Um conto quase real!
Um Lampião Vermelho a querosene.
- Ontem a tarde faltou luz em minha
morada. Ao procurar umas velas olhei na sala e lá estava pendurado o meu novo
amigo um Lampião Vermelho a querosene. Foi-me presenteado por um amigo Escoteiro
das Minas Gerais. Ele leu uma historia que publiquei sobre um Lampião Vermelho
e fez questão de me presentear com um. Fiquei muito feliz quando o recebi. Tenho
amigos que sempre estão a me surpreender com presente inimagináveis. Eu já
tinha abaulado seu pavio, pouca querosene e devidamente testado. A sala na
penumbra se assustou com a luz bruxuleante do meu novo amigo que muitas
lembranças me trazia do meu passado. Eu era Escoteiro da Raposa e ganhei um de
presente da minha Avó lá de Tapimirim onde sempre ia passar as férias.
No dia do retorno para minha cidade ela
sorrindo me disse: - “O lampião cum
corosene só serve pra infeitá os comudu da casa”. Era assim que ela falava.
Linda a minha avó. – Meu neto, este lampião vermelho é seu. Cuide dele, o
mantenha limpo e sempre preparado para usar. No campo o leve vazio com um
pequeno frasco bem arrolhado de querosene. Sempre quando voltava no ano
seguinte ela não esquecia de me perguntar: - Tem tomado cuidado com o Lampião
Vermelho? – Eu ria e dizia, - Sim Vó! – Sabia que ele fala, chora e rí? Não
liguei muito para o que ela disse. Um lampião não fala, não ri e não chora. Ele
ficava sempre dependurado no meu quarto, inerte e nunca o vi falar e sorrir.
–
No acampamento de Julho, quando arrumava minha mochila ouvi uma voz fanhosa e
rouca: - Não vai me levar? Olhei com cuidado e assustado vi que era o Lampião
Vermelho quem falava. – Pensei com meus botões, devo estar “tantan” e mesmo não
tendo certeza o peguei e o amarrei na alça direita de minha mochila. Nesta
época ainda não havia os tais Lampiões a Gás. Pipoca o cozinheiro usava uma
lamparina que dava a luz que precisava para preparar nossas refeições. Havia
outra na Mesa do Campo, mas qualquer vento a deixava apagada. O Lampião
Vermelho se sentiu o rei junto aquelas duas dengosas Lamparinas. Não foi brusco
e posso garantir que foi um perfeito cavalheiro, daqueles que só no escotismo
são fabricados. Nos cinco primeiros dias tudo correu a contendo.
À noitinha o Chefe Reuniu as quatro patrulhas para um jogo noturno. –
Deixem tudo preparado. Vamos demorar, só vamos retornar lá pelas duas da manhã.
Não se preocupem, a Alvorada será esticada em três horas! – Nada de novo, os
nossos jogos noturnos duravam pelo menos cinco horas. Outro dia comento sobre o
jogo, mas só adianto que morri antes da meia noite. Esperei na Curva do Peão a
patrulha retornar. A norma era a patrulha entrar no campo com todos seus
patrulheiros. Qual não foi nossa surpresa ao encontrar o Lampião como vidro
quebrado e a querosene toda esparramada pelo chão. – O que ouve? Perguntei a
ele.
Escoteiro,
dois ladrões passaram por aqui. Falei baixinho para as lamparinas apagarem o
pavio. No escuro seria melhor para nos defender. Mesmo assim um deles tentou me
acender e eu valente como sou levantei muito o pavio e a chama alta pegou em
sua camisa que pegou fogo. O outro veio correndo e me chutou. Cai e quebrei o
vidro. – E as lamparinas? Correram pela mata. Não as vi mais! – Preocupado solicitei
ao monitor que fossemos todos em busca das Lamparinas. Encontramos uma em um
buraco de Tatu, como uma enorme cascavel enroscada e a outra bem próximo ao Ninho
da Águia na Gruta do Morcego. Elas se jogaram em meu colo e voltamos para o
acampamento.
Fizemos muitos acampamentos, muitas excursões, muitas atividades
aventureiras, mas me diverti com o Lampião Vermelho no Bivaque de novembro,
aproveitando o dia de finados. Zé do Boi disse que conhecia bem o trecho. Sabia
aonde poderíamos parar para dormir. Sabia onde tinha boa aguada e lenha para as
fogueiras. Sei que na terceira noite, já percorridos mais de setenta quilômetros,
paramos para dormir e no dia seguinte vimos que estávamos em um cemitério
abandonado. Cadê o Lampião Vermelho? Demoramos mais de cinco horas para
descobrir seu paradeiro, em cima de um Jequitibá-Rosa tremendo igual vara
verde. – Jurou que não ia mais acampar conosco.
Quando
fui morar na capital para enfrentar a faculdade, ele chorou com minha partida.
Ficou calado e mudo. Quando o apresentei ao Zequinha que fora Lobinho e agora
estava na patrulha ele sorriu. – Lampião Vermelho, o Zequinha vai cuidar de você.
– Ele falante logo perguntou: - Explicou para ele como eu sou? Faço a luz, mas
quero amor, quero amizade e sempre ele tem por obrigação de me dar um abraço! –
Eita Lampião danado. Mas eu sabia que Zequinha não iria faltar no cuidado que
ele merecia.
Histórias são histórias, Contos são contos, Lendas são lendas. A luz
voltou. O meu novo amigo o Lampião Vermelho que ganhei de presente ainda
continuou aceso por muito tempo na sala. Meus pensamentos corriam céleres por um
passado que resistia em esquecer. O apaguei. Fiz questão de lavar o vidro e
secar com uma folha de jornal. Este não falava, mas eu agradeci. Meu amigo
Lampião Vermelho, ficaremos juntos para sempre. Pode contar com este Escoteiro que
mesmo velho sabe respeitar aqueles que nos iluminaram pelos caminhos da vida
que o Senhor nos reservou com tanto amor!
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