Crônicas
de um Chefe Escoteiro.
O
profissional Escoteiro.
Sabe "Velho",
ontem sem querer participei da reunião da diretoria do grupo Escoteiro, e eles
discutiram sobre a diferença de um Escoteiro profissional e a de um
profissional escoteiro. Alguém deu a ideia de quem sabe o grupo ter um. Já
falamos muito sobre isto e para dizer a verdade eu mesmo fiquei em dúvida.
Nunca vi em nenhum grupo um profissional assim. Já vi pessoas que trabalham na
sede Escoteira. Mas sempre como administrativos. Você tem conhecimento sobre
isto? – O "Velho" balançou a cabeça concordando. Escutou os acordes
finais de Zamfir, me olhou com aqueles olhos azuis e os cabelos brancos caindo
sobre a testa e ficou a pensar.
- Para lhe ser sincero, falou o "Velho", acredito que nosso
movimento poderia ter dado um salto bem maior em quantidade e qualidade se
tivéssemos nos preocupado mais com os profissionais escoteiros. Veja bem,
entendo como profissional Escoteiro alguém com uma função específica em um
órgão Escoteiro, para desenvolver programas de expansão, proselitismo, arrecadação
de fundos, e ser um contato entre os grupos escoteiros entre si, seja distrito,
região, direção nacional ou mesmo um Grupo Escoteiro. Estou, a saber, que há
poucos meses nosso órgão máximo contratou um profissional. Ótimo. Quanto tempo
ficaram sem ele. Nunca é tarde para começar.
Veja bem, estamos falando de um profissional Escoteiro e não um
Escoteiro profissional. Acredito que este último está fora de cogitação por
enquanto. Ele existe na Boy Scout dos Estados Unidos. Trata-se de um técnico Escoteiro
e trabalha como profissional conforme é solicitado nos estados e em grupos.
Chega a ponto de alguém contratá-lo para organizar uma tropa, fazer um
acampamento, preparar chefes escoteiros, substituir chefes em férias ou viagem
enfim múltiplas funções. Aqui acredito que eles irão demorar em existir. Agora
bem diferente do Profissional Escoteiro. Sua função é outra. Para isto deve ser
bem treinado, pois irá lidar na comunidade em busca de apoio financeiro e apoio
logístico.
Eles também são muito úteis com bons programa de expansão do escotismo. Isto
falta para que nosso escotismo dê um grande salto, principalmente por
reconhecimento das autoridades municipais, estaduais e federais. Impossível
para amadores executarem esta tarefa. Vou lhe contar uma história que aconteceu
comigo a muitos e muitos anos atrás. Recebemos a visita de um antigo
profissional já conhecido do CIE (Conselho Interamericano de Escotismo) hoje
mais conhecido como Oficina Scout Interamericana. Não sei se realmente se chama
assim, mas isto não importa. Não me lembro agora do nome do profissional que
nos visitou. Eu já o conhecia de outras visitas com outras finalidades. Uma
pessoa muito simpática e quando vinha ao Brasil parecia pisar em ovos. Mais
tarde explico por que.
Seus lideres conseguiram em
vários países através de uma grande campanha financeira e até com boa ajuda da
BSA, uma quantia razoável para a expansão do escotismo na América do sul. Foi
feito um plano que chamaram de Projeto 2.000. Um plano simples, mas eficaz. Deu
certo em vários países menos aqui no Brasil. Vamos a ele – Contrata-se um
Profissional Escoteiro que em principio deve conhecer bem o escotismo, paga-se
um bom salário (acho que hoje seria por volta de dois mil e quinhentos dólares)
No contrato ele receberia integral no primeiro ano, setenta por cento no
segundo e no terceiro só trinta por cento. Após o quarto ano a verba seria
suspensa. Ele continuaria como profissional, mas teria que fazer seu próprio
salário.
Enfim, O projeto consistia em escolher
uma área, que seria denominado distrito e o profissional iria allí desenvolver
o escotismo com objetivo de em menos de três anos ter dois mil escoteiros.
Nota-se que a área não poderia ter nenhum grupo. O próprio Profissional do CIE
iria treinar os profissionais escolhidos no Brasil, pois o projeto iria
abranger mais de oito estados brasileiros. Ele o profissional iria aprender
como manter contatos e se relacionar com fábricas, igrejas, comércios, empresas
diversas, enfim a seara para desenvolver o escotismo na área. Ele seria
responsável para arrumar sedes, chefes, diretorias e principalmente os meios
necessários para prover todas as necessidades do Grupo Escoteiro no seu início.
Depois a diretoria seria a responsável. Pensava-se que cada grupo Escoteiro
teria por volta de cem membros. Portanto teria de ser organizado mais de 20
grupos. De toda arrecadação que
conseguisse na comunidade, teria uma porcentagem para suprir seu salário, seu
escritório e futuramente auxiliares.
Um grande plano. Foi-nos passado que deu certo em muitos países. Se
desse certo no Brasil teríamos em três anos mais dezesseis mil escoteiros desta
vez em grupos bem organizados e estruturados. Mas o plano não iria parar por
aí. A própria UEB daria prosseguimento em outros estados e a expansão nos demais
estados onde foi implantado. Belo Plano. Belo mas no papel. Aí começaram as
dificuldades. Chefes Escoteiros com ciúmes do profissional. Trabalho
inteiramente diferente, mas os chefes não viam isso. Muitos desempregados ou
mal pagos assistiam com criticas o desenrolar do Projeto. O Distrital da área
achava que o outro profissional era pago e ele não. Muitas vezes dizia que era
preterido pela região me razão do outro. Vários amigos escoteiros sem condições
insistindo para serem escolhidos. Os ciúmes e dúvidas também chegaram à direção
regional. Algumas delas achavam que o profissional do CIE era mais importante e
a palavra final nunca eram deles.
Finalmente soube que dois estados
aceitaram. Em um atingiu-se parcialmente o desejado no outro se extinguiu em
menos de um ano. A índole do Chefe escoteiro em nosso país se firma muito no
servir e muitos não sabem discernir entre o profissional e o Chefe Escoteiro
voluntário. Veja bem, soube que a BSA
(sempre ela, mas é nosso referencial) tem centenas de profissionais Escoteiros
e também muitos Escoteiros Profissionais. São designados para todos os
distritos nos estados e o resultado é surpreendente. Nunca teria os cinco
milhões que hoje possuem de membros se não fossem o trabalho dos profissionais
escoteiros e olhe, estão lutando para em dez anos chegarem aos trinta milhões
de escoteiros! Lá se faz um trabalho sério.
Difícil no Brasil pensar assim. Somos leigos neste assunto. Vou lhe dar
outro exemplo. A muitos e muitos anos atrás um estado no Brasil através do seu
presidente contratou um Profissional Escoteiro com experiência em outros
países. Como o Presidente era pessoa bem relacionada e um profissional
experiente na comunidade e em suas empresas o sucesso não se fez esperar.
Combinou-se com ele (o profissional) uma porcentagem em todas as arrecadações e
se não me engando era coisa de dez por cento. Ele conseguiu tanto dinheiro que
os dez por cento se transformou numa fábula de salário. Daí para os ciúmes,
desavenças (ele passou também a colaborar como técnico em cursos) foi um passo.
Eu mesmo fui visitá-lo uma vez. Recebeu-me muito bem e me ofereceu um uísque
importado. Um absurdo na mente dos voluntários escoteiros. Quando foi eleita
nova diretoria mandaram-no embora. Como dizem por aí, o leite secou. A região
empobreceu.
Na década de sessenta e setenta, um
Profissional da UEB deu grande contribuição para o desenvolvimento Escoteiro no
Brasil. Ficou muitos anos, pois era uma pessoa bem relacionada e amiga. Deu
enorme contribuição para a formação de muitos escotistas em vários estados
brasileiros onde aplicou cursos e palestras diversas. Com exceção do novo
Profissional contratado pela UEB recentemente, há muitos anos não temos ninguém
nesta seara. Claro, as leis trabalhistas no Brasil muitas vezes prejudicam em
muito a contratação de um profissional. Não sei das regiões, mas acredito que
nenhuma possui um profissional Escoteiro como se espera. Nada a comparar com
funcionários executivos dos escritórios locais.
Agora veja bem, já pensou se cada
grupo tivesse um? Não precisava ser um alto executivo. Mas deveria ser alguém
bem treinado para se sair bem em suas funções. Quais? Acho que deveria ter boa
escolaridade e melhor se fosse curso superior. Trabalhar no comercial local da
sua comunidade em busca de sócios, colaboradores e doadores ao Grupo Escoteiro.
Já pensou? Mas quanto ele receberia? Salário seria impossível. Nenhum grupo
teria condições de pagar um profissional assim. Mas e se lhe dessem vinte por
cento de tudo que conseguisse? Será que os grupos topariam? Mesmo? Acredita
nisto? E se amanhã ou depois ele conseguisse arrecadar mais de trezentos mil
por ano? Muito? Menos? E ele ficaria com vinte por cento?
Claro que haveria gritos, sussurros, reclamações, pois dificilmente a
maioria dos escotistas dos grupos escoteiros no Brasil atingem um salário como
o executivo iria receber. E depois até onde ele iria? Conseguido os valores
programados poderia abrir um escritório seu ou ficaria no próprio grupo? E o
Diretor Técnico? Os Presidentes? Passariam a exigir dele como exigem do
voluntário? Ouve uma época que a UEB desenvolveu um Curso de Profissional
Escoteiro. Não conheci o curriculum do curso. Os resultados foram pífios. Não
sei se deram continuidade. Muitos senões, muitos ventos a favor. O
"Velho" parou de falar. Para mim seria um tema que achava deveria ser
obrigatório em todos os órgãos escoteiros. Nunca seriamos nada em termos de
quantidade e qualidade para comparar a tantos outros países sem bons
profissionais escoteiros em número razoável atuando em todo Brasil.
Nenhum plano de expansão teria êxito
sem eles. Não sei o que estão fazendo, quais os planos, objetivos, mas seria
bom que todos pensassem a respeito. Um profissional hoje é um pingo d’água no
oceano. Tomei um café rapidamente e me despedi do "Velho". Um abraço
afetuoso e fraternal. "Velho"! Eu disse, eu voltarei! O
"Velho" riu, mas vi em seus olhos pequena gotas de lagrimas
escondidas. Desci as escadas sem olhar para trás. A lua enorme mostrava toda
sua força provando que Deus existe. Um vento frio e gostoso soprava em uma
brisa leve e intermitente. Um profissional Escoteiro será que eu poderia ser
um? Risos. Acho que não. Os jovens são meus preferidos. Um mês e quinze dias
sem ver o "Velho". Meu coração ia aguentar?
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