Contar histórias é uma arte?
Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...
É bom demais contar
histórias. Qualquer uma, seja escoteira ou não. Quantas eu contei ou escrevi?
Milhares talvez! Hoje não mais. A velhice rabugenta e meu pulmão revoltado me
tirou a voz. Agora só escrevo. Eu me divertia quando contava, quando via a
escoteirada ou a lobada me olhando com aquele olharzinho enigmático, olhares incrédulos
e outros que se transportavam para dentro do contexto querendo viver toda a
história contada. Seus olhares me faziam feliz. Tempos inesquecíveis. Uma
história de fantasma, em uma floresta escura era sucesso absoluto. Um Fogo de
Conselho se apagando e você fazendo gesticulando, como se os fantasmas
estivessem ali marcavam cada um dos ouvintes Badenianos. Bom demais. E o susto
do grito de horror no final? Masoquista Chefe? Não, depende da história. Se ela
tem um fundo de exemplos pode contar. Tem seu valor.
“Não há quem resista a boas
histórias” escoteiras ou não. Nas páginas dos livros, dos jornais e das
revistas, na tela do computador e na televisão, narradas ao pé do ouvido ou
transmitidas pelo rádio... Seja lá onde for elas encantam, amedrontam, fazem
rir ou chorar, assustam e são capazes de levar ainda que em pensamento há
lugares nunca antes imaginados. Qualquer idade. De um Velho Escoteiro ou jovens
escoteiros que ainda sonham uma vida de aventuras. Não tem quem não se emociona
ao contar uma historia e ter ouvintes hipnotizados com a narrativa. Tem chefes
que adoram. Em cursos contei muitas. E quem resiste a uma história bem
contada ao pé do fogo? Vendo o crepitar da fogueira, olhando as fagulhas que se
espalham no céu, e como um lobinho feliz abre os olhos e ouvidos para ouvir e
viajar na história que o Chefe? A mente está ali fixa no conto, que vai
desenrolar uma aventura e ele parte célere junto à história com as personagens.
Ele se transforma, é um herói, um explorador, um grande acampador dos seus sonhos
inimagináveis.
Dizem os historiadores que “Contar
histórias é uma das mais belas ocupações humanas: Dizem ainda que elas surgiram
na Grécia onde Homero sublinhava sues contos e se tornou um sublime contador de
contos da carochinha” Todas as outras ocupações humanas tendem mais ou menos a
explorar o homem; só essa de contar histórias se dedica amoravelmente a
entretê-lo, o que tantas vezes equivale a consolá-lo. Infelizmente, quase
sempre, os contistas estragam os seus contos por os encherem de literatura, de
tanta literatura que nos sufoca a vida! É batuta começar e terminar um conto.
Um dia descobri as histórias das mil e uma noites. Aquela da lenda na antiga Pérsia, quando o Rei
Shariar descobre que foi traído pela esposa, que tinha um servo por amante. O Rei despeitado e enfurecido
matou os dois. Depois, toma uma terrível decisão: todas as noites, casar-se-ia
com uma nova mulher e, na manhã seguinte, ordenaria a sua execução, para nunca
mais ser traído.
Assim procedeu ao longo de três anos, causando
medo e lamentações em todo o Reino. Um dia, a filha mais velha do
primeiro-ministro, a bela e astuta Sherazade, diz ao pai que tem um plano para
acabar com a barbaridade do Rei. Todavia, para aplicá-lo, necessita casar-se
com ele. Horrorizado, o pai tenta convencer a filha a desistir da ideia, mas
Sherazade estava decidida a acabar com a maldição que aterrorizava a cidade. E
assim acontece, Sherazade casa-se com o Rei. O final? Risos. Quem sabe um dia
vai ser meu convidado em um Fogo de Conselho e contarei para você.
Eu já
contei histórias em lugares nunca imaginados. Centenas de acampamentos, montanhas
altaneiras, picos incríveis, em jangadas na calmaria de um rio caudaloso, ou
mesmo em um anoitecer estrelado. Contei em jornadas de sol ou de chuva, em
belos encontros de chefes, em volta de uma fogueira esquentando na liturgia da
Conversa ao Pé do Fogo. Muitas das minhas historias tem um pouco do meu
passado. Fábulas reais ou imaginárias. Garatujo muitas pensando que poderia ser
assim, outras com uma pequena dose de ficção deixando no ar o gostinho da
dúvida – Será que foi ou não verdade? – Tem as de final feliz e outras não. Chorar
também é bom dizem os poetas. É o meu estilo de escrever. Minha biografia
escoteira e pessoal foi cheias de episódios, momento alegres, outros não, mas
que valeram cada minuto vivido. Todos eles ficaram marcados na memória. Alguns
legítimos, outros apócrifos, e outros... Ah! Nestes casos ficam anotados na
mente, com espaços ilimitados gravados em micro chips humanos, como recordação
para a posteridade. Desses não esqueço nunca. Outros nem tanto. Um amigo já me
disse que preciso fazer um backup da mente para nada se perder no tempo quando
me for.
Alguns contos ou narrativas são
flashbacks que surgem do nada e se transformam em tudo. Assim caminha a
humanidade eu pego uma carona fazendo sempre uma história para contar. Sei que se
pudéssemos montar nossas biografias com fatos e feitos ocorridos, cada um de
nos teria um volume imenso em paginas impressas no imaginário livro da vida. E
você? Ainda não tentou contar uma história? Um fato acontecido que você nunca
esqueceu? É tão fácil, comece a escrever, coloque uma pitada de sal, se
possivel duas pimentas, uma cebolinha e uma dose de chimarrão ou café ou mesmo
mate. Leve ao fogo lentamente. A conversa ao pé do fogo vai sair, quem sabe vai
fazer você vibrar. Comece não se preocupe ainda com o recheio. O início
amedronta, mas o final e fantástico. Escotismo é assim, cada acampamento, cada
jornada, cada excursão são como se fossem centenas de páginas de um livro ainda
não escrito da sua vida, só falta você para fazer à personagem viver! E
lembre-se: “Boi não é vaca feijão não é arroz”... “quem quiser que conte dois”.
Eu sei que um dia não estarei
mais aqui para contar histórias. Ninguém é insubstituível. Outros irão me
substituir e quando eles se forem outros e outros irão aparecer. Espero que os
contadores de histórias façam reviver o escotismo puro nos seus pensamentos,
nas suas palavras e nas suas ações. O melhor da história é saber que gostaram.
Fico feliz quando sei que colaborei para um sorriso, para uma lágrima perdida
nas histórias da vida. Meu muito obrigado a todos os leitores que eu levarei no
meu coração para onde for!
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