Historias e estorias que não foram contadas

Historias e estorias que não foram contadas
uma foto, de um passado distante

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

“Operação Mata Pato”


Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro.
“Operação Mata Pato”

                         Pelo sol baixo vi que a tarde estava chegando. Ainda a pino queimava minha cabeça através do meu chapelão Escoteiro. Nunca o abandono nas minhas andanças e nas lembranças quando fui um grande Agente Secreto Escoteiro. Não esqueço o dia que desceu do trem em minha cidade um homem estranho, alto, forte com um chapéu rosa esquisito na cabeça, de sandálias camisas e bermudas também rosa. – Que isto? Eu pensei. Só poderia ser um espião da KGB. Dizem que eles têm dois estilos. Um circunspecto sério, caladão e só andam na sombra da noite. O outro espalhafatoso, querendo se mostrar diferente para tapear agentes sérios como eu. Dei voz de prisão ao espalhafatoso. Afinal eu estava uniformizado, com meu chapelão (Cacilda, ele não sai da minha cabeça) e minha faca alemã na cintura. Ele me olhou e deu belas gargalhadas. Tirou do bolso uma identidade. Era o novo Juiz da cidade. Sorri seco e pedi desculpas. Escapei de boa, pois ele também fora Escoteiro.
 
                        Mas ali estava eu Piquitiba, capital de um estado que estava ficando famoso em meu país devido a Operação Mata Pato. Eramos considerados ao sul do trópico de capricórnio, (meu signo que sempre me deu sorte) como a nação das lindas mulheres seminuas das Faculdades do Samba (deixaram de ser escola e foram promovidas). Eu me orgulhava de ser um autêntico Arabutáneo, nome retirado de uma arvore mais bonita que o Pau Brasil. Arabutâ tinha mais de 300 mil escoteiros e se orgulhava de sua disciplina, pois não havia perdão para os faltosos. Ali se errou escoteiramente falando o pau comeu. Eu sabia que naquele mato não saia coelho e que abusava ia passar uma temporada vendo o sol nascer quadrado nas masmorras de Piquitiba. Mas eu era um valente. Sempre fui. Na minha infância enfrentei bandidos e peguei um jacaré pelo rabo só para ver quantas voltas em torno de si mesmo ele aguentava sem ficar tonto.

                         Não foi difícil encontrar a sede nacional. Eu sabia que estava sendo julgado. Tudo porque recebi o certificado me nomeando para a Academia Escoteira de Letras. Eu era agora um imortal por ser um fajuto escritor de contos escoteiros. Dois diretores um Italiano cheio de sorrisos e outro sulista trovador e tocador de guitarra haviam me nomeado sem mesmo perguntar se eu queria. Recebi pelo correio o fardão. Iria ficar supimpa com ele, mas perguntei se podia usar no dia da posse meu chapelão Escoteiro e por baixo meu uniforme caqui. Bem agora precisava saber se iam melar minha posse. Só em Piquitiba poderia saber. Era uma sede simples, quem via não dizia que até a Presidenta Cacilda Toupete invejava. A porta estava aberta. Olhei uns dez funcionários jogando dominó e outros tirando um cochilo. Não havia nenhum profissional Escoteiro lá. Estavam em falta. Aproveitei um roncado e corri até a porta das escadas que levava ao porão.

                         Minha nossa, levei o maior susto. Vários calabouços pintados de verde e amarelo e muitos desenhos da nova flor de lis estilizada. Ser preso junto a estes desenhos era o fim do mundo. Todas as celas cheias de chefes escoteiros. Vi que a maioria eram velhos escoteiros. Perguntei a um porque estava preso – Chefe! Não quis mais escrever SAPS. Eles souberam e me trancafiaram. Outro com aquela cara de B-P perdido no tiroteio em Mafeking disse não aceitar as mudanças do uniforme. Ele era um caqueano e não arredava o pé! Havia dezenas deles. Em um canto muitos listeiros da Flor de Lis confabulavam como sair dali. – Tomou papudo! Quem fala muito dá bom dia ao cavalo. Cheguei ao salão oval onde eles se reuniam. Parecia uma mesa que me recordava a Távola Redonda, onde eles se reuniam para confabular com o Rei Arthur. Sabia que ela foi feita este formato para que não tivesse cabeceira, representando a igualdade de todos os seus membros. Igualdade? Isto eu não vi ali.

                         Eram seis. Dois deles eu sabia que não eram mais da Comissão do TCHAN. Mas mandavam em tudo ainda. A mesa cheia de papeis, fotos minhas espalhadas por todo canto. Um vociferava: Temos que acabar com a raça deste maldito Velho Escoteiro! Outro dizia: Mil dias de prisão em solitária! Um lá do norte mais calmo dizia que devíamos respeitar opiniões. Coitado, foi massacrado. Um mineiro de fala mansa resolveu interceder por mim. Disseram a ele que não mandava nada. Ele fechou a cara. Afinal fora eleito pela maioria dos 0,01% do efetivo nacional na Assembleia Nacional. O Chefão da Comissão de Ética torcia as mãos. – Deixa ele comigo, vou mostrar com quantos paus se faz uma pioneira, isto é uma canoa! – O líder quatro tacos sorria de alegria e prazer. Já sonhava com seu quinto taco e quem sabe chegaria a seis como foi B-P. Havia muito tempo que não trancafiavam um chefão Escoteiro. Precisavam de um para dar exemplo e os demais dizerem SAPS sorrindo!

                           Ouve um zumbido atrás de mim. Me virei e vi mais de 1.000 Politicamente Corretos com aqueles bastões usados em jogos de basebol batendo nas mãos e dizendo: - Agora vais pagar por tudo Velho Escoteiro. Vais morrer na prisão. Um deles tirou o cinto para me dar uma cintada. A fivela entortou. Era material de segunda mão e não valia nada. Outro tirou um chapéu de pano da cabeça, vendido para aumentar o caixa mostrando uma careca enorme com oito fios de cabelo. – Vais me pagar pelos seus contos envenenados seu Velho chato de galocha! – Tremi na base. Não havia como escapar. Ninguem ia me socorrer. Uma figura de um Velho de barba branca com um sorriso legal me disse: Chefe faça como eu, enfrente os inimigos de frente. Eu fiz por merecer na guerra do Transvaal. Não corra! Não mate! Não morra! E viva Gilwell Park!


                     Comecei a berrar feito um louco. Tentei me desvencilhar e nada. Era cada vez mais preso no piso do chão. Me arrastavam e eu segurando o meu chapéu de três bicos. Dele nem morto ia me separar. Um deles falou baixinho no meu ouvido: Diga que vai vestir a vestimenta e eles te perdoam. Olhei para ele com os olhos chamuscando de raiva. Me mate, me enforque, corte minha cabeça com uma espada, mas se tiver de morrer será com meu caqui de quem nunca me separarei. Levei uma porretada na cabeça. Acordei com a Célia me chamando. – Marido! Outra vez? Quando vai parar estes seus pesadelos escoteiros? Putz Grila! Ainda bem que era um sonho, mas que pesadelo Deus do céu. Prometo nunca mais fazer isto e ser um escoteirinho obediente e disciplinado. Rarará!

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