Historias e estorias que não foram contadas

Historias e estorias que não foram contadas
uma foto, de um passado distante

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Quando termina a motivação o que fazer?


Crônicas de um Chefe Escoteiro.
Quando termina a motivação o que fazer?

                                  Chegando o final de ano. Mais uma leva de chefes entrando para a Legião dos Esquecidos. Quem são eles? São os que desistiram. Tiveram seus motivos. Sabemos que a UEB as Regiões e Distritos não se preocupam com eles. Os grupos perdem e correm a procurar substitutos. Quantos já se foram? Mil? Cinquenta mil? Cem mil? Pense e depois me diga. Nunca na vida real iremos saber, pois não existe um senso sobre isto. Não precisamos estar presentes em cada Grupo Escoteiro para saber. E olhe estamos falando de adultos, pois de jovens nem adianta falar. Assim como todos que um dia foram Escoteiros e saíram ninguém se lembra. Eu os chamo da Legião dos Esquecidos. Fiz até um artigo sobre o tema. Hoje me veio à mente um dos motivos que fazem com que partamos das fileiras Escoteiras para nunca mais voltar. Cada um de nós sabemos o que acontece quando estamos na ativa. Sabemos também que os jovens nos motivam e nos fazem sorrir, mas os adultos? Ufa! É difícil viver em grupo onde cada um tem seu próprio idioma em uma enorme torre de babel.    

                                      A motivação nem sempre é constante, É difícil aconselhar quem não há tem mais. Quem não passou por isto? Tem hora que você desanima. Dá vontade de largar tudo e sair por ai. Outros ainda insistem, mas sabem que o caminho que estão seguindo não leva ao sucesso. Se procurarmos um serviço de autoajuda teremos vários. As belas frases de efeito pululam por todos os lados. Todas com belas palavras, mas que não nos fazem sentir revigorados como antes. O escotismo é interessante. No início tudo são flores, sorrisos, promessas, alguns até deixam as amizades que tinham em troca de novas que conquistaram. Nos primeiros meses, e até nos primeiros anos aqueles mais chegados que não foram catequisados espantam com tanto carisma, com tanta alegria e demonstração de que ele alcançou um novo patamar, uma nova vida. Agora sou feliz ele pensa. Será mesmo?

                  Dizem os poetas que o que mais sofremos no mundo não é a dificuldade, é o desânimo em superá-la. Não é a provação, é o desespero diante do sofrimento. Não seria o fracasso e sim a teimosia de não reconhecer os próprios erros.  Mas o maior poeta já tinha dito que tudo isto são palavras e palavras nada mais são que palavras. Eu já passei por isto. Inúmeras vezes. Os problemas são diversos. Familiar, profissional, falta de ética, de amor, tratamento diferenciado, de sinceridade dos que se dizem irmãos de uniforme e de sangue e tantos sorrindo para você e você querendo chorar. Sabe da vontade de encontrar um buraco e se enfiar nele. Claro tem os mais fortes. Eles não transmitem para ninguém seus desânimos. São fortes. Tem sempre uma explicação para tudo. Mas será que dizem a verdade?

                 Se notarmos bem a matemática Escoteira ela é simples. Trinta e poucas reuniões por ano. Somando as reuniões de sede, acampamentos e excursões que sabe podemos chegar a aproximadamente quinhentas horas anuais. Claro, prevendo quatro atividades (e aí considerei às de vinte horas do dia) e considerando também nove meses de atividade, pois muitos têm férias em julho, dezembro e janeiro. Se estiver certo dedicamos cerca de vinte dias por ano ao escotismo. Claro que tem aqueles mais abnegados com o dobro de horas trabalhadas. Para uns uma eternidade para outros muito pouco. Mas porque então o desanimo? Olhem, existem vários motivos, mas para mim o principal deles é a decepção com o ser humano. Querer abancar o mundo e dizer que o líder é aquele que sabe liderar e ser liderado é fácil. Mas nem todos pensam assim. Tem os déspotas, que com o tempo a gente se sente ameaçado por uma força opressora mesmo vindo de alguém que se diz amigo de todos e irmãos dos demais.

                Nestas horas é que todos nós sentimos falta de um aperto de mão carinhoso sincero. Que falta que faz um abraço, um sorriso uma palavra de carinho principalmente daqueles que convivemos em ambiente que achamos familiar no grupo Escoteiro. Tem aqueles que nos olham como se fossemos parte do todo, indispensáveis em todos os sentidos, mas não é assim a maioria. Estes nos veem como indesejáveis, subservientes, dispensáveis, e se pudesse diriam: - Vocês estão aqui para servir e mais nada! Lembrem-se da promessa! Para ser como eu tem que “ralar”. E então vem aquele desanimo aquela vontade de sumir de mandar todo mundo às favas. Nem sempre fazemos na hora. A promessa que fizemos é um nó que nos atou nos sonhos escoteiros. Insistimos e alguns dão a volta por cima, mas outros, estes não conseguem. Quem sabe está aí um dos motivos da grande perda que temos de adultos que estão nos ajudando como voluntários, mas foram considerados eternos desconhecidos.

                   Não é o programa somente que nos afeta. Poderiam ser nossas finanças que apertam a cada atividade, a cada taxa cobrada seja em cursos e tem alguns que voluntários Escoteiros que pagam mensalidades. Pode! Está ali ajudando e paga para ajudar. Não sei e até posso estar enganado, mas se todos que labutam nas lides escoteiras, do mais alto escalão a aquele que está dando tudo de si pudessem mudar tentar um pouco ser mais irmão, não pensar em si próprio e dizer ao seu amigo palavras gostosas de motivação: - Que alegria em te ver novamente! - Aceite um forte aperto de mão sincero! - Posso te dar um abraço? - Quero que saiba que você é muito importante para nós, não nos deixe nunca, pois sem você iremos perder muito na expansão do nosso Movimento Escoteiro.

                     E aí quem sabe, seu desânimo seria guardado lá bem no fundo do bornal, pois você passou a acreditar que agora estava vivendo entre irmãos escoteiros. E você iria acreditar que não haveria mais os superiores, não haveria mais aquele sorriso de desdém, não haveria mais a conversa de esquina, a conversa de comadre. Ninguém iria desmerecer seu trabalho. Mas olhe, de vez em quando é bom dar um passo a frente. Faça um pouco a sua parte. Como dizia o nosso fundador e repetido por muitos, a felicidade só é completa quando você também conseguir fazer a felicidade dos outros!

¶Põe tuas mágoas bem no fundo do bornal e sorri, sorri e sorri,
O que importa é vencer o mal, mantem sua alegria,
Não importa você se zangar, pois o mal há de acabar e então!

Põe tuas mágoas bem no fundo do bornal e sorri, sorri e sorri.¶.

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

O lenço Escoteiro.


Conversa ao pé do fogo
O lenço Escoteiro.

              Um lenço? Só isto? Não meu amigo, se você não sabe ele tem um significado enorme. Ele fica conosco por toda a vida. Junto com nosso distintivo da promessa lá está ele preso ao pescoço. Quando o colocamos sentimos um orgulho enorme. Ele representa nossa casa Escoteira onde nascemos. Dá um toque especial para dizer: - Vejam! Ele é Escoteiro! Tem alguns países que o lenço é uniforme (igual) para todos, independente do Grupo ou a unidade local. Aqui não. Quando da abertura de um Grupo Escoteiro, ele foi discutido, escolhido votado e tem muitos que depois de receberem o guardam para o resto da vida. (o meu de 1947 está bem guardado) Quando muitos irmãos Escoteiros se encontram quase sempre vem àquela pergunta: - Você é do Grupo Tal? Ele reconheceu o lenço. Quer trocar? Tem gente que troca, mas o da promessa não. Este irá fazer parte de sua tradição na vida Escoteira. Contam-se maravilhosas histórias de Escoteiros e Escoteiras que fizeram do seu lenço um meio de ajuda ao proximo. Sei de casos que ajudaram a salvar vidas, ajudaram a tirar dores, e outros que serviram para coisas impossíveis de se pensar.

             Mas me dizem: - Ele não é uma simples peça do uniforme? – Claro que sim, mas de todas as peças que compõe nossa uniformização ele tem mil e uma utilidades. Sei que todos Escoteiros e Escoteiras um dia utilizaram o lenço para alguma ajuda ou mesmo para resolver problemas seus que poderiam ajudar a evitar acidentes e claro uma forma de colaborar quando estes acontecem. Vamos lembrar algumas: - Quem sabe o lenço serve para se fazer diversos tipos de tipoia? Ajuda para pegar uma panela quente no acampamento? Depois de molhado serve de proteção contra fumo, pó ou fumaça? Quem sabe substituir a falta do sisal para prender algum como emergência? Lembram-se quando ele serviu como venda nos olhos para um gostoso jogo Escoteiro? Treinando se faz dele uma bolsa de emergência para levar frutas gostosas encontrada no campo? Poderia servir como uma atadura temporária? Ou então como bandeirola para chamar a atenção da patrulha ou de um Escoteiro?

               É o lenço é inigualável. Veja que ele ajuda a transportar pesos na cabeça, serve de almofada, quebra o galho para substituir o cinto que se quebrou, ajuda a tampar alimentos frescos antes do almoço para evitar mosquitos e olhe serve até para fazer uma escada em emergências com dois bastões. Sem contar que serve para amarrar tripés, fazer costura de arremate, e tem até Escoteiro que tentou enforcar um bandido com seu lenço! Calma, estou exagerando! Kkkkk. Mas o lenço é formidável. Agora o seu de promessa tem de ser respeitado para não estragar. Cuidados com mofos, sujeira demais, dobrar errado. Dobrar? Existem diversas técnicas para dobrar o lenço. Cada Chefe tem uma. Tem aqueles que dobram em cima de uma mesa. Tem outros que fazem voltas com ele sobre si mesmo (eu nunca consegui) tem aqueles que usam o ferro de passar e tem aquela técnica que eu uso. Preso no dente e enrolando aos poucos com as duas mãos. Mas só para quem treinou bastante. Claro que cada Chefe com sua experiência de anos têm outras utilidades e formas de dobrar o lenço. Mas o principal é o respeito. Ele é seu grupo preso a você. Se orgulhe dele.

              Durante muitos anos os lenços Escoteiros eram quadrados. Dobrados em triângulo e depois enrolado. Na lista de material individual pedido aos rapazes de Brownsea, constava um lenço, de preferencia da cor verde escura. Existia no passado uma tradição que ao sair com ele o Escoteiro dava um nó na ponta. Isto para lembrar que devemos fazer uma boa ação diária. Escoteiro sem o nó significava que já fez sua boa ação. O termo em inglês para o nosso lenço é “neckerchief” ou “scarf”. Dizem que só por volta de 1923 é que se tornou um o hábito de usar uma anilha (anel) nos lenços. Até aí era simplesmente usado um nó tipo gravata. Conta-se que os Escoteiros americanos (boy scout) só começaram a usar o lenço no uniforme a partir de 1920.    


                Chega por hoje, mas olhe siga meu conselho treine muito o uso do lenço, não fique só na teoria. Um dia vai precisar e verá que a teoria não ajudou. Pratique sempre e não esqueça se orgulhe do seu lenço, ele é sua senha para se declarar Escoteiro do mundo!

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

O Escoteiro Zezé e o Espião de olhos vermelhos


Lendas Escoteiras.
O Escoteiro Zezé e o Espião de olhos vermelhos

             Zezé era um Escoteiro Sênior dos bons. Nunca foi Monitor. Nem sub monitor. Entrara como Escoteiro há quatro anos. Achava-se obediente e disciplinado. Conseguiu a segunda classe e quase “tirou” a primeira. Passou para os seniores e estava na Patrulha Leão do Norte há um ano e meio. Também nunca foi escolhido para liderar a patrulha. Ele fazia do escotismo sua diversão e seu modo de vida. Os seniores tinham uma bela união. Eram três patrulhas. No ano anterior duas escoteiras passaram para guias. Resolveram colocar na Patrulha, pois eram quatro escoteiros. Elas e eles se deram muito bem.

          Acampavam sempre. Todos eram bons mateiros. Zezé há tempos atrás começou a ler todos os livros que lhe caiam em mãos. Lia tudo. Não importava o tema. Com o passar do tempo passou a ler mais livros de ficção, e adorava os policiais, principalmente aqueles de espionagem. Passou a ser um entendido das grandes agencias de espionagens em todo o mundo. Aprofundou seus conhecimentos no MI5 Inglês, na Cia Americana, na KGB russa, no Mossard Israelense e na SSA Francesa. Claro sabia um pouco de outras, mas essas eram suas preferidas.

          Quando não estava na escola lá estava Zezé na parada de ônibus interestadual, na estação de trem e de olho em algum veiculo novo que entrasse na cidade. Ganhou de seu avô um chapéu de feltro e paletó cinza que sua mãe cortou na sua altura. Colocava o paletó, o chapéu e lá ia ele meio escondido nas colunas da estação ferroviária a perscrutar quem descia da composição. Tinha amizade com Dona Manuelita do Hotel Ouro Verde e ela sabia do que ele gostava. Rindo dizia – Zezé nenhum cliente novo. Se chegar alguém te aviso.

           Estava Zezé naquela quarta feira na estação, como sempre atrás da coluna da entrada, claro, com sua indefectível capa e chapéu de feltro, quando desceu do vagão de primeira classe um individuo suspeito. Usava óculos escuros, terno preto e gravata vermelha, e somente uma maleta de couro marrom nas mãos. Sinal de que ficaria pouco tempo. (Zezé era assim, um Sherlock às avessas). Notou que o individuo olhou para um lado, para o outro, de cabeça baixa, claro Zezé sabia que ele não queria ser reconhecido.

          Notou que ele subiu na charrete do Laureano e foram em direção ao hotel Ouro Verde. Esperou um tempo e entrou. Dona Manuelita olhou para ele e sorriu. – Acho que desta vez seu espião chegou! Zezé sentiu o sangue ferver. Ele sempre pensou que jovens como ele tinham dentro de sí uma grande batalha a vencer. Ele sabia que ali estava sua oportunidade. Não poderia ser sua ultima vela de uma viagem ao mar. Ele não iria desta vez esperar que as bandeiras fossem desfraldadas antes da continência.

          É como diziam os Árabes, Senta-te nos calcanhares enquanto ruge o trovão e deixa que Alá vele pelo amanhã. Zezé começou sua vigília. Não procurou os amigos da Patrulha. Poderia até ter procurado a Camélia sua amiga e confidente na patrulha. Mas não. Sabia que o espião não conta suas fontes, nada diz as suas amantes e seus contatos são feitos de modo tal que ninguém irá descobrir. Zezé era um “expert”. Iria descobrir quem era Franz Henri e o que ele tinha ido fazer em Monte Alegre.

          Pena que sua escola era de manhã. Mas nem almoçou direito quando chegou a casa. Colocou sua capa seu chapéu e subiu na “Cavernosa” (sua bicicleta Hercules que seu pai comprou para ele faziam dois anos). Foi rápido ao hotel. Dona Manuelita lhe disse que já tinha saído. Para onde foi? E como foi? Na Praça Lionel um dos charreteiros de aluguel contou que ele alugou a charrete do Laureano e ele mesmo iria levar a charrete. Dispensou Laureano. – Ai tem treta! E das grandes pensou!

      Só podia ter ido rumo à fazenda do Vasconcelos. Lá foi Zezé a toda velocidade na sua Hercules e claro, logo viu a marca do pneu da charrete. Menos de oito quilômetros depois lá estava ela, presa na cerca de madeira. Onde ele foi? Onde? Viu no alto do morro ele descendo. Onde teria ido? Esperou e ficou a pouca distancia observando. Notou que ele demorava a descer. – Sentiu um cano nas suas costas. – O que quer aqui rapaz? Zezé virou. Levou o maior surto. O tal do Franz o olhava e dos seus olhos brotavam chispa vermelhas! Na sua mão uma Luger PPK, que para Zezé parecia uma metralhadora Gatling.

     Claro, a vida de espião de Zezé nem bem tinha começado e ele já molhava as calças! Zezé saiu em desabalada carreira com sua Hercules e nem olhou para trás. Quando chegou a casa seu coração batia sem parar. Seus olhos estavam esbugalhados. Entrou para seu quarto e ficou ali por muito tempo até seu coração parar de bater. Não poderia descobrir o que o espião foi fazer na sua cidade sozinho. Tinha que convencer sua Patrulha a ajudar. Sabia que eles iriam rir dele, mas como convencê-los?

    Primeiro foi à casa da Camélia. Ela ficou séria e acreditou em tudo que Zezé contou. Foram à casa do Tiãozinho, mas ele riu de tudo que lhe contaram. Mesmo assim foram até a casa do Levegildo, do Moreno e do Marquito. Dalí foi para a sede escoteira. Durante mais de duas horas Zezé contou e recontou tudo que viu e sentiu. Eles a principio davam risadas. Já conheciam o Zezé e suas manias de espionagem. Mas chegaram à conclusão se verdade ou não eles não poderiam ficar de fora.

   Traçaram um plano para a Patrulha seguir o tal de Franz. Quem estudasse a tarde ficaria responsável pela “campana” da manhã e a tarde quem estudasse de manhã. Só Tiãozinho o Monitor e Marquito estudavam à tarde. Mas Tiãozinho foi taxativo. Faremos tudo com uniforme. Nada de ficar como civil. Se ele for um espião verá que não somos qualquer coisa. Somos escoteiros. Aqueles que morrem de pé e não tem medo de cara feia!

    Quando Zezé saiu da escola encontrou com Marquito que dizia saber onde o tal Franz estava. Reuniu toda a Patrulha. Naquele dia Tiãozinho e Marquito não foram para a escola. Tudo pela honra da Patrulha. Enturmados lá foram eles em suas bicicletas rumo à fazenda do Vasconcelos. A charrete estava no mesmo lugar. Deixaram as bicicletas próximo à cerca e subiram o morro. Marquito mostrou onde ele estava. Na Pedra do Embaúba. Mas que “Diabos” ele foi fazer ali? Rastejando, como se estivessem em um grande jogo se aproximaram da pedra.

    Lá estava o Franz. Seus olhos eram medonhos. Vermelhos. Parecia que saiam chispas de fogo. Ele tateava devagar, com calma cada centímetro da pedra. Quando estava dando a volta viram que ele sumiu. Não apareceu mais. Mesmo amedrontados eles foram até a pedra. Deram uma volta e o danado do Franz tinha sumido. Mas para onde? Não tinha como sair pelo morro. Eles o viriam. Começaram a tatear parte por parte da pedra. Marquito deu um grito! Achei! Correram todos. Uma saliência brotou quando ele apertou uma pedra solta. Logo a abertura de um túnel apareceu.

E então perguntaram a Zezé. - Então que vamos entrar, disse Zezé. Entraram e a porta se fechou. Uma escuridão tremenda. Não viam nada. E o pior não tinham levado lanterna e nem vela. E agora o que fazer? Não achavam nada na pedra por dentro que fizesse a abertura abrir. Os olhos aos poucos acostumaram com a escuridão. Lá em baixo uma pequena luz. Tateando foram descendo uma espécie de escada. Pé ante pé! Lá estava Franz. Nas mãos um castiçal enorme, uma âmbula e um cálice que brilhava como se tivesse luz própria.

A poucos metros havia uma área escavada. O Espião cavou ali. Deixou tudo enrolado em uma manta em um canto e começou a subir as e escadas devagar com uma lanterna. Eles conseguiram esconder-se numa saliência. Ele passou por eles e se foi. Havia no fundo da gruta uma iluminação que eles não souberam explicar. Levegildo voltou subindo as escadas e agora podiam ver melhor onde entraram. Ele encontrou a saliência. Gritou para todos. Logo a porta se abriu e saíram dando alívios e urras de alegria.

Uma alegria que durou pouco. O danado do Fritz estava a poucos metros deles com sua Luger PPK nas mãos e rindo. Gruiu umas palavras que ninguém entendeu e atirou. O tiro passou de raspão na orelha de Zezé. Nunca correram tanto. Uma ventania desceu o morro e passaram com rapidez pela cerca. Em desabalada carreira voltaram para a cidade. Foram para a casa da Camélia. Seu pai era o delegado. Melhor colocar ele ao par.

Custou a acreditar naqueles meninos. O Delegado Davison não era de brincadeira. Foi com eles até a pedra do Embaúba. Abriram a porta e desceram. O Delegado viu a manta com os objetos. Deve ter sido há muitos anos que saqueadores de igrejas esconderam ali seu butim. Só podia ser isso. Voltaram levando os objetos. O Delegado foi até ao hotel, mas o tal Espião havia partido. Para onde ninguém sabia. Meses mais tarde descobriram se tratar de peças de mais de um século. Valiosíssimas. O Governo as levou. Para onde? Perguntaram. Para o museu da capital.

Não houve festa, condecorações, agradecimentos nada. Apenas a lembrança do Espião dos olhos vermelhos. Esqueci a tropa e quase toda cidade passaram a fazer da Pedra ado Embaúba um local turístico. Usaram tanto que o dia a pedra não abriu mais. O prefeito quis dinamitar, mas a Câmara de Vereadores não concordou.

Zezé continua a bancar o caçador de espiões até hoje. Agora um Pioneiro está sempre de plantão na rodoviária a espera de alguém que não aparece mais. A noitinha corre para a estação a espera do noturno. Quem sabe um dia ele de novo vai se encontrar com algum outro espião? Esse Zezé é um grande Escoteiro. Na Patrulha adquiriu o maior respeito. Até fez de Camélia sua namorada. Dizem eu não sei que casou com ela. É dono da sorveteria da cidade e nunca deixou de olhar e observar quem chegava e quem saia.


Acho mesmo que ele tinha na veia uma queda pela espionagem. Pena que a Cia e o MI5 não o descobriram. 007 que se cuide, pois Zezé é o “bamba” em Monte Alegre. A cidade sabe que um dia será conhecida por alojar em sua família o maior espião de todos os tempos. O Escoteiro Zezé!

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

O palavrão.


Conversa ao pé do fogo.
O palavrão.

                      Não gosto. Não gosto mesmo. Se tiver quem goste fique a vontade claro longe de mim. Não critico. Na minha época de menino diziam que estávamos com a boca suja. Na minha família dificilmente alguém dizia um palavrão. E se por acaso dissessem podia esperar um pedido de desculpas. Lembro uma das minhas irmãs sobre um ex-namorado dela falou um palavrão. Uma semana depois quando estávamos jantando ela pediu desculpas a todos. Era questão de honra na patrulha e na tropa não falar palavrão. Se fosse seguir a lei escoteira aí que palavrão seria proibido em qualquer lugar. Lembro que em um acampamento distrital de patrulhas uma delas não tinha papas na língua. Quando um chamava o outro logo vinha um palavrão. O cozinheiro coitado era xingando a torto e a direito. Dizem que nós adultos somos responsáveis pelos jovens falarem palavrão. Concordo. O jovem sem a gente perceber copia tudo que o adulto faz.

              Nestes acampamentos nacionais, aventuras e Jamborees soube que os palavrões andam soltos. Não posso afirmar, pois não tenho participado deles. Dizem que entre os jovens isto é comum. Comum? Bem só se for para eles, pois para mim não. Assim como dou o respeito exijo ser respeitado. Outro dia um Escotista me disse que isto hoje é natural. Não é não. É falta de respeito. É descumprir a lei escoteira. Para dizer a verdade nem piadas com palavrões eu gosto. Quando alguém começa a contar e vem um palavrão eu fecho a cara. Podem chamar-me de quadradão, Velho chato o escambal. Como pensar em um jovem ou uma jovem adquirir o “Espírito Escoteiro” falando palavrão? Afinal dizer por dizer que o Escoteiro é limpo de corpo e alma é fácil, mas ser limpo realmente é outra coisa.

              Dizem que um grande escritor já escreveu o dicionário do palavrão brasileiro. Um herói para muitos. Para mim não. Herói é outra coisa. Herói é o que fala e escreve sobre o amor, do respeito, da ética, do caráter, do aperto de mão sincero, do sorriso verdadeiro e saber que ele é um homem honrado e não me venham dizer que o palavrão não atrapalha nada disto. Já me disseram tantas coisas da modernidade que eu fico pensando se vale a pena ser moderno. Uma vez, há muitos anos visitei amigos que participavam de um grupo Escoteiro. Cheguei lá como sempre chego. Meu caqui querido, meu chapelão, barbeado, banho tomado, lenço bem dobrado, meião nos “trinques”, sapato engraxado e unhas aparadas. Queria dar o respeito aos jovens que ali estavam. Jogavam futebol. Meu Deus! Quanto palavrão. O Chefe ria a vontade. Olhei para ele sério – Você acha graça? Isto é escotismo? Futebol? Palavrões? Dizer o que? Primeiro futebol qualquer Escoteiro joga a semana toda em sua escola, na rua em qualquer lugar. Nas reuniões de tropa é falta de programa é falta de conhecimento de bons jogos, e os palavrões? Caramba! Que mau exemplo.

             Esta semana vi um artigo de uma jovem mãe cujo nome não me lembro. Adorei o que ela escreveu. Fez-me ver que não estou sozinho nesta cruzada. Disse ela: Sinal dos tempos ou falta de educação:
- Outro dia li uma nota em uma coluna e contava que a quadra de tênis de um condomínio na Barra tinha sido interditada não por problemas de estrutura, obras nem nada, mas pela falta de educação dos frequentadores. De tão desbocados, eles – crianças, adolescente, jovens – começaram a incomodar tanto os vizinhos à quadra que o jeito foi fechá-la. Já tem um tempo que venho observando isso e me impressionado. Gente é meu ouvido que está ficando velho e chato ou as crianças andam desbocadas demais? Vejo crianças de sete, oito, dez anos falando palavrões que eu só fui falar na vida adulta e ainda assim me arrependo de ter adquirido esse hábito pouco fino. Tenho amigos que falam palavrões com os filhos normalmente e isso me faz lembrar-se do quão desbocado era meu pai. Só que meu pai nunca dirigiu um palavrão a mim ou a minha irmã e jamais admitiu que falássemos. Às vezes me sinto incomodada em locais públicos, como a praia ou o saguão de um cinema, em que adultos falam palavrões aos berros, sem a menor cerimônia, como se não houvesse crianças em volta.
                 Aí outro dia ouvi uma psicóloga que tem coluna numa rádio de notícias dizer que isso tem a ver com o código de cada família e que os pais podem conversar com os filhos e estabelecer as próprias regras, tipo esse palavrão pode, esse não pode. Sei lá, achei isso meio complicado e, considerando que uma hora não se tem mais controle sobre o vocabulário dos filhos mesmo, acho mais prático proibir enquanto crianças e adolescentes e estabelecer o limite do tolerável quando jovens e adultos. Mas que não quero ver minha filha na pracinha ou no play xingando os amigos ou berrando palavrões a esmo, ah, não quero mesmo.

                       Bem pensado bem falado e bem escrito. Continuo não aceitando palavrões principalmente no escotismo. Bolas, que escotismo é esse que está cheio de palavrões? Bah! Quer falta de respeito. Não me convidem para nada onde eu possa ouvir um palavrão. Quer saber? Participei de centenas de Fogo do Conselho. Se um esquete ou algum participante falava um palavrão, esperava acabar e o chamava em particular. – Mas chefe! Não viu como eles riram? Diziam. Pode ser. Mas eu não ri. E se você considera que é um Escoteiro puro nos seus pensamentos nas suas palavras e nas suas ações, tenho certeza que nunca mais irá falar um palavrão!

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

A Escola da Vida!


Conversa ao pé do fogo.
A Escola da Vida!

"Deus nos concede, a cada dia, uma página de vida nova no livro do tempo. Aquilo que colocarmos nela, corre por nossa conta."

                       Não sei se existe idade para que nós possamos aprender nesta formidável escola do mundo em que vivemos. Uma grande poetiza já dizia que todos nós estamos matriculados na escola da vida. Desde que nascemos. Nesta escola o mestre é o tempo. A cada dia vamos aprendendo. Não importa a idade, pois o aprendizado não para. Dia e noite. É bom aprender com o silêncio, com os falantes, com os intolerantes e os gentís. Eu posso dizer que sou grato a todos pelo que aprendi e ainda aprendo. Não levo em consideração se são rudes, se são estranhos. A eles sou eternamente grato. De vez em penso nas palavras de Baden Powell quando disse que é uma pena que um homem tenha que viver sessenta anos para adquirir alguma experiência de vida e a leve para o túmulo, cabendo aos que o seguem começar tudo de novo, cometendo os mesmos erros e enfrentando os mesmos problemas.

                     Leonardo da Vinci comentou que a experiência é uma escola onde são caras as lições, mas em nenhuma outra os tolos podem aprender. Aprender é a única coisa de que a mente nunca se cansa, nunca tem medo e nunca se arrepende. São duas coisas distintas – O saber dado pelos mestres nas escolas e a vida como ela é, sendo olhada, guardada em nossa mente e nos fazendo crescer no dia a dia. Outro pensador comentou que, no dia em que guiarmos nossas ações, juízos, estudos e decisões por valores que visam ao sublime em vez da mesquinhez, quando agirmos inspirados mais nos critérios de justiça, da generosidade, da prudência, da temperança do que do interesse do egoísmo, no dia em que agirmos meditando sempre na beleza da doçura, na importância da humildade, no valor da coragem e no lugar da compaixão, nesse dia nosso planeta atingirá aquele estágio supremo que toda evolução técnica teve por meta.

                O escotismo nos deu escolhas. Não importa se entramos nele como jovens ou adultos. Ele o escotismo nos dá escolhas simples, honestas baseadas em uma lei e uma promessa. Aprendemos tanto a cada dia, a cada hora, a cada minuto. Aos poucos vamos fazendo um arquivo em nossa memória impossível de descrever ou escrever. É este arquivo é quem nos ensina como compreender, ser calmo, ponderado, e assim aceitarmos mais alegremente a vida como ela é, sem reclamar e aceitando o que nos foi dado como meta. Fico pensando que muitos jovens ou mesmos outros que ainda não estiveram em todas as salas da escola da vida não querem ainda escolher com aqueles que já passaram por todas elas, carregam experiência e não se perdem no caminho desta escola. Eles os jovens se sentem seguros, Andam com firmeza e acreditam que o que fazem é o certo. Mas isto não é bom? Lá bem distante um dia eles verão que o caminho poderia ter sido outro. Mas e o livre arbítrio?

                Ainda bem que tive a alegria de participar ativamente deste movimento que só me deu alegrias. Os percalços que encontrei foram também aprendizado. Hoje não fico preocupado em não poder estar na ativa e junto ao lado dos jovens. A Escola da Vida e Deus me deram o que preciso para continuar a jornada. Mente clara, pensante, ativa procurando nos seus recônditos uma maneira de ajudar e colaborar. Sim aprendi muito e nunca esqueço as belas palavras de Baden Powell. Ele nos mostrou o valor da natureza em nosso crescimento. Dizia ele que quando um filhote de lobo ouve as palavras “estudo da natureza”, seu primeiro pensamento é sobre coleções da escola de folha secas, mas estudo da natureza real significa muito mais do que isso, o que significa saber sobre tudo o que não é feito pelo homem, mas criado por Deus.  È ela a natureza uma das grandes matérias da Escola da Vida.

                 Todo homem toda a mulher passa pela escola da vida. Eles são os que sustentam a nação e o mundo com o que aprenderam. São livros não escritos, são matérias do dia a dia. São as alegrias, as dificuldades, os sacrifícios que nos dão a certeza de um dia receber o diploma tão esperado. Mas este diploma é apenas uma etapa. A Escola da Vida não para. Há muito que aprender. Ela nos dá a única riqueza que vamos levar conosco na viagem que um dia iremos realizar. E a cada estação, a cada apito do trem descendo ou subindo iremos encontrar mais e mais escolas. São milhares. Nunca irão parar. Seria bom que todos trocassem ideias como os que passaram por esta escola antes da maturidade. Mas acredito que tem de ser assim. E como dizia Saramago, mesmo que a rota da minha vida me conduza a uma estrela, nem por isso fui dispensado de percorrer os caminhos do mundo!

O homem que é cego para as belezas da Natureza perdeu metade do prazer da vida!

Lord Baden Powell.

domingo, 23 de novembro de 2014

Estamos caminhando rumo ao sucesso?


Crônicas de um Velho escoteiro.
Estamos caminhando rumo ao sucesso?

            Deveria me manter na minha sina de Velho chato e antigo Escoteiro tradicionalista. Deveria ficar na minha, quieto, sem ficar sempre dizendo a mesma coisa. Sempre digo a mim mesmo que não ia mais comentar a postura de um uniforme, farda, traje ou como agora dizem se chamara vestimenta. É chover no molhado. Sei que muitos amigos aqui não irão gostar, mas olhe, não escrevo para reprimir e nem criticar ninguém. Não faz parte de minha índole Escoteira magoar alguém. Mas caramba, agora pela manhã sentado na minha cadeira na varanda de meu lar resolvo ler um pouco de Baden-Powell. Putz! Dou de cara com o que um dia escreveu sobre a farda Escoteira (farda, uniforme, traje e vestimenta tudo é a mesma coisa): A farda escoteira, pela sua uniformidade, constitui agora num laço de fraternidade entre os rapazes do mundo inteiro. O uso correto do uniforme e a elegância na aparência de cada Escoteiro, individualmente, torna-o um motivo de crédito para o nosso Movimento. Mostra que está orgulhoso de si mesmo e da sua tropa. Pôr outro lado um escoteiro desleixado, mal vestido, pode causar aos olhos do público, uma péssima impressão sobre todo o movimento. Mostrem-me um desses tipos e lhes afianço que provarei que ele é um daqueles que não conseguiu pegar o verdadeiro Espírito Escoteiro e não se orgulha de ser membro da nossa Grande “Fraternidade”. 

             Errado ele? Cada um deve pensar como quiser, mas acreditem depois do advento da vestimenta fico pensando se estamos realmente fazendo boa apresentação à comunidade, se estamos garbosos e bem apresentados, se estamos elegantes e se nossa apresentação irá fazer com que a sociedade irá nos dar mais créditos que antes. Fico perplexo com o que vejo. Primeiro a escolha pessoal é grande. Dizem ser mais de quinze tipos. Concordo que a cor é uma só, mas vejo em tropas e em grupos muitos vestidos diferentes um do outro. Alguns de calça comprida outros com a curta, alguns de meias brancas, azuis pretas ou outras cores. Camisa solta ou presa dentro da calça, manga comprida ou curta. E os bonés e outras coberturas? Vê-se no mesmo grupo vários tipos e cores. E os calçados? Prefiro não continuar. Dizem-me que o POR define. Será que todos estão ao par? Não sei. Só sei que de vez em quando vejo fotos de cursantes e os dirigentes se portam do mesmo jeito.

                Sempre digo que somos o exemplo. Se eu coloco um lenço preso nas pontas meus jovens farão o mesmo. (inventaram isto e todos copiaram) Se eu estou de camisa solta eles irão copiar, Se eu escolho uma cobertura que gosto porque eles não irão fazer o mesmo? Quando menino ninguém vestia o uniforme antes da promessa. Recebíamos uma aula do Monitor como se manter bem uniformizado e se orgulhar do que vestimos. Vi diversas vezes o Chefe chamando o Escoteiro ou o lobinho em particular para dar a ele conhecimentos sadios e como ele devia se portar e orgulhar do seu uniforme. Pode ser que isto é uma tradição que não cabe mais hoje em dia. A liberdade agora faz parte de muitos adultos e jovens que acreditam poder escolher o que quer e o que vestir. Até admito a mudança mesmo sendo contra a maneira como foi imposta, mas não posso admitir esta parafernália de escolhas que ao meu modo de ver não vai trazer benefícios aos olhos do publico que ainda não se enquadraram com as escolhas que a Direção Nacional nos impôs. Muitos ainda acreditam que colocando o lenço exaltam o escotismo. Não importa se o lenço está sendo usado em roupa civil. O Velho Escoteiro não aceita isto de modo algum.

                 Levamos anos para demonstrar um escotismo autêntico, um escotismo respeitado, um escotismo que sempre foi motivo de orgulho para nossas famílias e para os que nos conheciam. Tivemos homens célebres orgulhosos do nosso movimento. A liberdade hoje desta uniformização não acredito se vai trazer benefícios. Mostrem-me alguma organização, associação ou mesmo nos meios escolares, sem mesmo citar nossas organizações militares onde alguns deles tiveram a liberdade de escolher seus uniformes ou a vestimenta como a querem chamar. Se no POR tudo está definido procurem os dirigentes olhar melhor o que se passa nas associações Escoteiras. O que está acontecendo é culpa única e exclusiva dos dirigentes que criaram tudo isto. Não esqueçam também que os formadores em cursos aplicados tem responsabilidade no exemplo pessoal. Um formador deve ser o primeiro a dar o exemplo e exigir de todos durante a realização do curso.


                   Ah! BP! Olhar você dando exemplo pessoal, faz-me lembrar dos meus tempos de orgulho quando vestia meu uniforme. Recordar que com o caqui e minhas calças curtas cumprimentei amigos, familiares, vizinhos, grandes dirigentes empresariais, homens de toda a gama politica existente, autoridades eclesiásticas, governadores e até um Presidente da republica. Lembrar que em locais remotos tínhamos orgulho de estar bem uniformizados e ser bem recebidos vendo todos dizendo? Olhem! Os Escoteiros estão chegando. Finalmente não posso dizer se é diferente de hoje. Os lideres Escoteiros do passado tinham orgulho do seu uniforme. Faziam questão de se apresentar garbosamente. E os jovens? Tira-se o chapéu para eles com seus sorrisos maravilhosos, com suas patrulhas bem postadas, esperando que o Chefe os visse e dissesse: Parabéns patrulhas! Estou orgulhoso de vocês. A disciplina tinha outro significado. Ninguém criava ou usava o que não era permitido. Ainda bem que era só um e depois com o traje outro. Agora? Mais de quinze! Durma-se com um barulho destes. Um celebre filósofo dizia e eu não tiro uma vírgula: - Dar o exemplo não é a melhor maneira de influenciar os outros. – É a única!     

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

O Selvagem das Terras Altas. A história do Cacique Capotira. O Selvagem da Cabeça Branca.


Evitar o perigo não é, a longo prazo, tão seguro quanto expor-se ao perigo. A vida é uma aventura ousada ou, então, não é nada.

O Selvagem das Terras Altas.
A história do Cacique Capotira. O Selvagem da Cabeça Branca.

                Se havia algum que me deixava deprimido era não poder fazer alguma atividade que por um motivo ou outro pensei em fazer. Nunca em minha vida tive medo de enfrentar a estrada, as matas, campinas, os rios estreitos e largos, as cachoeiras, as corredeiras infernais e até as mais altas montanhas. Deliciava-me quando conseguia conquistar cumes imensos, atravessar rios caudalosos seja de que maneira for descendo corredeiras ou mesmo encontrar com o imponderável pela frente era motivo de orgulho. Não sei quantas vezes passei por isto. Medo? Um pouco. Muitas vezes “molhei as calças” e não me envergonho de dizer. O que me deixava agora chateado era não encontrar alguém da Patrulha para ir comigo. Estava enfezado. Israel disse que não podia – Bitelô, como vou ficar vinte dias fora? – Tãozinho então – Nem posso pensar nisto Bitelô, meu pai não vai deixar nunca. E assim um por um não encontrei ninguém que topasse enfrentar um desafio novo.

               Tudo começou quando fui cortar o cabelo na Barbearia do seu Praxedes. Era o barbeiro do meu pai há muitos anos. Eu cortava cabelo com ele desde os cinco. Ele sempre soube o que fazer e como era o corte. Estava lá entretido quando entrou um sujeito com um bigode que nunca tinha visto um igual. Enorme. Diria que os lados quase alcançavam ao queixo. Passou um tempo e ele começou a conversar com o seu Praxedes e conversa vai conversa vem disse que morava na Morada do Morto Vivo. Nunca ouvi falar. Seu Praxedes balançou a cabeça. Contou então a história mais incrível que tinha ouvido. Disse que bem longe de sua casa, bem ao norte subindo o Rio Turvo, quem sabe duas semanas a pé, existia uma serra alta, toda tomada por uma imensa floresta. Ninguém ainda tinha entrado nela. Era completamente desconhecida. Um dia um homem todo marcado e sangrando como se tivesse sido esfolado vivo chegou a sua porta pedindo ajuda e socorro. Trataram dele dentro do que conheciam e no quinto dia ele partiu. Quando ia virando a curva da Trilha da Goiabeira gritou – Nunca tentei entrar na Floresta do Diabo! Lá ainda mora o Selvagem da Cabeça Branca. Ele não conversa com ninguém. Ele esfola e mata. E sumiu junto as plantação de figo que tínhamos acabado de plantar.

              Depois não falou mais. Cortou o cabelo aparou o bigode e quando ia saindo o segurei pelo braço. Ele me olhou e vi nos seus olhos faiscarem. Conhecia este tipo de valentia de outras eras quando das minhas brigas eternas e quase desisti de perguntar. – Moço, como faço para chegar na Floresta do Diabo? Ele riu. Pegue o trem. Desça em Baixo Guandu. Suba o Rio Turvo por oitenta quilômetros. Quando avistar uma garganta entre duas montanhas, vá por baixo mais dez quilômetros. Quando ela terminar irá ver uma imensa floresta subindo aos céus e densa por causa do nevoeiro. É lá. Mas menino, nunca vá lá. O Selvagem da Cabeça Branca dizem nunca deixou ninguém vivo e os que conseguiram fugir ficaram com sequelas no corpo morrendo em poucos meses. Virou-me as costas e sumiu na Rua do Sumidouro e nunca mais o vi. À noite minha patrulha tinha marcado uma reunião na sede. Pretendíamos acampar nas férias de julho e poderíamos escolher um bom local e quem sabe fazer as grandes pioneirias que sempre planejamos e não fizemos. Poderíamos ficar oito dias acampados.
  
               Enquanto todos discutiam lembrei da conversa do Homem do Bigode Rastapé que me contou a história fantástica. Contei para a Patrulha. Riram e não deram atenção. Tentei de todo modo motivar a irmos lá. Foi Israel que colocou a questão crucial – Olhe Bitelô, Oitenta quilômetros rio acima, depois mais vinte. Você sabe. Sem trilhas, matas dos dois lados e com corredeiras tem de ser a pé. Pelos meus cálculos não conseguiremos andar mais que vinte quilômetros por dia, e olhe lá. Só aí seriam cinco dias para ir e mais cinco para voltar. Nem sabemos o que vamos encontrar. Claro que na volta uma jangada pode nos trazer mais rápido, mas e então? Subir uma montanha que ninguém nunca subiu? E se for verdade esta historia do tal Selvagem esfolador? Não somos heróis. Nem sabemos o que vamos encontrar.

               Tentei de todo modo motivar a turma. Não estava conseguindo convencer aqueles seniores destemidos. Deram todo tipo de desculpa. Parece que não era a minha Patrulha que não recusava nenhum desafio. Voltei para casa frustrado. No dia seguinte Pedrinho me procurou em casa cedo ainda – Olhe Bitelô, não dormi a noite. Só pensando nesta história do esfolador. Encontrei com o Israel e ele me disse a mesma coisa. Acho que devemos nos reunir hoje na sede e conversar de novo sobre isto. Dito e feito. A Patrulha conversou por horas. No final tudo planejado. Achávamos que quinze dias seriam suficientes. Os seis valentes seniores da patrulha Cascavel iriam entrar em ação novamente. Que nos esperasse a Floresta do Diabo. E que se danasse o Selvagem da Cabeça Branca. Ele ia conhecer uma turma da pesada! A aventura ia começar e que aventura foi meu Deus!

                Seu Josué era o Chefe da Estação da Estrada de ferro. Já nos conhecia. Aproximou-se e perguntou – Para onde vão desta vez? Até Baixo Guandu Seu Josué. E de lá? - Bem vamos tentar chegar até a Floresta do Diabo. Isto é vamos subir o Rio Turvo. – O rio eu conheço, mas esta floresta não. Cuidado com o Rio. Quando menos se espera ele sobe até dois ou três metros do seu nível.  Gente boa seu Josué. O trem parou na plataforma. Subimos na Segunda Classe e logo ele partiu. Seriam por volta de três horas de viagem. Se tudo corresse bem chegaríamos em Baixo Guandu lá pela uma da tarde. Foram preparativos imensos. Nossa ração que estávamos acostumados era de no máximo dez dias. Ração para quinze ou vinte não sei não. Mas achamos que encontraríamos pelo caminho muita verdura, peixes e quem sabe algum animal ou ave para matar a fome e economizar nosso farnel.

                   Éramos seis. Eu, Romildo, Fumanchú, Taozinho, Israel e Pedrinho. A Patrulha estava completa. Todos foram segunda e Primeira Classe quando escoteiros e agora muitos portavam a eficiência II. Não havia pata tenras. Passamos juntos por poucas e boas. Na viagem o espírito era nota dez. Cantamos, contamos “causos”, até umas piadinhas que não podiam ser contadas para os lobinhos. Meio dia e meio avistamos Baixo Guandu. Uma cidade de mais ou menos quinze mil almas naquela época. Hoje não sei. Antes de o trem entrar na estação avistamos o pontilhão do Rio Turvo. Descemos e como sempre atraiamos atenção. Não dava tempo para conversar. Partimos. Um trecho de estrada estadual e logo uma carroçável margeava o rio. Sabíamos que ela iria desaparecer em breve. Dito e feito. Uma mata rala, e logo uma mata fechada. Que dificuldade para dar cada passo. O rio naquele trecho era manso. A tarde veio chegando. Precisávamos de um lugar para arranchar. Sabíamos que não podíamos ficar próximo à margem. Pelos menos uns trezentos metros. As muriçocas nos comeriam vivos. Experiência de outras épocas.

                   A primeira noite foi calma e assim a segunda. Mas cada dia mais difícil ficava a caminhada. Na tarde do terceiro dia avistamos uma cachoeira enorme. Época da piracema. Um espetáculo a parte. Quem já viu sabe como é. Lindo! A luta dos peixes para subir rio acima é algum de espetacular. Escolhemos um belo piau de dois quilos e o Fumanchú nos fez uma gostoso assado de peixe na brasa. No dia seguinte demoramos mais de três horas para escalar a cachoeira. Não foi fácil. No quinto dia achávamos que estávamos atravessando o inferno. Que dificuldade meu Deus! Cada metro mais e mais um emaranhado da floresta. Naquele dia acho que não andamos cinco quilômetros. Se continuasse assim não chegaríamos a tal Garganta. No sexto dia a mata ficou rarefeita. Tiramos o atraso. Na manhã do sétimo dia avistamos a Garganta. Fácil de percorrer. Um gostoso riacho pedregoso e raso com águas límpidas. Na tarde daquele dia avistamos a famosa Floresta do Diabo. Imponente. Grandiosa. Misteriosa. Uma nevoa encobria o seu topo. Resolvemos dormir e prosseguir no outro dia.

                Levantamos cedo. Graças a Deus que durante os sete dias não choveu. Não foi preciso usar as lonas. Dormimos sob as estrelas. Pela manhã após um cafezinho partimos. Não havia como escolher uma local para a subida. Por toda parte arvores gigantescas e vegetação encobrindo tudo. Fomos em frente. Fumanchú nos disse que nossa ração daria para mais quatro dias. Se pudéssemos encontrar alguma caça ou pescar seria bom. Pescar ali não dava. A subida ficou íngreme. Três passos a frente um atrás. Quem sabe encontraríamos algumas frutas silvestres pensava enquanto andávamos. A mata fechada. Muito fechada. Começou a escurecer. Abrimos uma pequena clareira e dormimos, não antes de uma gostosa sopa de batata. Um bule de café nas brasas umas batatas doce e a noite chegou firme. Pegávamos no sono com facilidade.

               Acordei com o dia raiando. Vi o Romildo e o Fumanchú de pé, sem se mexer e olhando firme para frente. Tremi na base. Um índio enorme. Olhe mais de dois metros. Grande e sem ser gordo era descomunal. Cabeleira longa e totalmente branca. Sem barba. Olhos negros fitando-nos. Não disse nada. E agora, seria o tal Selvagem da Cabeça Branca? Vai nos esfolar e matar? Israel e Tãozinho se levantaram. Pedrinho sentou e se assustou. Era o menor de todos. Todos se aproximaram e ficamos juntos. Romildo o Monitor pegou seu bastão. Arma? Que nada, era leve e nem como porrete quebraria o galho. Calças começaram a ficar molhadas. Ele fez um sinal como dissesse – Venham comigo. Fazer o que? Juntamos nossas tralhas e fomos com ele.

                  Gente, o caminho era uma surpresa. Ele nos levou por uma encosta, onde uma trilha mínima e tendo como esteio um cipó enorme, atravessamos. Do outro lado uma pequena ponte pênsil que ele puxou não sei de onde, passamos e chegamos próximo a um platô, enorme. Avistamos algumas Ocas e uns vinte índios nos cercaram. A maioria mulheres e crianças. Ninguém falava nada, ninguém sorria. O tal da cabeça branca nos mandou entrar em uma oca. Enorme. Grande mesmo. Cabia lá toda a tribo isto é pensei que poderia ser uma. Um pequeno fogo no meio e que cheiro ruim. Ruim mesmo. De que seria? Romildo disse que mataram um porco do mato e ele estava em um canto da oca. Só podia ser ele. O tal da Cabeça Branca nos mandou sentar. Todos sentaram. Ele humildemente, o que estranhei começou a falar:

                 - Eu e os demais da tribo estamos pensando o que fazer com vocês. Não gostamos de estranhos. Eles nos fazem mal. Todos que aqui vem nós o matamos ou esfolamos. Um aviso para ninguém vir. Há muitas e muitas luas seus irmãos brancos mataram quase todos da minha tribo. Morávamos próximo a Aimorés, quase junto a Lagoa da Traíra. Éramos de paz. A sua FUNAI nos deu terras e fazendeiros nos tomaram. Uma noite entraram em nossa aldeia. Mataram quase todos. Eu, filho do cacique Lobo Branco, Pontiac filho do bravo Amanaki, Iraci minha namorada na tribo e filha de Caíare estávamos caçando. Quando chegamos vimos todos mortos e os brancos saqueando tudo. Nos escondemos. Levaram os corpos e os enterraram na entrada da Aldeia, mais de cinco quilômetros onde morávamos. Choramos muito. Mais cinco crianças correram até nós. Estavam vivos. Eu tinha dezesseis anos e era o mais velho. Resolvemos fugir.

                - Descobrimos esta floresta depois de dias de viagem pelo Rio Turvo. Achamos que quase ninguém viria aqui. Na Garganta Cajuru montamos um ponto para observar todos que se aproximam. Voces passaram por ela. Vimos todos os seus passos. São meninos como eu era. Sei que vieram por aventura. Eu também fui assim. Hoje somos menos de trinta. Iraci me deu oito filhos. Paramos. Não podemos crescer mais. Um livro sagrado foi escrito. Todos sabem o que diz lá. Aqui temos muita água e fizemos uma represa para criarmos peixes. Temos uma horta com muitas verduras. Conseguimos mudas de cana, de mandioca e de abóbora. É nosso sustento. Não queremos riquezas e aqui sabemos do ouro tão ambicionados por voces. Amanhã vamos decidir seus destinos. Ficarão na Oca de Pontiac. Não saiam de lá.

                 Saiu e fomos levado por Pontiac até sua morada. Custamos para dormir. Pela manhã eu já estava de pé quando uma indiazinha de uns doze anos entrou e disse que o Cacique Capotira (o tal da cabeça branca) nos chamava. Em uma roda de índios nos entregou nossas mochilas e algumas frutas. Disse que podíamos ir embora. Não pediu para ficarmos calados só disse que se contássemos a história da tribo e onde estávamos ele sabia que não iam durar muito. Deu a cada um uma pepita de ouro. – Façam o que quiserem. Pegamos nossas mochilas e partimos com ele a frente. Levou-nos até a Garganta Cajuru. Mostrou-nos muitas piteiras secas. Disse que com oito poderíamos descer o rio facilmente. Quando a corredeira aumentar saiam da água. A cachoeira esta próxima. Partimos.

                  Para dizer a verdade eu chorei. Gostei demais da tribo. Apesar de pouco tempo ficamos orgulhosos em conhecer todos. Cinco dias depois chegamos em Baixo Guandu. Eu, Romildo, Fumanchú, Taozinho, Israel e Pedrinho fizemos um juramento de não contar para ninguém. Foi uma das nossas maiores aventuras. Sempre quando acampávamos a noite em fogo de conselho ou em uma simples conversa ao pé do fogo, rememorávamos com saudades daquela aventura que ficou gravada em nossa mente para sempre. Os anos passaram e eu passei com eles. Há vinte anos atrás encontrei com Romildo. Sei que já foi para o grande acampamento. Disse-me que um dia soube pelos jornais a história da tribo dos Cabeças Brancas. O governo deu a eles as terras e nunca mais foram importunados por brancos.

                   Acampamentos, excursões, grandes aventuras. Elas ficam gravadas para sempre em nossa mente. Assim são os escoteiros. Não sabem se esconder em sede. Partem em buscas de suas aventuras. Seja ela simples, seja ela com grande perigo. Não importa. Eles sabem até podem ir. Saudades de Capotira, de Pontiac, de Iraci e daqueles amigos sinceros que fizemos. Espero que até hoje estejam felizes, pois lá em sua tribo sentiam-se libertos, e só o sol e a lua sabiam como a felicidade fazia parte de todos aqueles Cabeças Brancas. Quem sejam muito felizes. E as pepitas de ouro? Risos. Com ela papai terminou nossa casinha na Pastoril!

O amor vive de repetição. Cada um de nós tem, na existência, no mínimo uma grande aventura. O segredo da vida é reeditar essa aventura sempre que seja possível.



segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Acampar é viver com a natureza.


Conversa ao pé do fogo.
Acampar é viver com a natureza.

                        Se você é Escoteiro já deve ter acampado. Isto mesmo e eu sei que foram muitas vezes. Já escrevi aqui a diferença de Camping com Acampamentos Escoteiros. Eu já fiz camping por boa parte deste Brasil. É divertido. Temos conforto, uma barraca que dá para ficar em pé, levamos rádio, TV, o fogareiro a gás tem duas ou três bocas, as mesinhas são fáceis de armar, os bancos ou cadeiras de praias estão ali para nosso deleite. Enfim, um conforto enorme e sem esquecer que temos luz elétrica e próximo chuveiros quentes. Uma delicia. E em um Trailer? Impossível imaginar a “gostosura”. Bom demais. Tive um Diamante e me esbaldava com ele. Que conforto meu Deus! Mas isto não é escotismo. Nunca foi. Vejo fotos de barracas inteligentes, suspensas, algumas em árvores como se fosse à casa do Tarzan. A turma se delicia com estas fotos e com estes confortos. Mas pergunto novamente isto é acampamento? Isto é escotismo?

               Claro que não. Eu lembro quase tudo dos meus acampamentos Escoteiros, mas pouco me lembro dos meus campings e do meu trailer. Não desmereço os primeiros acampamentos, as barracas novas, cheirando a pano de loja. Isto é norma para pata tenras. Mas se sua turma já é escolada, ela acampa com ou sem barraca e que venha a chuva! Quer saber? Nunca usei um Sleeping ou saco de dormir. Nunca usei um colchonete. Mas sei que hoje os tempos são outros e a meninada precisa primeiro aprender a ser um bom mateiro. Por isto vá cortando de acampamento em acampamento. Quando eles souberem fazer um abrigo e tiver somente uma lona em cima o caminho começa a dar frutos.

              Um Chefe outro dia comentou que ele já dispensa os veículos dos pais ou ônibus fretado, e aprenderam a usar as pernas como transporte. Carregam tudo que precisam na mochila, pegam ônibus, trens e vão aonde muitos nem sequer imaginaram. Mas isto eu sei é para uma tropa mateira. E olhe ele disse que mora em cidade grande. Estupendo! Um artigo meu fazendo gosação comentou sobre o que ensinou um Chefe Escoteiro sobre o material a levar para o campo. Incrível eu pensei. Isto é material para os escoteirinhos pata-tenras, onde a Mamãe a vovó e a titia ficam ali insistindo com ele para levar. Coitado. Vai aprender a carregar peso sem a necessidade e pobre das suas costas. E quando ele entrar em um ônibus? Bate aqui, bate ali e todo mundo olhando para ele espantado ou resmungando. No caminho ele fica para trás. Um bom Chefe divide com os demais a tralha dele com os outros, eu não, eu deixo ele se matar para aprender. Não é fazendo que se aprenda?

                Lá no acampamento é uma beleza. Os bons chefes vão lá ajudar a escoteirada a armar a tenda, a preparar um fogo, a fazer a cozinhar e etc. e tal. Eu não. O que eles foram fazer ali? Um jogo de olhar o Chefe? Eles que se virem. Afinal para que serviu o acampamento de monitores, o acampamento experimental de um fim de semana? Não ajudo mesmo. Que fiquem com fome que durmam no relento. Quando a fome apertar eles farão o fogo, quando o fogo estiver pronto eles aprendem a cozinhar. Se botarem açúcar no arroz paciência. Que comam arroz doce. Se o bife torrou danou-se, mas que mordam o queimado. Se for para pegar na mão do Escoteiro não conte comigo. Olhe que já acampei com tropas e tropas neste mundão de Deus. Quantos mateiros Escoteiros e escoteiras eu vi crescer? Centenas. Gente boa, gente que aprendeu a fazer fazendo e que quando adulto saberão se virar e ter iniciativa. Isto sem a mamãe e o chefinho Professor.

                Quantas vezes dormimos ao relento? Quantas chuvas enfrentamos? Quantos dias frios tiramos de letra com um bom Fogo Espelho? Conheci meninos Escoteiros que uma parada de uma hora em uma jornada era suficiente para uma fazer uma sopa e prosseguir. Turma da pesada! E quantas vezes dormimos sobre pedras, nas subidas das montanhas, molhados com a chuva e nos viramos com uma árvore copada? Pergunte aos que fizeram isto e verão um brilho em seus olhos, uma lembrança gostosa, um sabor diferente no aprender para a vida. Sei que hoje os pais não são como antigamente, mas se fosse eu diria: - Senhor, o escotismo vai ser assim. Se quiser que seu filho seja um homem no sentido da palavra ele vai aprender a fazer fazendo. Se o senhor acha que não dá, melhor que ele não fique conosco! Deixa o jovem chorar e reclamar com o pai. Ou ele o deixa ir conosco e aprender ou então que o leve para casa.

                 Acampar à Escoteira! Bom demais. Sozinho, enfrentando tudo. Medo? Putz! De que por acaso? Fantasmas? Eu dou risadas. Curei meu medo nos acampamentos onde uma árvore á noite era cópia do demônio. Onde uma casa de cupim nos montes nos fazia tremer nas madrugadas. Cobras? Escorpiões? Animais selvagens? Não sei se isto existe mais. Dormi amarrado por horas em um pé de pequi olhando para baixo e vendo uma jaguatirica deitada me esperando. Hoje isto não mais existe, mas ainda dá para fazer atividades aventureiras. Ora se dá. Agora se você é daqueles que levam pais para ajudar na cozinha, se você é daqueles que montam barracas e pioneirias explicando como se faz com a escoteirada em volta, paciência. Você não é o tipo de Chefe que acredito. Muito mais se é você quem estica a corda que é o primeiro a fazer o comando Crown e a escoteirada olhando, que adora fazer um caminho de barro e deixar que eles se lambuzem para uma boa foto, vá lá. Faça assim. Não é o que faria.

                    Muitas vezes não culpo você por isto. Você não teve a felicidade de acampar como os Escoteiros acampam. Hoje você tenta ao seu modo, pois aprendeu assim. Os cursos não lhe deram um começo de pista. Mas quer saber? Errar é humano e persistir no erro é uma tremenda burrice. Saia da sua rotina de sempre se quer fazer bons escoteiros. Acampe, vá onde ninguém foi com eles, mas deixe que eles tomem a frente. Você não é o Borba Gato, um Raposo Tavares ou um Fernão Dias Paes. Se divirta com o que eles fazem. Sinta-se realizado em estar ali ajudando de longe e claro você sabe disto. Eles precisam de você, mas não como o papai e a mamãe, mas como um herói que eles querem ser. Lembre-se não seja enganado como o foi Fernão Dias Paes que sempre acreditou ter encontrado esmeraldas, mas nunca ficou sabendo da riqueza que encontrou. As famosas turmalinas de Minas Gerais.


                   Barracas suspensas com um simples toque? Luz elétrica no campo? Enormes sacos de dormir acolchoados esticados nas barracas? Unguento para mosquitos? Bah! Não é o escotismo que penso. Faça acampamento meu amigo, acampamento de Gilwell como deve ser e não Camping. E por favor, não me convide para isto, mesmo Velho Escoteiro como sou ainda acho que dormirei bem em um galho de arvore sem necessidade da Jaguatirica a me olhar. Ufa! Acho que foi isto que me fez Escoteiro até hoje!