Lendas
escoteiras.
O
inesquecível Chefe Bolota, ele sim era o “cara”!
Nunca esqueci o dia que
ele chegou à sede. Todos se assustaram. Eu mais ainda. Quando o Chefe Jamilson
o apresentou e disse que o Chefe Bolota seria o novo Chefe da tropa todos
arregalaram os olhos. Ali na sua frente um homem baixinho, não mais que um
metro e cinquenta e cinco ou menos, gordinho, cabelos crespos amarelados e seu
rosto era admirável. Duas bochechas vermelhas gordinhas escondidas por uns
olhinhos azuis diminutos. Claro, cheio de sardas. – Deu um belo de um sorriso e
disse – Vim para aprender com vocês. Nossa! Onde amarrei minha égua? Eu pensei.
– Tropa! Disse o Chefe Jamilson, infelizmente fui transferido para Aguas do
Sul. Não posso mais continuar com vocês.
Sei que sabem como levar a frente às atividades. A cada quinze dia voltarei aqui
e vamos conversar. Mas a responsabilidade da tropa ficará com o Chefe Bolota!
Uma palma mexicana foi
dada ao novo Chefe. Aquela que a gente tem uma preguiça enorme. Ficamos assim
meios cismados, pois com o Chefe Jamilson nós tínhamos grandes liberdades. Acampávamos
quando decidíamos. E reuniões eram quase todos os dias. Será que ele iria
mudar? Chefe Jamilson se foi. Chefe Bolota ficou. Sorria, quase não falava.
Achamos sua voz um pouco estranha. Porque não o conhecíamos na cidade? Dois
meses depois aprendemos a gostar do Chefe Bolota. Mais parecia um de nós. Ia à
casa do Pedrinho, na minha, na do Leôncio enfim ia à casa de todo mundo. Os
pais o adoravam. Passaram-se quase cinco meses quando ele apareceu com o Padre
Werner Braum da Paróquia de Santana. Todos conheciam a fama dele. O chamávamos de alemão de Hitler. Sem
conhecer ele e o Hitler tínhamos um medo danado dele. Foi o Chefe Bolota quem
nos apresentou. - Amigos e irmãos escoteiros, vocês não sabiam, mas sou
sacristão na Igreja de Santana. Pronto estava explicado.
Agora tínhamos de
participar da missa do Padre Alemão. Ninguém faltava. Um medo danado do padre
alemão. Chefe Bolota sorria de alegria. Pegou alguns de nós e fez um coro.
Queria que outros se tornassem coroinhas. Chefe Bolota estava mudando tudo. Não
era aquilo que fazíamos. Mas o olhar do Padre Werner era mortal. Ninguém dizia
não. Um dia tivemos uma enorme surpresa. Um caminhão do Sexto Batalhão da
Policia Militar parou na porta da sede. Um sargento pediu ajuda. – São para
vocês! - Meninos! Ficamos espantados! Mais de duzentas mochilas praticamente
novas, quarenta barracas de duas lonas,
oito barracas de oficiais, cantis, machadinhas, picaretas nossa! O que era
aquilo? – Um pedido do Padre Werner ao comandante para vocês. “Enricamos”
estávamos ricos. Por mais de cinco meses não faltamos às atividades da igreja
de Santana. Mas nem tudo dura para sempre. As saudades das excursões, dos
acampamentos, das atividades volantes, bivaques batia fundo. Agora tudo estava
paralisado.
Chamamos o Chefe
Bolota. Fizemos um Conselho de Tropa. Explicamos. Ele entendeu. Mas não sabia
como conciliar com a igreja. O que ele diria para o Padre Werner? – Na semana
seguinte ele chegou com o Padre Werner no dia de reunião. Ficamos calados. Esperávamos
o pior. – Escoteiros, acho que me enganei com vocês! – Putz! A barra vai pesar
pensei. – Enganei mesmo. Vocês são escoteiros e a vida que devem levar é no
campo e não na igreja. Vamos fazer um trato. Pelo menos uma vez por semana irão
à missa. Uma vez por mês irão se confessar. Portanto nos demais dias, façam o
escotismo como ele é. Aventuras, nada mais que isto! – Grande padre Werner.
Chefe Bolota estava
conosco. Precisavam o ver cantando junto à carrocinha quando íamos para o
campo. Sede? Uma vez passamos dois meses sem reunião lá. Foi na época que
atravessamos as corredeiras do Rio Doce em Derribadinha. Uma aventura e tanto.
Chefe Bolota caiu da jangada. Gritou dizendo não saber nadar. Vários de nós a
ajudá-lo até uma grande pedra no meio do rio. Ele contava para todo mundo sua
façanha e seus heróis. Não sei se ele se tornou um grande mateiro, não sei. Um
ano e meio conosco nos deu a noticia – Fui aceito em um seminário. Sempre
desejei ser um homem de Deus. Partiu assim como chegou. Quatro anos depois
apareceu na sede. Apresentou-se como um novo padre na cidade. Rezamos com ele ali
na sede uma linda missa escoteira.
Partiu para uma paróquia
no interior de Pernambuco. Nunca mais o vi. A tropa sempre ao redor do fogo lembrava-se
dele. Dávamos risadas, contávamos casos que foram repetidos por muitos e muitos
anos nos fogos de conselho da vida. Chefe Bolota era figura central nas
enquetes, jograis e histórias que por muitos e muitos anos aconteceram em
nossos Fogos de Conselho. Sempre é bom ter boas coisas para lembrar. Chefe
Bolota foi Chefe escoteiro. Pouco tempo. Mas acreditem, marcou mais que o nosso
antigo Chefe Jamilson. Tempos que se foram. Tempos que se dizia – Se tens uma
Corte de Honra funcionando e bons monitores, tens uma tropa em ação então mãos
a obra, o escotismo ali na dá passo de ganso! Assim éramos nós. Amigos e irmãos
uns dos outros. Acampando com a Patrulha ou com todas juntas sempre riamos e
dizíamos – “E quem precisa de Chefe”?
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