Historias e estorias que não foram contadas

Historias e estorias que não foram contadas
uma foto, de um passado distante

sábado, 29 de agosto de 2015

Quando setembro chegar.


Crônicas de um Velho Escoteiro.
Quando setembro chegar.

“O que quer que você faça na vida, será insignificante. Mas é muito importante que você o faça. Porque ninguém mais o fará.”

                       Setembro está longe, mas é um mês que eu gosto, é um mês calmo, mês de descansar em minha varanda e como um Velho Escoteiro ficar a cochilar e a lembrar-me dos bons e velhos tempos. Assim é setembro. Todos os tempos, todos os períodos são bons enquanto vivemos. Pode ser no passado ou presente. Podemos fazer diferente, igual e isto não é importante. O escotismo é único e mesmo querendo que outros chefes tivessem tido a oportunidade de passar pelo que muitos antigos escoteiros passaram sei que é impossível. Lembro que era um tempo de ventos calmos, sem os vendavais de hoje. Podíamos sair por aí sem as preocupações que acometem a esta era moderna. Ainda bem que a promessa, as formaturas mal ou bem se mantêm e isto é bom. O sistema de patrulhas está aí, mas dizem que vai mal das pernas. O que não mudou são os sorrisos. Os mesmo ontem e hoje. Adoro-os. Os meninos e as meninas nos fazem rejuvenescer. De vez em quando converso com um e outro e vejo que eles também têm histórias para contar. Formidável. A chama ainda não se apagou e acho que não irá se apagar nunca.

                      Hoje vejo que muitos se complicam para fazerem um programa. Nas mãos dos chefes. Antes não. Em mãos dos escoteiros. Qual o melhor jogo? Do que vocês gostam mais? - Que tal dar sugestões para a reunião, para a excursão e o acampamento? Monitores em ação. Hoje não seria possível dizer a minha mãe e meu pai que iria acampar em Santa Maria de bicicleta. 420 quilômetros ida e volta. Oito dias. Qual Chefe vai? Nenhum! Qualquer pai de hoje não cairia da cadeira se ouvisse isto? E se dissesse que conseguimos passagens gratuitas até Caparaó de trem. Pai, vamos aproveitar as férias. Serão dez dias. – Sabia meu pai que Caparaó significa águas cristalinas que rolam da serra? Sabia pai que lá é onde mais facilmente a gente sobe até o Pico da Bandeira? Olha meu pai o Pico da Bandeira se chama assim porque o Imperador Pedro II mandou colocar uma bandeira em seu cume. Sabia pai que A serra do Caparaó, além do pico da Bandeira, tem ainda o Pico do Cruzeiro, o Pico do Calçado, O Morro da Cruz do Negro, o Pico da Pedra roxa, o Pico dos Cabritos ou do Tesouro, o Pico do Tesourinha e ainda a Pedra Menina?

                    Vai ser difícil qualquer pai entender hoje. - E quem vai com vocês? Ninguém pai. Somos Sênior e o senhor sabe, tropa Sênior, Sênior é, é que é bacana! Ela mata esfola, não tem medo e sabe vencer! Risos. Não cantávamos assim naquela época, mas hoje tudo mudou. Mas e o pai de hoje? Olhos esbugalhados, pensando, que diabos este meu filho e seus amigos escoteiros pensam que é? E se ele nos visse no campo cortando madeira, das grandes, sem serrote especial, apenas uma machadinha e um facão e horas para poder gritar a plenos pulões: - “MADEIRA!” gritávamos. E Lá ia a tora caindo. Hoje não pode. Mas naquela época? Florestas enormes. Entrávamos nela como se estivéssemos passeando no “foot” de nossa cidade. (foot, praça onde aos sábados e domingos a noite ficávamos ali a paquerar as lindas meninas faceiras). De dia ou de noite varávamos trilhas, matas, atravessávamos rios, e quando desse sono era só deitar na relva, na pedra ou em qualquer lugar e dormir. Hoje? Impossível.

                      Já pensou? Um Chefe no nosso campo dando “pitacos”? Nem pensar. Bastava um sisal ou um cipó a 30 cm do chão e ninguém passava. Todos sabiam que deviam ir à entrada onde existia o pórtico bater palma e pedir licença. Afinal era nossa casa e não a casa da “mãe Joana!”. - Chefe, você ensinou ao nosso Monitor, deixe a patrulha fazer, por favor! Vá para sua barraca, faça lá suas pioneirias, sua refeição. Quem sabe hoje à tarde quando da apresentação do jantar pronto o convidamos? Setembro vai chegar e não vai demorar em ir embora. Não dá mais. Agora precisamos tomar cuidado. A marginalidade. Minha prova de jornada? Hoje poucos fazem. - Pai, nós vamos eu e o Nanico fazer uma prova de jornada para a Primeira Classe. Só nós dois. Serão cinco dias. Vamos descer o Rio Boitanga de jangada que nós mesmos faremos e só levaremos sal e óleo. Serão pouco mais de cento e vinte quilômetros de corredeiras até a ilha dos Aimorés. Lá vamos conseguir comida! O que diria o pai hoje com este pedido? Só rindo. - Está louco? Nem pense. Esqueça! Vou tirar você do escotismo.


                  Setembro, tão próximo e vai passar tão rápido. Ainda acredito que podemos fazer muito do que nós os antigos escoteiros fizemos. Não sei. Alguns chefes me dizem que fazem e outros dizem ser impossível. Pode ser que sim pode ser que não. Se eu fosse um “guapo” rapaz e Chefe Escoteiro iria tentar. Tremo só em pensar estar junto a uma Tropa, quatro patrulhas perfeitas, varando enormes trilhas subindo montanhas inesquecíveis. Que saudade! Que vontade de voltar no tempo e sei que não posso. Fico aqui torcendo para que os chefes de hoje lembrem que seus escoteiros precisam de liberdade, de ação de aprender fazendo, sem tutor e com uma boa dose de aventura. Nem que seja vigiada, mas precisam. Lembro-me sempre do passado e das palavras de BP, de tudo que ele nos deixou em seus escritos. Se fosse um Chefe eu ainda teria muito a aprender com eles. Afinal quais os valores de um método se acham que ele não tem mais utilidade?

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