“Quem cede a sua liberdade essencial em
troca de um pouco de segurança temporária, não merece nem liberdade nem
segurança”.
Benjamim Franklin.
Atividades aventureiras para chefes escoteiros.
Fasc. 48.
Porque a escolha do caminho eu não sei. Não me pergunte. A
resposta é sempre a mesma. Livre arbítrio. Claro, poderia ter escolhido outro,
mas não, escolhi aquele. Devia ter perguntado aos outros chefes, mas não
perguntei. Tudo bem, agora era ir em frente e seja o que Deus quiser. A trilha se fora e agora nem a bússola ajudava. Um
caminho íngreme, cheio de ribanceiras, com aguada a cair de belas cachoeiras,
mas que não nos levavam a lugar algum. Claro, estava com medo e quem não
estaria no meu lugar? Os demais se mantinham calados e nada diziam. Achavam que
eu era o guia e sabia o que estava fazendo. Caramba! Puro engano, no começo me
sentia bem, mas agora estava trêmulo, com a respiração pesada e me maldizia
pela ideia daquela louca aventura.
Pensei que eu e mais onze escotistas do grupo que prestava a
minha colaboração estávamos bem preparados, alguns claro, Insígnia da Madeira e
isto era ou não um passaporte para uma grande aventura? – Se para as tropas
estávamos sempre sugerindo tais atividades e olhe sempre ficávamos com inveja
dos jovens por que nós chefes também não podíamos ter a nossa? No Conselho de
Chefes dei a ideia e foi aprovada de pronto. Nem discussão houve e olhe que
nosso conselho era bem animado e a plena democracia era ali praticada com muita
seriedade. Fiquei surpreso ao ver a adesão de tantos. Onze. Inclusive uma chefe
de tropa feminina e outra de guias. Outros tantos não iriam porque teriam
atividades escoteiras ou familiares e profissionais já programadas naquele fim
de semana prolongado.
A Serra do Mirvana foi à escolhida. Diziam os que lá estiveram
que era um lindo local ainda com matas preservadas, lindas cachoeiras e no pico
uma vista de tirar o fôlego. Conseguimos um mapa do local, e até nos foi
oferecido um guia o que educadamente recusamos. No programa sairíamos de ônibus
na terça a noite e voltaríamos no domingo. Afinal somos ou não grandes
exploradores, guias natos de jovens meninos e meninas que também se animam a
escalar das serranias as alturas? (contemplais que vereis, são jovens
escoteiros, entusiastas, joviais, briosos brasileiros que lá vão brincar ao léu
de uma aventura! – parte de um poema escoteiro).
Mas imaginem quem praticamente se obrigou a ir conosco quando
ficou sabendo da grande aventura dos molezas, como ele próprio batizou. Claro,
nada menos que o “Velho”. 82 anos, com seu andar claudicante, respiração sempre
fora do normal, e para aquela atividade seria o “fim da picada” ele ir conosco.
Seria é claro um estorvo e uma grande responsabilidade para os demais chefes.
Falei para a Vovó tentar dizer a ele para desistir da ideia. Ela sorriu
amavelmente e disse que isto seria impossível. - Se ele morrer no campo ou em
uma atividade ao ar livre e melhor ainda em um acampamento, já disse a você,
ele morre feliz. Lá também é seu hábitat.
- “Velho”, pense bem - dizia eu - vão ser cinco dias enfurnados
em matas, corredeiras, subidas e mais subidas, praticamente vamos dormir sobre
as estrelas, pode chover, esfriar, muitas vezes nosso almoço será frio, pois
não teremos tempo de acender fogo a não ser à noite. - Você alega ter
algumas dores aqui e ali, toma mais de seis remédios por dia, afinal quer se
matar? Eu não quero ver você dar um “siricutico” de velhice comigo na hora H.
Infelizmente desta vez você não pode ir. - Porque disse aquilo não sei. O
“Velho” pela primeira vez me olhou com os olhos cheios de lágrimas e nada
disse. Ficou calado, sentado em sua poltrona preta de vime, com seu cachimbo
apagado, a me olhar com aqueles olhos que preferia ter ido para o “meio dos
infernos” a sentir aquele olhar tão meu conhecido, tão amado e agora eu me
odiava profundamente.
Ele se calou. Nada mais disse. Fiquei ali mais algum tempo
conversando com a Vovó, mas com a voz engasgada. Ela também nada comentou. Comi
um ou dois biscoitos de polvilho, uma pequena caneca com chocolate quente que
demorou a descer pela garganta e fui embora. No caminho para minha casa me
maldizia pela ideia. “Deus do Céu” o homem que aprendi a gostar, a
amar, a ter como meu guia, meu professor, meu pai e agora estava lá, magoado
comigo, tentando nos seus derradeiros anos de vida voltar ao passado, fazer
atividades como sempre fez e eu ali, dizendo para ele que não?
Quando voltei do serviço à tarde, passei na casa dele. Estava na
mesma posição de ontem à noite, taciturno, sem falar, olhou para mim, seus
pequenos olhos azuis me encararam, mas nada disse. Não era o “Velho” que
conhecia. A Vovó comentou que ele passou a noite na poltrona, calado, sorrindo
para ela, mas sem argumentar, sem ao menos dizer que eu estava errado, não
podia mais fazer aquilo, seu tempo se foi com o tempo e agora era lembrar,
lembrar e sorrir com o que fez com o que construiu, com as amizades adquiridas
e mais nada.
Liguei da minha casa para todos e expliquei a situação. Disse
que infelizmente eu tinha que assumir a responsabilidade e levá-lo. Claro ouve
argumentos contrários, mas todos conheciam o “Velho” e assim, dei a notícia
para ele, sorridente, pensando que ele iria pular da poltrona, e dizer –
Maravilha, muito bem, agora uma volta ao passado e morrer feliz. Mas não, ele
continuou calado, nada disse. Os dias foram passando, os preparativos, as
conversas, as ideias, a compra de passagens, alimentação, enfim um “mundão de
coisas” que nós escotistas bem conhecemos. Sempre passava pela casa do “Velho”
e ele nada dizia calado como sempre, totalmente diferente do “Velho” que
conhecia. Cheguei à conclusão que a senilidade dele estava mais que presente.
Levá-lo seria um perigo e um grande erro.
Como não houve manifestação por parte dele e da Vovó nos dias
que se seguiram, achei que ele tinha desistido e para não sofrer mais vendo
seus olhos, sentindo a dor da ilusão de ser um velho, alguém que agora não
serve para nada, a não ser falar, falar e falar evitei ir a sua casa durante a
semana. Acho que consegui esquecer pensando na adrenalina que se aproximava. No
dia determinado, nos encontramos na sede lá pelas dezoito horas. As
esposas e parentes com seus veículos nos levaram até a rodoviária, onde de
ônibus partiríamos as vinte e duas horas. Nossa viagem seria de mais ou menos
três horas e meia, e desceríamos próximo ao rio dos Mandaquís, já bem na
entrada da Serra do Mirvana, conforme nos foi explicado pelo motorista. O
retorno poderia ser ali, no domingo entre dezesseis e dezesseis e trinta horas,
horário do retorno do ônibus.
Na rodoviária, despachamos nossas mochilas, pois levá-las junto
conosco dentro do veículo seria um contra censo. Ficamos ali batendo papo,
comentando as últimas e de repente, para nossa surpresa vimos sentado em uma
poltrona longe da nossa, nos observando de soslaio nada mais que o “Velho”,
sorridente, com a Vovó e a filha que devia tê-lo trazido. Caramba! Pelas barbas
de Maomé, esta eu não esperava. Dirigi-me a ele, assim como todos os
escotistas, pensando que ele fora ali para despedir de nós, dar-nos alguns
conselhos (era seu feitio) e nos desejar uma excelente atividade aventureira.
Mas não, o “danado” já tinha despachado sua mochila inglesa tão
conhecida de todos, e ali estava com seu uniforme caqui curto, seu chapéu de
abas largas com jarrete e tudo que tinha direito, uma pequena bota preta bem
engraxada, uma faca escocesa na cintura do lado direito além do canivete suíço,
do lado esquerdo uma machadinha, pequena e afiada bem protegida com a capa. Sem
esquecer é claro, seu cantil americano de 1940 que ganhou de um soldado seu
amigo, que participara da segunda guerra mundial. Perto da faca, um pequeno
cabo de uns 15 metros, enrolado a moda escoteira, (fácil para soltar e usar) e
no pescoço, enfiado no bolso direito sua bússola “Silva”, velha de guerra como
ele dizia. Levava ainda uma forquilha pioneira, que conforme explicou era para
tornar sua caminhada mais confortável.
Rimos alto. Ninguém nada disse contra, não houve oposição e
agora sabíamos que poderíamos não atingir o objetivo, ou seja, o pico do
Mirvana. Mas valeria a pena ter a companhia do “Velho”. A Vovó e a filha
nos incentivaram, e se elas não estavam preocupadas teríamos como obrigação de
também concordar com a participação dele. A viagem foi um sucesso. Ninguém pode
dormir. O “Velho” não deixou. Cantava, contava piadas, motivaram os outros
passageiros a cantar a Arvore da Montanha, Japeanã, o Cucu, Anauê, Piripiri,
Aconcágua, avançam as patrulhas, Canção do Clã e tantas outras canções lindas
que já tínhamos esquecido em nosso repertório e que ali voltou-nos à lembrança
de quem canta seus males espanta!
Agradecemos aos passageiros, ao motorista, todos enfim que
naquelas três horas e meia ficaram nossos amigos e vimos o “Velho” já equipado
com sua mochila às costas, nos chamando de molengas e dizendo - As patrulhas já
avançaram e estes chefes “pernas de pau?” – Rimos e esperamos que durante o
percurso ele se mantivesse sempre assim. Naquela época não tínhamos o telefone
celular e acho que se tivéssemos perderia a graça de uma boa aventura, de uma
boa jornada, pois na hora H era só telefonar e pronto. Bombeiros, salvamento,
helicópteros tudo para salvar os marmanjos que se dizem chefes. Partimos. Era
uma boa subida no início em uma estrada de terra que nos levaria até o rancho
dos guardas florestais. Ali já éramos esperados, pois pedimos antes
autorização.
O “Velho” parecia conhecer o caminho. Acho que pesquisou muito
sobre ele ou quem sabe, já tinha ido ao pico algum dia no passado. Não
sabíamos, mas ele nos mostrou exatamente onde era a cabana e quando chegamos
não tinha nenhuma dúvida. Era como ele havia descrito. Encontramos um guarda
ainda acordado, nos apresentamos, conversamos e ele educadamente disse que o
caminho era perigoso, se sabíamos o que iríamos enfrentar, enfim, nos deu ainda
todas as dicas. Pernoitamos na cabana, bem espaçosa, com colchonetes
improvisados e o “Velho” foi o primeiro a dormir. Vi em seu rosto um sorriso,
uma alegria contagiante que naquele momento não pensei nas consequências de
levá-lo conosco.
Deve ter sonhado com seu passado, com suas aventuras, com uma
vida escoteira tão cheia que até hoje, após oito anos que o conheço, pouco sei
a seu respeito. Ainda teria muito tempo com ele, para ouvir, sentir o que é ser
e ter o “Espírito Escoteiro”. Pela manhã, nem bem a aurora tinha dado as caras
e já estávamos enfrentando a subida. Eu estava com o mapa. Achei que era um bom
conhecedor em leituras de mapas e ensinava aos monitores como fazer um croqui,
ensinava o passo duplo, ensinava como fazer um percurso de Giwell, portanto era
o mais indicado. O “Velho” aceitou normalmente. Não fez nenhuma objeção.
Era o primeiro dia, a alegria era geral. Já pelo meio da manhã,
a vista era maravilhosa e isto sem atingir o pico que calculávamos ser lá pelas
dezesseis ou dezessete horas. Já não havia mais estradas só uma picada que nos
levava diretamente a uma floresta, cujo final desconhecíamos. Paramos lá pelas
treze horas, lanchamos, descansamos um pouco e partimos. Notei que o “Velho”
agora estava calado, mas não tinha aparência de cansado. Só não falava com
ninguém. Sempre escrevendo em um bloquinho que levava no bolso de trás. Se
perguntado, respondia em monossílabos. Bem, melhor assim, esperávamos que ele aguentasse
firme, pois nosso palpite era que iríamos ter problemas com ele.
O relógio marcou quatro horas, cinco horas da tarde e ainda
estávamos naquela mata, que aos poucos ia se fechando e a trilha já não existia
mais. Tinha desaparecido. Olhava de vez em quando minha bússola, consultava os
outros e sempre achando que o caminho era o correto. Ao “Velho” não
perguntamos, pois achamos que ele não tinha a menor ideia onde estava e não
poderia ajudar. As chefes femininas caminhavam até melhor do que nós, e sempre
com um sorriso nos lábios.
Escureceu. Um breu. Tínhamos lanternas e velas. Paramos, comemos
um pequeno lanche e resolvemos dormir ali. Não alcançaríamos o pico naquela
quinta. Ficaria para a sexta, o nosso programa era elástico e poderia ser
modificado. Dormimos não sem antes termos um pequeno fogo, algumas canções,
histórias e estórias contadas, o “Velho” contou uma de um vaqueiro que se
apaixonou pela filha do fazendeiro do Juruá e morreu afogado no Rio das Sete
Noivas, onde quem morre diziam não vai para o céu. Ninguém sabe por que e como
morreu, pois era um excelente nadador. Ela nunca mais se interessou por
ninguém. Não saia de dentro de casa. Passou anos e anos trancada até que seus
pais morreram.
Um dia alguém foi visitá-los e não acharam ninguém. A casa
estava vazia, com todos os móveis. Sua história demorou mais de meia hora para
ser contada. Mas prendeu a atenção de todos. Só mesmo o “Velho”. Veio à quinta.
Partimos. Achávamos que após umas duas ou três horas a mata desapareceria e
avistaríamos o pico. Diziam que lá tinha uma bela cachoeira, e que a margem um
belo bosque para passar dias e dias acantonados. Nada. Já tínhamos lanchado e
nossa caminhada continuava. Quatro horas da tarde, a mata não acabava. Logo
víamos que o caminho estava se tornando impossível. Pedras e mata fechada,
espinhos, corredeiras fortes enfim, dificuldades que nunca poderíamos imaginar.
Fizemos um pequeno intervalo lá pelas dezoito horas, trocamos ideias
e resolvemos escolher um local para pernoitarmos. O “Velho” sempre calado a não
ser de vez em quando assoviar o Rataplã nada disse e claro nem foi perguntado.
Ainda bem. Ele tinha um excelente espírito escoteiro para sua idade. Não foi
uma noite das melhores. Dormimos mal, Cada um pensando o que ia ser da
atividade. Eu estava muito preocupado. Principalmente com o “Velho”. Ele
parecia dormitar encostado a uma árvore. Não quis montar seu pequeno colchonete
e seus apetrechos noturnos.
No dia seguinte partimos. Comecei a me preocupar com a jornada
ou acho eu, a aventura que não sei se estava começando ou terminando.
Interessante que o “Velho” nunca mostrava sinais de cansaço. Olhei que sua
mochila estava bem cheia, com todos os seus apetrechos, e seu uniforme se
matinha em forma, pois não dormia com ele (tinha um macacão próprio para
dormir) e quando o olhávamos era como tivesse saído do chuveiro e se preparar
para uma atividade nacional. Agora a preocupação era de todos. O caminho sumiu.
Só subida que demorávamos mais de uma hora para percorrer poucos metros. Lá pelo
meio dia, paramos e após um lanche partimos. Veio à tarde, nada. Ainda olhava o
mapa, colocava minha bússola em ação e assim andávamos mais uns poucos metros.
Escureceu. Como sempre era melhor pernoitar, uma pequena chuva
começou a cair. Agora tudo bem. Vamos ser presenteados. Vimos o velho com sua
machadinha começar a cortar alguns galhos. Sentados, já com capas de plásticos
que tínhamos levado, vimos que em poucos minutos o “Velho” fez uma pequena
cabana que não daria para dormir, mas sentados caberiam todos e assim passamos
a noite. E eu me preocupando com ele e ele nos mostrando aos poucos como fazer
e o que fazer. Durou pouco a chuva, mas molhou todo o terreno que estávamos. O
“Velho” nos mostrou como com pequenos galhos entrelaçados e folhas poderíamos
dormir sem sentir o frio do chão molhado. Vivendo e aprendendo!
No sábado, bem cedinho, nos reunimos e decidimos voltar. Era
melhor. Não estávamos no caminho certo. Eu e todos os chefes já nos
considerávamos perdidos. O “Velho” não concordou. Afinal nosso objetivo
era o pico e se a Serra do Mirvana nos amedrontava, não tínhamos condições de
sermos chefes escoteiros. Somos escotistas, não é qualquer serrinha que vai nos
dar uma lição. – “Velho”, você está vendo o que acontece, está junto conosco,
não tem opinado, mas sabe que não temos a menor noção de rumo. É melhor voltar
e depois contar para todos esta aventura que estamos vivendo e lembrar-se dela
sempre.
- Pode ser uma boa ideia – disse o “Velho”. Lembrarmos-nos de
nossa derrota nesta serrinha porcaria. Mas acho que não é digna de chefes
escoteiros. Afinal hoje é sábado, temos até à tarde para atingir nosso programa
e então pensar na volta. Vi que não era bom argumentar com o “Velho”. Perder
mais um dia naquela mata não estava nos meus planos. O “Velho” educadamente me
perguntou se cedia a ele por umas duas horas a liderança da atividade, não mais
que isto. Vou mostrar a vocês como trato serrinhas como esta. Todos riram. Acho
que não conheciam o “Velho”. Não sei o que ele queria, em um terreno
desconhecido, com sua idade, talvez até mais cansado do que parecia e agora
querendo tomar as rédeas da atividade?
- Bem, porque não “Velho”, disse um dos chefes, acho que todos
nós concordamos e perguntou aos demais um por um. Por unanimidade deram ao
“Velho” aquela oportunidade. Poderia ser uma das suas ultimas de sua vida, pois
não acreditava que ele pudesse fazer uma nova atividade como aquela e se assim
o fizéssemos feliz, valeria a pena sem sombra de dúvida perder mais algumas
horas antes do retorno. O “Velho” sorrindo, disse a plenos pulmões – “Quem for
escoteiro que me siga!” e lá foi cantando - Avançam as patrulhas, lá ao longe,
lá ao longe, e nós sem saber o que dizer o seguimos, mas sem nenhuma esperança.
Andamos bem umas 2 horas, descendo, subindo, para noroeste, para sudeste, para
esnordeste, sulsuldoeste, enfim estava eu já perdido na direção e no rumo
seguido.
Esperei dar meio dia e já ia dizer para o “Velho” que seu tempo
tinha terminado e meus amigos, avistamos uma trilha que com poucos metros nos
levou para fora da mata e de lá já se podia avistar o pico. Com menos de 2
horas atingimos o ponto final. “Maravilha”, “danado de “Velho”, ou ele conhecia
o caminho ou estava gosando com nossa cara ou então era melhor leitor de mapas
do que eu e os outros”. “Velho”, você me deixa surpreso, afinal você já tinha
vindo aqui não? – Claro que não, o que fiz foi pesquisar bem o local por mapas
e na biblioteca do bairro deu para pesquisar bastante. Eu sabia de cor o
tamanho da mata, quando andaríamos e que as trilhas iam e desapareciam. Durante
o percurso fiz meu próprio mapa e sabia onde estávamos a cada passo.
Poderia ter mostrado o caminho certo desde o primeiro dia, mas
achei que vocês mereciam uma bela aventura para não se esquecerem durante todas
as suas vidas. Que você pratique e aprenda – Se vai para o mar, avie-te em
terra meus queridos chefes escoteiros. A vista era realmente fantástica. O dia
estava lindo. Sem nuvens e podíamos avistar paragens longínquas que não
conhecíamos e acho que não iríamos conhecer tão cedo. O final da tarde de
sábado foi estupendo. Vermelho ao sol por, delicia do pastor. Alegre, cantante,
abraços, sorrisos e a beira de um pequeno córrego com seu trovejar de águas
calmas e doces.
A noite foi tranquila, um céu cheio de estrelas, uma pequena lua
minguante, o vento soprando leve de sueste a nordeste, um fogo aceso, muitas
historias, o cachimbo do “Velho” com seu perfume adocicado, as canções, ah! As
canções. Lindas, cantadas com suavidade e quase acreditei que éramos um
conjunto harmonioso a se apresentar para uma plateia de mais de 10.000
escoteiros em um Jamboree realizado ali, naquele momento mágico. Dormimos
embalados pela grande aventura que passamos. Com sonhos simples, outros
fantásticos, de um começo, de um meio difícil e de um final feliz.
A volta foi sem atropelos. Com menos de quatro horas de descida
já tínhamos chegado à rodovia. O ônibus não demorou e o retorno tranquilo com
muito ronco de chefes esgotados dormido. Na quarta feira seguinte, fui à casa
do “Velho”, e conversa aqui e ali (ele estava sorridente, totalmente diferente
do “Velho” que conhecia) falamos das atividades aventureiras para chefes
escoteiros. – Improvisação – disse - Saber onde como e onde, mas sempre
improvisando. Só assim poderemos ter uma grande aventura para lembrar.
Mas “Velho”, porque nos deixou tanto tempo a deriva, poderia ter
nos ensinado e assim chegaríamos mais cedo ao pico, podendo apreciar mais
aquela bela paisagem. - Olhe, - respondeu o “Velho”, o sabor da aventura vem do
improviso, da dificuldade, da duvida e até desconfiança do certo e do errado.
Lembro que aprender a fazer fazendo é o melhor método e nunca, mas nunca mesmo
poderá ser substituído. Isto vale para os jovens, mas vale também para nós
adultos. Esperei o momento certo para agir, pois vi que todos não estavam
devidamente preparados para uma atividade com aquela.
Na tropa temos que ter certeza que os monitores estão
devidamente adestrados para que possamos confiar a eles uma atividade
aventureira, mas claro, nunca como a que vocês se comprometeram a fazer. Acho
que aprenderam a lição. - Se – continuou o “Velho” – não tivesse deixado vocês
a vontade, tentando acertar e mostrasse o certo, será que valeria a pena
chegarmos cedo, ver belas paisagens e em compensação perderíamos os tombos, o
medo, a chuva, a improvisação, enfim tudo aquilo que passamos e que chamamos sempre
uma grande aventura – Suas é claro, pois é já vivi muito isto.
- Olhe “Velho”, até posso concordar, mas tive medo por você,
tive dúvidas em levá-lo, pensei sempre no pior, mas você nos mostrou que
devemos sempre confiar. Quando achamos que o ajudávamos, era você quem nos
ajudava. Vovó veio cantando baixinho, e rindo disse do que o “Velho” tinha
contado a semana inteira para ela e para a filha a historia dos chefes
“patetas” na Serra do Perdidos. Já estava cansada com aquela lenga lenga toda e
gravei tudo para que ele não repetisse para todos a mesma coisa. – o “Velho”
ralhou amigavelmente com a vovó e ela disse que era brincadeira. Riram a valer
da piada.
Fui embora para casa, ruminando como são as coisas. Não
procuramos nossos velhos para nada. A não ser para um abraço, um sorriso
forçado, e achamos que somos os donos da verdade. Olhamos para eles com ar de
superioridade, pois achamos que temos todas as soluções e quando damos conta já
é tarde demais. Vejo muito isto em Grupos Escoteiros, em algumas famílias.
Poucos mas poucos mesmos são aqueles escotistas que procuram seus velhos e
antigos escoteiros para um bate papo, uma troca de ideias e pedir conselhos de
como fazer, como agir, aprender e saber como conseguir o sucesso na caminhada.
Julgam-se no caminho certo, acham que assim é que se faz.
Paciência, este não é meu caso. Cada dia aprendo mais com o
“Velho”, oitenta e dois anos e ainda dando exemplos, ensinando como se faz. É
pena que não tenha centenas de “Velhos” espalhados pelos Grupos Escoteiros
neste nosso imenso Brasil.
O
PATA TENRA
A ESCOLA DA
VIDA
_ A vida é
bela quando não é complicada.
(Robert Browwing);
- Este mundo é
duro para conquistar: Cada rosa tem seus espinhos, mas cada rosa tem sua
beleza.
(Frank L.
Stanton)
- Ninguém
passa a sua vida sem deixar suas pistas, assim como quem passa pela roça.
- Somos bobos
quando somos jovens! Porque pensamos sermos mais sábios dos que passaram pela
escola da vida, esquecendo que deveríamos aprender deles algo todos os dias.
(Janes na Fisbrug Gazette).
Baden-Powell
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