Historias e estorias que não foram contadas

Historias e estorias que não foram contadas
uma foto, de um passado distante

domingo, 6 de março de 2016

Mitos, lendas verdades e inverdades do Uniforme Escoteiro.


Conversa ao pé do fogo.
Mitos, lendas verdades e inverdades do Uniforme Escoteiro.

           Convenhamos que eu não seja um estudioso das tradições do uniforme Escoteiro brasileiro. Sei apenas o que vi e vivi com ele nestes últimos 67 anos de escotismo. Não vou dar um testemunho como foi em todo Brasil, para mim impossível, mas posso falar mais na minha área de atuação. Não é aqui que vou discordar das escolhas de cada um. Sei que nosso uniforme ainda levanta duvidas e hoje muitos que fazem parte da nova geração acreditam que o presente nada tem a ver com o passado. Tenho dito em todos os lugares aonde vou e mesmo em meus parcos escritos que é difícil analisar uma era sem ter nela pisado com seus pés e sentido o calor do chão de terra. Os novos eruditos que se arvoraram em donos da verdade, muitos deles sequer conheceu o passado a não ser por escritos fazem hoje de suas belas palavras uma verdade que acreditam ser intocável. Não sei. Não quero polemizar. Já me disseram que isto não leva a nada. Meus comentários ficarão restritos ao uniforme básico. Os do mar e do ar quase não sofreram mutação e até hoje se mantem no tradicional quando foram criados.

           Uma vez em um curso da Insígnia de Madeira que participava O Chefe meu amigo e antigo mineiro já falecido, Doutor Francisco Floriano de Paula contou como foi à uniformização em Minas Gerais durante os primórdios do escotismo. Disse que no inicio do escotismo o uniforme foi o mesmo usado na Inglaterra. Uma espécie de caqui cinza com meiões pretos. Com o passar do tempo surgiu à calça azul com camisa caqui e assim permaneceu por muitos anos. Parece que a partir do final da década de 40, o caqui começou a se expandir por vários estados. Entre a década de quarenta e cinquenta o governo mineiro querendo uma expansão rápida do escotismo nomeou sargentos cabos e soldados para organizarem Grupos Escoteiros em todas as cidades mineiras. A falta de adestramento e literatura além de acompanhamento profissional fez do escotismo um pseudo militarismo. Os uniformes surgiram a bel prazer. Se no sul e no norte não foi assim fica o dito pelo não dito. Quando entrei para o movimento em 1947 os lobos usavam o azulão com o boné conhecido, mas feito à mão pelas mães dos lobos. Os Escoteiros já usavam o caqui curto, chapéu de abas largas e nunca se via adultos trajando calça comprida. Era uma tradição, pois BP nunca usou o uniforme com calça comprida. Sei que em vários estados ou cidades alguns grupos fizeram adaptações que não eram normativas. Assim apareceu o verde e cores parecidas com o caqui.

             O caqui, portanto era considerado o uniforme oficial dos Escoteiros da modalidade básica no Brasil. Em 1969 muitos adultos já forçavam o uso da calça comprida. Discutiam que em cada estado devia haver uma abertura e varias ideias começaram a ser discutidas. Cada um defendendo sua posição, o estilo de vida na comunidade e a temperatura ambiente. A busca de um novo uniforme levou a aprovação do Uniforme Social que depois foi chamado de traje. A explicação era que precisávamos de um uniforme mais palatável quando em atividades sociais e burguesas. Assim em 1975 formalizou-se o uniforme Social. O Chefe Darcy Malta Escoteiro Chefe na época, explicou em linhas gerais como ele deveria ser visto e apresentado.

             Para que os adultos levassem a sério o novo Uniforme Social, vamos chamá-lo de traje, a UEB enviou a todos os Grupos Escoteiros do Brasil um ofício via correio explicando como ele seria confeccionado, quais as ocasiões para o uso e juntou-se um desenho e pasmem-se: - um pedaço do pano tanto da camisa como da calça comprida. A confecção seria por conta de cada um. Havia a preocupação da uniformização sem mudanças ou alterações. O Tergal ou linho era regra geral. Para maior formalidade foi dado à possibilidade do uso do paletó e gravata. Que eu saiba uma minoria adotou este último que logo foi esquecido. No POR se sacramentou as normas e uso. Era função do dirigente de uma atividade determinar qual uniforme a ser usado. O POR em um dos seus artigos dizia: - Nas atividades escoteiras os chefes deviam usar o tradicional, ou seja, o caqui. Eu mesmo dirigi vários cursos onde se exigia ou o traje ou o caqui. Em vários avançados da Insígnia da Madeira que fui o diretor pedia sempre os dois uniformes. Cada dia usávamos um ou outro. O intuito era não só formalizar, mas mostrar que a uniformização deveria ser ponto de honra para nós Escoteiros. A aparência e a igualdade não poderia perder o garbo. Interessante que sem a tecnologia de hoje, a disciplina era irreversível. Poucos destoavam e obedeciam sem discutir.

          A partir do meio da década de oitenta muitos adultos e seniores passaram a usar o azul mescla com calças jeans desvirtuando o sentido da aprovação do traje no passado. Não esquecer que por volta de 1984/85 foi formalizado o escotismo feminino no Brasil e um novo uniforme foi acrescentado para elas. Isto depois foi esquecido e cada sessão feminina decidia pelo traje ou o caqui. A UEB nas diversas épocas subsequentes sempre alterava um ou outro item. Isto se banalizou completamente o sentido do uniforme SOCIAL. Cada grupo podia escolher o que seus participantes gostariam de usar. O próprio chapéu foi escamoteado abrindo a possiblidade do uso de bonés e outras coberturas. Lembramos que a própria UEB em sua loja vende um tipo de cobertura feita de brim ou similar e esta se espalhou por vários Grupos Escoteiros como uma chama. É comum ver o Chefe com ele e os jovens sem nenhum. Finalmente no final da década de noventa bastava portar o lenço com uma camiseta e se considerava uniformizado. A própria UEB foi quem criou esta Torre de Babel com o traje Escoteiro. Hoje se arvoram em dono da verdade e impuseram um novo uniforme a quem chamam de vestimenta.

          Com a participação em jamborees e atividades internacionais copiou-se o lenço preso nas pontas dando uma nova conotação da liberdade individual e apresentação moderna. Na nova vestimenta ficou a critério de cada um escolher como vestir e esqueceram-se da uniformidade. Nosso marketing deixou a desejar. Hoje cada um escolhe se quer a camisa solta ou não. Meiões ou não. Calça curta ou comprida. Lenço bem colocado no pescoço ou solto. Se isto vai dar nova visibilidade ao escotismo brasileiro vamos aguardar. Comparar o ontem com o hoje não é fácil. Era uma época que tínhamos o maior respeito com nosso uniforme. Nenhum novato poderia colocar peças antes da promessa. Todos faziam questão de estarem bem uniformizados e bem apresentados. Era uma questão de honra. Ninguém saia de casa sem ele. Impossível pensar em vestir na sede, pois o orgulho fazia parte de qualquer Escoteiro.


               Não sou partidário destas escolhas e muito menos da maneira de apresentação de muitos com a nova vestimenta. Sou um saudosista criticado por ser exigente na apresentação. Errado ou não havia um certo orgulho quando saímos em desfile ou se apresentando em atividades sociais. Se o hoje for considerado moderno, não tenho contra argumentos a não ser cobrar os resultados destas modificações. Só o futuro dirá.

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