Lembranças.
Eu já fui professor do... MOBRAL!
Foi uma
experiência fantástica. Ser professor e ver alunos como os que eu tive querendo
aprender é uma situação agradabilíssima. Foi uma honra ser um professor, de
pessoas humildes, quase todos acima de vinte anos e muitos de cinquenta a
oitenta anos. Acredito que poucos se lembram do programa governamental de
formação de adultos. Na época era chamado de MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização) foi um projeto do governo brasileiro,
criado pela Lei n° 5.379, de 15 de
dezembro de 1967, e propunha a alfabetização funcional
de jovens e adultos, visando "conduzir a pessoa humana a adquirir
técnicas de leitura, escrita e cálculo como meio de integrá-la a sua
comunidade, permitindo melhores condições de vida".
Pois é, eu fui um professor do MOBRAL. Se nas grandes cidades servia-se
de pilherias e zombarias, onde eu estava era uma fonte da juventude para os que
queriam aprender, apenas assinar um nome já era motivo de orgulho. Gerente de
Uma Fazenda no Norte de Minas conhecia boa parte dos moradores da região, na
maioria meeiros, pequenos sitiantes residentes próximos ao Rio das Velhas. Pessoas
simples, sempre com um sorriso, a dizerem Senhor. Posso dizer com orgulho que
tive a honra de ser padrinho de dezenas de crianças cujos pais me honraram com
um convite.
Dois anos gerenciando a fazenda vivia em plena felicidade. O ar puro o
silencio, as noites de causos, de conversas com os filhos e amigos que moravam
próximo. Quando a noite chegava, adorava ver o mais lindo céu estrelado, o
cantar dos passados e insetos noturnos e alguns veados campeiros correndo pela
plantação de cana caiana. A luz era de um Velho “Jirico” (trator) com um motor
potente acesa somente parte da noite. Uma geladeira a gás, uma TV cheia de
chuvisco a bateria e três lampiões a gás. Não faltava um radinho para ouvir a
Voz do Brasil.
Na varanda dava para ver o sol nascer ou se por. Acostumamos com os
sapos cururu coaxando e os grilos esvoaçantes querendo chegar não sei onde. Já
tinha lido sobre o MOBRAL e na prefeitura de Pirapora MG se prontificaram a me
ajudar. Pensei por que não ter aqui na fazenda uma escola assim? Dito e feito,
a ideia maturou e mãos a obra. Não pedi licença ao Presidente da Companhia, um
erro meu, pois acreditava ser ele um nacionalista brasileiro e não seria contra
a ter uma escola em sua propriedade. Afinal não havia gastos, pois tudo era
fornecido pelo governo.
Quando comentei com os vaqueiros e alguns sitiantes a ideia correu como
o vento pela redondeza. – “Seu Osvardo” eu quero participar... Faça um banquinho
para você e apareça na próxima segunda feira. Fui atrás da responsável que me
deu todo apoio possível. Até mesmo meio salario mínimo que ajudou a comprar
materiais para a escola. Foi demais o primeiro dia.
As seis e meia da tarde começaram
a chegar os “meus alunos”. De cada canto da fazenda eles surgiam a cavalo, de
charrete, de bicicleta e a pé. Casais, homens e mulheres solteiras, até filhos
no colo. Assustei com o numero, não esperava tantos interessados. Na primeira
noite mais de quarenta, na segunda sessenta, na terceira chegamos a oitenta.
Fechei as inscrições. A prefeitura de Pirapora não me negou os materiais
faltantes.
Deram-me apostilas e aprendi muito a ensinar pessoas que não sabiam nem
segurar um lápis. Foi divertido pegar nas mãos trôpegas de alunos idosos que durante
o dia capinavam suas roças, faziam seus trabalhos de campo, plantavam, colhiam
e ao lusco fusco da noite partiam em busca do saber. Foram seis meses
maravilhosos. Começávamos as sete e terminávamos às dez da noite. O sorriso
quase infantil de Dona Noêmia de setenta anos quando assinou seu nome foi
demais.
Analfabeta assinava fazendo uma cruz ou mergulhando seu dedo em uma
tinta para dizer que existia e que achava vergonhoso. Com quatro meses acreditei
que eles poderiam ler e escrever. Muitos começaram a ler as cartilhas, alguns
já fazendo seus exercícios com a tabuada decorada.
Recebi um recado do presidente da Companhia: – Louvável Osvaldo seu
espirito em dar luz e saber a estas pessoas, ensinando a ler e a escrever. No
entanto por motivos que irei comentar quando for ai, termine tudo. Feche a
Escola. Tem duas semanas para isto! – Levei um choque. Não esperava dele tal
atitude. Mudou minha concepção de homem empreendedor. Os alunos não acreditaram
quando disse que a escola ia acabar. Houve choros, lágrimas. A noticia espalhou
como um rastilho de pólvora e demorou para que eles entendessem que ele era o
dono, tinha esse direito. Enfim, a escola acabou.
Mesmo
sem escola muitos me procuravam em minha casa a noite ou fins de semana. Dei a
atenção de pelo menos aprenderem a assinar o nome e até mesmo um bom dia boa
noite ou boa tarde. No dia que fui embora da fazenda a sede da fazenda ficou
cheia de amigos que vieram despedir. Ouvi as mais lindas expressões de
agradecimento. Eu era um Chefe Escoteiro, sabia como conviver com adultos e
pais. Mas como professor nunca tive a honra de ensinar o ABC. Foi demais, na
partida lágrimas corriam a solta em meus olhos. Elas só pararam quando
atravessei a Barragem de Três Marias quatro horas depois.
Não discuto e nem quero fazer uma celeuma das vantagens e desvantagens
do MOBRAL. Se foi invenção de militares que assumiram o poder tudo bem, mas e
dai? Olhar nos olhos de uma plêiade de pessoas sedentas em aprender, pessoas
simples, humildes que não tiveram a oportunidade de ser alfabetizados foi demais.
Nunca esqueci Dona Noêmia e seu sorriso quando assinou seu nome. Velhos tempos,
um Velho Escoteiro não esquece. Só quem passou por isso pode entender o valor
de uma assinatura.
Graças a Deus eu fui Professor de Mobral. Tenho grande orgulho de ter sido um!
Nota - Eu fui um professor do MOBRAL. Com muito orgulho. Como disse um
poeta: - Ler é sonhar pela mão de outrem. Ler mal e por alto é libertarmo-nos
da mão que nos conduz. A superficialidade na erudição é o melhor modo de ler
bem e ser profundo. Abraços fraternos.
Baccarat & Strategy: What's In and What's Not
ResponderExcluirA two-horse 인카지노 race 샌즈카지노 is the main component of a bet, and the most 바카라 basic way to do it is to make a two-horse contest. The two horses to take