram parar no hospital. A história poderia ter terminado ali, mas os dois borrachos em uma noite, o atacaram em uma esquina, e mesmo ferido a faca em diversos lugares, matou um deles torcendo seu pescoço. Claro que foi legítima defesa. Mas o que foi morto era de uma família rica que contratou um advogado famoso para assessorar o promotor. O juiz não levou em consideração o passado de Jiparanã. Ele sabia que ele era Escoteiro. Deu-lhe quinze anos com possibilidade de sair em um cinco por bom comportamento. Fui visitar Jiparanã na penitenciária. Ele estava sorridente, alegre e me recebeu com regozijo, me abraçando e apresentando aos amigos da prisão.

                   Senti-me forasteiro ali. Conversamos por horas. Antes de partir o visitei outra vez e ele me disse que recebera uma carta da Direção Nacional, suspendendo-o das suas atividades de escotista, e enquanto não fosse feito o inquérito habitual ele não podia vestir o uniforme e participar de atividades afins. O Chefe do Grupo me mandou uma correspondência, um ano depois, comentando o caso de Jiparanã. Saiu da cadeia, e não voltou mais ao escotismo. A Direção Nacional o absolveu, mas colocou ressalva na sua participação. Os seniores estavam com nova chefia, mas apesar da proibição, Jiparanã ainda fazia atividades com eles, sem uniforme. Sua arrogância foi esquecida. Agora cativante era outro Chefe. Seu filho passou para os seniores e depois Pioneiro. Cuidava do açougue do pai.

                 Não tive mais notícias. Minha vida mudou muito. Jiparanã deixou saudades. Foi para mim um caso especial. Onde estiver e se ainda estiver vivo (deve estar com mais de 80 anos) espero que tenha alcançado a felicidade que sempre mereceu. Fico com saudades sempre que me lembro dele, Jiparanã, um saudoso valente cujo espirito Escoteiro era verdadeiro e amava a seu modo o escotismo. Nem sempre conhecemos os bons e os maus em profundidade. Se merecerem fazemos referências se são amigos contamos histórias.


quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Comentários de B-P


Se você tem:

Honra, ética, caráter, moral, honestidade, exemplo pessoal, palavra e respeita o direito do outro, então posso dizer que você tem o “ESPIRITO ESCOTEIRO”.