Lendas Escoteiras.
A bravura de um herói.
(Esta é uma historia contada aos pedaços da vida de Caio
Vianna Martins. Parte dela é fruto da imaginação do autor. O desastre e outros
detalhes são reais – em 1973 em um acampamento regional Escoteiro em Matozinhos
foi entregue a seu irmão uma medalha de Valor Ouro post mortem a Caio Vianna Martins.
– Eu estava lá!).
Apenas um menino, nada de diferente dos demais. Nasceu em Matozinhos MG
e foi batizado como Caio Vianna Martins. No Grupo Escolar seu professor Senhor
Jamilson contou muitas passagens de sua vida. Ninguém ainda imagina que ali
estava um menino que mostrou ser um herói para toda nação. Dizem que os heróis
não se fazem, já nascem assim. Professor Jamilson nunca observou Caio por este
prisma. Hoje sabendo de seu passado glorioso ele se sente orgulhoso de um dia
ter conhecido Caio Martins. Dizia ele que se lembrava do dia que adentrou na
sala de aula, e pomposamente fazendo uma mesura o chamou de Senhor Professor.
Sabe Moço, dizia o professor. Eu Lecionava na Escola Visconde do Rio das Velhas
e o conheci em 1930. Ele tinha seis anos na época e nem sabia o que eram os
escoteiros. Alguns anos mais tarde seus pais foram para Belo Horizonte e ele se
matriculou na Escola Barão do Rio Branco.
Caio um jovem simples nunca pensou
em ser lenda, herói ou um Escoteiro padrão. Sua vida escoteira teve início em
um sábado quando ele com um amigo foram assistir ao treino de um time futebol e
viu pela primeira vez os escoteiros. Ficou fascinado e não deu sossego ao seu
pai enquanto não o levasse para matricular. Ele
já estava em Belo Horizonte passou por dois colégios até que se transferiu para
o Afonso Arinos onde começou sua vida escoteira. Entregou-se de corpo e alma a
sua nova filosofia. Ele mesmo fez seu bastão, sua mãe o uniforme e numa bela
tarde de maio ele fez sua promessa Escoteira. Sua vida mudou. Tinha verdadeira
adoração pelo seu Chefe Clairmon Orlando Gomes e o Chefe Rubens Amador.
Ele
amava o escotismo e sua mãe e seu pai tinha orgulho dele. Ficou amigo de Gerson
Issa Satuf por quem tinha um carinho todo especial. Na patrulha Lobo era
considerado um sábio pelos seus conhecimentos de história e geografia. Nunca
teve muito contato com a Alcatéia de Lobos e nem sabia que mais tarde ele
Gerson e Hélio Marcus de Oliveira Santos o lobinho fariam uma tríade a ser
lembrada para sempre na memória escoteira. A história de Hélio com seus noves
anos nunca foi contada. Sorria pouco e quase não falava. Era sim um Lobinho
entusiasta sempre o primeiro a chegar e o último a sair. Uma vez em um jogo de
Kim com 24 objetos se lembrou de 22. Uma surpresa para sua Akelá. Foi em um acampamento
em Contagem em um sitio de um amigo do Chefe Francisco Floriano de Paula
(grande mestre Escoteiro e reitor do colégio onde estudava foi um marco no
escotismo mineiro). Caio, Hélio e Gerson se cruzaram muitas vezes. O acampamento marcou a vida de Caio Martins
para sempre. A vida passava muito rápido e logo ficou sabendo da atividade em
São Paulo. Convenceu seus pais a deixa-lo ir afinal era bom estudante e bom
filho.
Caio sem esperar foi eleito monitor de
patrulha. Na época os monitores eram escolhidos olhando mais sua idade e desenvoltura.
Baden-Powell em seu livro Escotismo para Rapazes dizia que os mais velhos são
mais respeitados pelos mais novos. Foi uma festa quando partiram no trem
noturno para São Paulo. Eram seis
lobinhos, doze escoteiros, três pioneiros o Chefe Clairmont e Rubens além de
mais dois membros da Comissão Executiva. Uma delegação de 25 participantes.
Embarcaram na Estação Ferroviária em Belo Horizonte. Foi nela que o primeiro relógio
publico de Belo Horizonte foi instalado. No vagão dos escoteiros era só
cantoria e alegria. O condutor o Velho Gabriel com seus bigodes imensos sorria
com aquela meninada divertida e alegre. Seria uma longa viagem até São Paulo. Vinte
horas num trem sacolejante e fumacento. Naquele vagão onde dormiam os
escoteiros ninguém imaginava o que estava para acontecer. A História do herói
começou a ser escrita.
Ninguém soube explicar porque o Chefe da estação João Aires não parou o
trem de carga que descia a Serra da Mantiqueira. No Noturno todos dormiam
sorrindo em pensar o que fariam ao chegar ao seu destino. Nas páginas do livro
da vida uma nova etapa tinha inicio marcado. Para Mario Montes o maquinista do
cargueiro, mais de vinte anos fazendo o mesmo trajeto nem imaginava o que ia
acontecer. Jonas o Coruja maquinista do Noturno nem percebeu o trem cargueiro
em sentido contrário se aproximando a toda velocidade. Tarde demais! O desastre
era eminente! Os freios rangeram, os apitos soaram, e a batida veio forte.
Estrondos se fizeram ouvir. Vagões foram expulsos da linha e jogados em uma
ribanceira. Duas e cinco da madrugada fatídica. Um engavetamento monstro se
formou. O ano de 1938 entrou para a história. O vagão onde eles estavam saltou
do trilho e se espatifou em um barranco. Gritos, pedidos de socorro, tudo
escuro e nada se via. O Chefe Clairmont e Rubens se puseram na ativa. Chefes
são sempre assim. Poucos reconheceram o heroísmo de que eles eram possuídos. Só
havia preocupação em ajudar os feridos.
Reuniram todos os membros do grupo e deram falta de Hélio Marcos e
Gérson Satuf. Foram encontrados mortos embaixo dos escombros. Era uma
carnificina. Os que ainda estavam de pé corriam para ajudar. Os pioneiros
fizeram uma grande fogueira, a escuridão não ajudava nos primeiros socorros.
Caio cambaleante ajudava como podia. Ele havia recebido uma pancada na região
lombar e não contou a ninguém. Clairmont e Rubens estavam esgotados. Só às sete
da manhã os primeiros socorros vindo de Barbacena começaram a chegar. Viram
Caio claudicando sentindo dores terríveis. Tentaram levá-lo na maca e ele não
aceitou. – Tem feridos piores disse. A história é cheia de fatos heróicos. Foi
assim com Caio Vianna Martins. Ao Chegar a Barbacena, uma golfada de sangue e com
os lábios tremendo recusou novamente a maca dizendo as mais belas frases que o
mundo conheceu:
– “Há muitos feridos aí. Deixe-me que irei
só. Ajudem os outros, eu sou um Escoteiro e o Escoteiro caminha com suas
próprias pernas”! – Saiu caminhando e desfaleceu morrendo alguns dias depois no
hospital em Barbacena. Tudo seria esquecido se não fosse dois grandes homens
públicos mineiros Alcides Lins e Otávio Negrão de Lima que presentes viram tudo
e contaram para o Brasil e para o mundo o que disse o herói Escoteiro. O gesto
de Caio Vianna Martins ficou gravado na história escoteira. Ele foi escolhido
como o símbolo Escoteiro do Brasil. O Grupo de Caio hoje não existe mais no
colégio Afonso Arinos. Ali somente uma placa de bronze foi colocada sobre os
feitos de Caio Martins.
Em memória a Caio Vianna
Martins, Gerson Issa Satuf e Hélio Marcos de Oliveira Santos, saudemos no
panteão da glória e dos heróis nacionais com o nosso: SEMPRE ALERTA! E tiramos
o chapéu com o Grito de guerra da União dos Escoteiros do Brasil – Anrê – Anrê
– Anrê! – Pró Brasil? Maracatu!
“Há muitos feridos aí. Deixe-me que irei
só. Ajudem os outros, Eu sou um Escoteiro e o Escoteiro caminha com suas
próprias pernas”!
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