Crônicas
de um Velho Chefe Escoteiro.
Quando
a realidade supera a lenda.
Um
tributo a Walter Dohme, um Chefe inesquecível.
Quando foi mesmo? Década de
oitenta? Isto mesmo. Recém-chegado a São Paulo, não muito bem recebido pelos
adestradores antigos. Mineiro metido a “besta” lá estava eu insistindo para
participar da Equipe. Não foi fácil abrir caminho entre os donos do poder.
Escrevi diretamente ao Diretor Nacional de Adestramento solicitando autorização
para um CAB. A região na época não me deu bola. Alegria, alegria. Um mês depois
recebi a autorização pelo correio. Foi meu primeiro curso em São Paulo no Campo
Escola do Jaraguá. Quantos? Menos de vinte alunos. O caminho tinha sido aberto.
Logo depois um novo regional assume, me convida para Assistente de Adestramento
Regional. Um susto nos antigos. Convite foi feito aos “montões” aos
adestradores paulistas para entrosarmos, falar o que melhorar aumentar os
cursos no estado.
Quantos aceitaram? Uns gatos pingados.
Lá estava o Elmer e o Walter Dohme. Com eles e alguns outros a bandeira subiu
não sei quantas vezes no Campo Escola do Jaraguá. Elmer está aí até hoje
mostrando sua raça, seu estilo de Escoteiro seguidor da Lei, e em tempo algum
deixou de colaborar. Walter Dohme um baluarte. Juntos atuamos em dezenas de
cursos. Não tinha hora e nem lugar para negar fogo. Cedo de pé a preparar sua
unidade didática, e isto ia até a noite na hora de recolher. Comecei a admirar
aquele Chefe Escoteiro pelo seu porte, pela sua fidalguia, pela sua
apresentação com seu uniforme, pois a qualquer hora lá estava ele de calças
curtas, mostrando seu orgulho em ser um Escoteiro para que os outros pudessem
ver que não havia hora e nem lugar para estar devidamente uniformizado.
Alguns anos se passaram. Ele e eu nos tornamos amigos. Se precisasse era
só telefonar e ele não negava fogo. Um conhecimento Escoteiro incrível. Aqueles
que um dia foram meninos escoteiros sabem o seu caminho a seguir. Não
precisamos mostrar o caminho a evitar. Sabem escolher a água boa e o saltem o
obstáculo. Um belo dia me dispensaram de membro da equipe. Parei de atuar no
Estado de São Paulo. Uma decepção e ainda dizem que somos um movimento fraterno
e irmãos escoteiros para sempre. Interessante que recebi de um conterrâneo
mineiro uma cartinha pedindo para devolver meu certificado de Membro da Equipe,
meu lenço e coisa e tal. Fingi de morto para não ser mal educado. O tempo passou
vez ou outra chamado a colaborar com a região sendo a que me deu maior trabalho
foi ser Interventor no Grupo Escoteiro São Paulo um dos mais antigos do Brasil.
São memorias que quero
esquecer e só lembrar para me servir de exemplo em algum futuro se isto
aconteça novamente. Eis que vez ou outra topava com Walter Dohme. Guardava dele
as melhores recordações. E foi aqui no Orkut e no Facebook que trocávamos
figurinhas quase todos os dias. Admirava seu trabalho sua força suas esperanças
através dos seus desenhos e charges e da principal personagem que criou o
“Alertino”. Ficou para a história. Daqui a cem duzentos mil anos “Alertino”
sempre será lembrado. Adorava quando ele postava com aquele seu estilo próprio,
onde dava vida ao “Alertino” e suas tiradas magnificas para a posteridade
escoteira.
Walter Dohme se foi. Hoje
mora em alguma estrela brilhante no universo. Não fui ao seu passamento. Foi um
dia atípico das minhas crises pulmonares. Nem mesmo escrevi em sua página
nenhuma lembrança da dor que senti ao saber de sua viagem, ou melhor, ao
retorno de seu destino. Acordei hoje com sua imagem em meu pensamento. Parecia
ouvir sua voz, seu sorriso gostoso, e a dizer: - E aí chefinho, quando sai
outro curso para darmos juntos? Sei que teve outros escotistas que privaram
mais da sua amizade pessoal e eu não fui um deles. Preferi ficar calado e não
dizer nada. Estamos vendo muitos partindo para cumprir suas metas traçadas no
alvorecer de um tempo que nem sabemos medir. Amanhã irão outros e claro eu
também.
Não sei se nos encontraremos novamente quando
chegar minha hora de partir. Nem sei se lá onde ele está recebe visitas de
pseudo escritores que pouco escreveu sobre ele. Passamos muitas noites juntos
no Campo Escola e fora de lá quase nunca. Não existe maneira de fugir do nosso
destino. Hoje aqui, amanhã lá e a volta pode acontecer sempre que Ele achar que
vai haver retorno. Tem amizades que fazemos que não nos deram a oportunidade de
uma aproximação maior. Dizer da dor de seus familiares é impossível descrever.
Ser solidário depois de tanto tempo nem sei se vai adiantar. São tantos
“causos” agora no ocaso de uma vida que se foi que até é difícil contar.
Saudades sim, e isto todos aqueles que tiveram a honra de usufruir de sua
amizade também têm.
Não há historias que não ficam
para sempre presas em nosso coração. Não há registro a fazer para aqueles que
se foram pelas mãos do criador. Mas nunca esqueci o seu sorriso, a sua chegada
ao campo escola, a sua vontade em ajudar e isto me marcou para sempre. Nada
mais a dizer. Ainda sou um pária, ou melhor, um esquecido de amizades que não
poderia perder. Ainda vou voltar aqui na terra muitas vezes. Aprender a ser
mais solidário, aprender a abraçar mais amiúde. É... Eu tenho ainda muito que aprender
e pelo menos Walter Dohme me deixou um legado, aquele que honrou seu sexto
artigo da lei, pois o Escoteiro é amigo de todos e dos demais escoteiros!
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