Historias e estorias que não foram contadas

Historias e estorias que não foram contadas
uma foto, de um passado distante

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Meu Chefe, meu herói!



“O teu filho te vê como um herói, não te transforme em um tirano aos olhos dele.”
Plutarco.
 
Meu Chefe, meu herói! - Fasc. 75

                 Recebi o recado do "Velho" quase na hora de sair do trabalho. Estranhei, pois dificilmente ele fazia isto. Fiquei preocupado e fui direito a sua casa. Estava cansado aquele dia. Uma máquina resolveu quebrar e ficamos horas desmontando e consertando. Deu trabalho. Nem tomei banho, pois o chamado do "Velho" tinha prioridade. Subi as escadas e abri a porta da sala grande sem bater. O "Velho" estava lá, como sempre na sua poltrona de vime favorita ouvindo um dos velhos discos de vinil que ele insistia em manter. – "Velho"? Perguntei. O que ouve? Nada, respondeu. Mas me mandou chamar com urgência? Eu? Só pedi para passar aqui, mas vejo que você é rápido no gatilho. E riu a vontade. Só queria saber se você é esperto o bastante para saber quando for uma chamada séria de uma idiota. E riu com gosto.
                Nada contra o "Velho". Suas manias eram por mim aceitas sem raiva ou rancor. Logo a Vovó adentrou a sala. Olá! Você aqui hoje? Sorri de leve. Dificilmente ia à casa do "Velho" as terças feiras. Voltei para o "Velho". Vamos aproveitar minha vinda aqui e hoje e você termina suas observações sobre aquele tema do Meu Chefe, meu herói. O "Velho" me olhou e disse, olhe, não chamei você aqui para isto, mas porque não? E você vai ter opiniões fresquinhas. Veja, estive neste sábado a convite em dois grupos escoteiros. Não conhecia. Apenas confirmou o que eu pensava sobre o Diretor Técnico, seus chefes e suas sessões.
              Mas antes quero fazer uma observação, pois vai servir como exemplo para minhas dúvidas que aqui irei narrar posteriormente. De vez em quando vou dar uma olhada na internet. Não me surpreendeu ver a foto do Escoteiro Chefe Inglês junto à rainha, junto aos jovens e abraçando lobinhos. Também o mesmo nos escoteiros americanos. A BSA faz o mesmo. Idem em diversos países. No Brasil não. Por quê? Porque não vemos dirigentes abraçando, cumprimentando e sorrindo junto aos jovens? Podem dizer que aqui eles são muitos. Mas onde estão? Não os vejo em bate papo na internet, não os vejo sugerindo com artigos em sites de amigos. Isto não seria possível com o presidente do DEN? Acabaram com termo de Escoteiro Chefe, implicaram tanto e hoje ninguém nem mais sabe que existia. Não sei por que, e fizeram isto que está aí. Fecham-se e alguns vêm me dizer que lá tudo é às claras. Mas esqueçamos disto. Só citei para lembrar que em outros países os dirigentes se mostram alegres, juntos aos seus irmãos escoteiros.
              Não o chamei para ir comigo, pois você disse que estaria trabalhando neste fim de semana que passou. Assim aproveitei a carona de um Chefe amigo e lá fui eu ao primeiro grupo. Pessoal bacana. Receberam-me muito bem. O Diretor Técnico foi o fundador do grupo. Está no cargo a mais de trinta anos. Os chefes me mostraram serem um pouco subservientes. Na presença dele abaixavam a cabeça. Confesso que não me senti a vontade. Não gosto disto você sabe. No escotismo ninguém deve abaixar a cabeça ou considerar o outro importante demais para ele. Fiquei pouco tempo. Deu para ver as tropas Sênior e Escoteira e a alcatéia. Não parecia uma família feliz. Não sei, mas acreditava que o Diretor Técnico estava sempre junto, observando, e quem sabe dando instruções aos seus comandados. Comandados? Não seria este o termo, mas ele era o “dono” do grupo. Trinta anos. Fundou o grupo. Queriam o que? Despedi-me e prometi sem muito entusiasmo voltar outro dia com mais tempo.
               No segundo grupo me senti em casa. Uma rapaziada alegre, cantando, brincando, chefes rindo, dando instruções para os monitores, alcateias cheias de vigor, olhinhos brilhantes significando que ali as reuniões eram perfeitas. Fui apresentado ao Diretor Técnico. Estava na sede, junto com outros membros diretores. Não estava lá mostrando junto às sessões não ser o chefão.  Conversava com os diretores alegremente. Preocupados com o desenvolvimento do grupo, não quis interromper e vi quando um diretor perguntou quando seria a nova eleição? Quando seria a próxima assembleia? Vi que o Diretor Técnico respondeu preocupado. Conversou com vários chefes sobre sua substituição. Ele já estava lá a mais de quatro anos e achava que precisava passar o bastão para frente.
                Voltei para casa pensativo. Afinal qual a maneira correta? Ora se você fundou o grupo tem que ter seus direitos. Mas isto é bom? Até um certo ponto acho que sim. Já vi muitos grupos cujos Diretores Técnicos são eternos. E muitas vezes perfeitos em suas funções. O grupo neste caso sempre tem uma boa sede e quase a maioria tem sua sede própria. Mas nem todos tem este carisma de arregimentação e se deixam prevalecer pela demagogia, e com isto perdem muito seu efetivo adulto. Claro, temos adultos voluntários que sempre usam a palavra servir antes de tudo. Obedecem sem pestanejar e ficam lá por poucos anos. Outros não pensam assim. Quando entram estão cheios de entusiasmo para aprender e ajudar. O tempo vai passando e ele gostaria de opinar, mas tem sua palavra cortada sempre. Chega uma hora que pega o chapéu e vai embora.
               Já comentei com você sobre a sede de poder no escotismo. Juram para mim que não existe. Existe sim. Na maioria dos grupos os Diretores Técnicos são eternos. O mesmo se aplica ao Distrital. Infelizmente também com região e a direção nacional. Juram para mim que não. Que a oportunidade são de todos. Dá vontade de rir. Teve até um, que não se identificou se dizendo anônimo que a democracia lá é perfeita. Dizer o que? Mas falo para você francamente, eu ainda não tenho uma opinião formada. Homens são homens. Com seus defeitos, suas qualidades e alguns até imprescindíveis. Não diria que são insubstituíveis não. Conheci um grupo que o “dono” se eternizou no cargo de Presidente deste que fundou o grupo até falecer 50 anos depois. E sabem o que aconteceu? O grupo fechou as portas.
             "Velho" acho difícil mudar isto. Veja você em nosso próprio Grupo. Você saiu depois de vinte anos, entrou um ficou doze anos e há mais de nove tem outro. O "Velho" me olhou e respondeu: - Deu certo não? Deu sim. Outra mentalidade. Uma democracia diferente, mas é. Tem um Conselho de Grupo e um conselho de chefes que funcionam, uma diretoria que funciona, e os escotistas de sessão tem tudo que precisam. Em tempo algum gastam nada no grupo. Atividades extra sede, cursos, encontros distritais, regionais e nacionais sempre cobertos pelo Grupo Escoteiro. Mas assim é o escotismo em quase todo o mundo. Em alguns lugares são mais sérios nas mudanças, na maneira de agir. Aqui não. Vieram alguns, mudaram com novos em cursos, pois agora estes cursos tem em sua maioria alunos que adentraram a pouco no escotismo e criaram um verdadeiro manancial de seguir o Chefe.
                 As tradições? Foram postergadas. Disseram que o mundo moderno exigia outro estilo. Mudaram tanto o uniforme que agora copiam de outros países dizendo que é novo, é lindo e por aí vai. Espere quando lançarem. As cores iguais. Deixaram de lado as nomenclaturas antigas, os nomes de etapas que tanto encantaram uma geração e assim foi surgindo uma mudança radical em tudo. Foi fácil. Os novos assimilaram o que os novos dirigentes diziam e sabemos que nossa disciplina, a vontade férrea em aprender nos faz acreditar no que dizem e fazem. Hoje vejo dirigentes vestindo qualquer uniforme ou traje e até alguns mal vestidos. Dizer o que? Copiar é claro. Eles são os chefes e os chefes são meus heróis.
               Isto não acontece em outros países. A maioria preserva suas tradições e suas identidades. Vejam voces muitos alegam que a BSA muda muito. Não muda. Quando faz mudanças faz pesquisas sérias com todos os membros. Aqui? Sim temos o sabe tudo. Ou melhor, Chefe Herói. Ele fala, ele diz, e todos dizem amém. E vá discordar para ver. Olhem as fotos de escoteiros ingleses, americanos, alguns países europeus e principalmente os asiáticos. Que garbo, sinto saudades quando éramos assim também. – Fiquei olhando o "Velho" e pensando. O caminho já tinha sido feito. Era um caminho sem volta. Agora pensava como poderia ser a liderança Escoteira em todos os seus níveis. Difícil dizer.
             O "Velho" como a adivinhar meu pensamento disse – Olha meu caro, o estilo nosso de hereditariedade nas lideranças em alguns casos são positivos. Talvez se houvesse mais seriedade nas alterações que fazem se dessem mais satisfação de seus atos a toda comunidade Escoteira e se estas fossem acompanhadas de pesquisas sérias não estas que dizem que fazem então até que o escotismo poderia ser outro. Mais sério. Agora não é. Chamo isto ainda de casta. Uns poucos mandando e outros obedecendo. Meu Chefe meu herói. São tantos heróis. Difícil dizer que eles são assim. Deviam ser o herói dos meninos e meninas, mas com essa profusão de uniforme, com essas mudanças que acontecem no programa, quem é o herói?
              Vovó apareceu na sala com seu carrinho mágico. Magico mesmo. Estava morto de fome. Sanduiches de Peru, de peito de frango, de camarão, pasteis de carne, de mandioca, de queijo. Para beber chocolate quente, suco de maracujá. Vovó era demais. Meu Deus! Vamos lá. Meu estomago não pode esperar. O "Velho" colocou Max Greger tocando Lullaby Of Bird. Comer, ouvir uma bela música e pena, eu não estava em casa para dormir e sonhar. Será que eu também seria um herói?

"Um herói é um indivíduo comum que encontra a força para perseverar e resistir apesar dos obstáculos devastadores."
( Christopher Reeve )


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