Historias e estorias que não foram contadas

Historias e estorias que não foram contadas
uma foto, de um passado distante

terça-feira, 10 de janeiro de 2017

Ao meu amigo Chefe João Soldado!


Conversa ao pé do fogo.

Ao meu amigo
Chefe João Soldado!

              - Quanto tempo eim chefe? Tempo demais. Quase sessenta anos. Voltei algumas vezes a minha cidade e o meu grupo e depois nunca mais. Lembro que eu tinha uns 19 anos quando o vi pela última vez. Estava de mudança para a capital com o coração partido por ter que abandonar minhas raízes. Mas sabe Chefe, foi bom demais. Lembro-me quando o vi pela primeira vez quando mamãe foi conversar com o senhor para entrar no Lobinho. Piscou um olho para mim e deu um belo sorriso. Sabia que ia gostar de ficar ali nos escoteiros. Foi uma vivência que nunca mais esqueci. Mesmo sendo um Sargento da Policia militar, sabia sorrir, dar um tapinha nas costas para animar, e deixar que a gente fosse escoteirar, pois sempre nos disse que era assim que o Fundador do escotismo queria. O Chefe Jessé sua cria e O Munir Boca de Ouro, sem esquecer o Josias eram também assim. Pois é...

             Olha Chefe, não sei se aí em cima consegue ver o escotismo de hoje. Se conseguir saiba que tem muita gente boa querendo praticar um escotismo autêntico que alguns insistem em chamar de tradicional. De raiz ou não eu bato palmas para eles. Sei que não iria gostar de ver a uniformização de hoje. O Senhor sempre foi exigente na postura e no garbo. Chefe é uma liberdade que assusta. Uns colocam o bibico de pato com a aba voltada para trás, outros usam chapéus canadenses e tem aqueles que nem se incomodam em mostrar que a aparência e tudo. Tem aqueles que penduram o lenço no pescoço e se acham os tais. Nem vou falar da tal camisa fora da calça. Agora é moda.

              Sabe Chefe, não esqueço quando fui acampar pela primeira vez o senhor na inspeção me pediu minha escova de dente, pente, sabão para lavar o uniforme e espelho pequeno para ver se meu rosto estava limpo e bem asseado. Lembra-se do que me disse? - Escoteiro você vai para o mato, mas não é bicho. Se apresente sempre asseado e bem apresentado! E quando o Totonho e o Lampreia chegaram à sede sem o lenço, com a camisa escoteira de qualquer jeito, sem meião e o senhor os mandou de volta para casa! Eles reclamaram, mas lembro de que o senhor educadamente disse para eles que o Escoteiro ou está bem uniformizado ou não. Eles sabiam que só podiam vestir o uniforme depois da promessa. Bom isto né Chefe!  

                Dizem Chefe João Soldado que fazemos um escotismo moderno. Que a meninada escoteira quer assim. Lembra quando sentávamos em baixo da Mangueira enorme do pátio atrás da igreja? O senhor fazia o jogo da boa apresentação e garbo, o jogo da Verdade, o Jogo da Lei e o Lequinho da Elefante fingindo ser um Escoteiro indisciplinado? Chefe eu ria a mais não poder. Chefe eu aprendi muito com o senhor. Era nosso exemplo. Acho que por ser um militar fazia questão de ter tudo muito bem apresentado. O senhor sempre foi impecável no seu uniforme. Nas suas estrelas brilhando, na sua fivela do cinto escoteiro incrivelmente limpo, no seu chapéu de abas largas e retas, do seu meião com frisos retos do seu sapato preto sempre engraxado. Fazia questão de ter em nossa tralha escoteira, escova de sapato e graxa preta!

               Pois é Chefe, tudo está mudado. Tento me adaptar, mas é difícil. Pelo menos ainda visto o meu uniforme com orgulho. Nada de inventar coisas que não existem só para parecer que sou um herói de um filme e o pior Chefe é o danado do exemplo. Como se diz mesmo? Tal pai tal filho, ou tal Chefe tal Escoteiro? A gente Chefe João Soldado fica na espreita olhando aqueles que dizem tanto e não fazem tanto. São poucos que põe a mão na consciência para ver se estão educando para a vida ou para a liberdade de fazer o que bem entende. Enfim Chefe são as mudanças que o mundo fez ao rodar em volta de si mesmo. Não sei se o Senhor iria adaptar a realidade destes anos modernos. Mas Chefe eu ainda vou enfrentando por que tem muita gente boa escoteirando.

               Vou terminando mandando lembranças ao Nonô, ao Tãozinho, ao Carlos, ao Chiquinho, ao Pedregulho, ao Nonato e o Israel. Não me esqueço do Munir e se vir o Romildo diga a ele que não esqueço quando botamos o exército brasileiro para correr nas cavernas do Rio Doce bem acima de São Raimundo. Quase deu bode e eu passei o maior aperto. Diga a todos que tenho saudades da carretinha, da tralha da patrulha, das subidas e descidas dos acampamentos que fizemos quando juntos viramos as florestas de cabeça para baixo nas belas jornadas que fizemos. Não vou demorar em encontrar vocês. Mas não fiquem torcendo para eu ir logo, nada disto, deixa aquele lá do céu ordenar quando chegar a hora.

              Para o Senhor um grande e forte abraço. Eu fui feliz em ser um Escoteiro do Chefe João Soldado. Espero que ainda tenha aquele belo sorriso. Um sorriso honesto de gente que gosta da gente sem pedir nada em troca.
Sempre Alerta Chefe sem o tal SAPS coisa da modernidade que não gosto.
Abraços fraternos a todos e um até breve,

Do Vado Escoteiro da Lobo, hoje conhecido como Chefe Osvaldo.

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